Glória Teixeira

Glória Teixeira (Doutoramento QMC/Universidade de Londres), Professora Associada da Faculdade de Direito da Universidade do Porto

Joaquim Ribeiro

Licenciatura em Economia (Faculdade de Economia do Porto)
MBA (Universidade Nova de Lisboa)
Pós-graduação em Investimento Imobiliário (City University, Londres)
Carreira profissional em grupo privado, no setor imobiliário


Consulte a sua obra da Glória Teixeira neste link.


Em artigo anterior falamos da necessidade do Estado ir além de proibir e complicar (regulação) e passar a fazer (investimento).

O que é que os Estados e a Europa deviam estar a fazer agora?

A História de Portugal foi marcada por um grande projeto nacional– a descoberta do caminho marítimo para a Índia. Um projeto desse tipo, que demorou décadas a ser executado, é o tipo de projeto que necessita de uma forte intervenção e apoio do Estado para ser bem-sucedido. Ora, a Europa, neste momento, enfrenta um desafio desse tipo – a transição energética.

Por vezes, pode pensar-se que a transição climática é meramente uma questão de regulação – basta ajustar os termos da regulação das empresas elétricas, no sentido de aumentar a componente da geração de fontes renováveis, e o problema fica resolvido. Nada mais errado.

Está claro que, ao contrário das redes baseadas no fóssil, uma rede elétrica baseada em fontes renováveis vai necessitar de volumes significativos de meios de armazenamento de energia, para compensar períodos em que as fontes renováveis estão inativas. Armazenamento de energia passa por baterias. Mas não vão ser as empresas elétricas a investigar e investir em baterias – não têm competências para tal, são necessárias empresas especializadas. Mas quem dominar o setor das baterias (empresas ou países) ganha uma grande vantagem em termos de veículos elétricos.

E assim de repente, já não estamos a falar do setor elétrico, estamos a falar do maior setor industrial europeu – a indústria automóvel – que pode ficar em crise, e colocar todos os outros setores de componentes automóveis igualmente em crise.

Ou seja, a energia não é um setor estanque que transita para energia renováveis e já está. Pelo contrário, a transição energética tem impactos profundos em múltiplos setores das economias europeias. E onde estão os estados europeus, onde está a União Europeia nesse desafio sistémico? Não é claro.

Uma coisa é certa: não é através exclusivamente através de regulação que vamos enfrentar um desafio complexo como este, que se vai desenrolar durante as próximas décadas.

E o problema é que enquanto a UE está a discutir mais regulação, não está a discutir planos de ação, medidas de investigação, apoios a investimento empresarial, para defender as nossas economias face aos desafios que enfrentam.

E quando andamos a discutir planos para o hidrogénio, retiramos espaço para discutir planos para o setor automóvel europeu.

Se queremos ir por este caminho de política industrial, temos, no entanto, de reconhecer que a União Europeia tem um problema de arquitetura institucional para o executar. É que as políticas industriais a nível nacional são fortemente limitadas pela Lei europeia (proibição de princípio às “ajudas de Estado”). Mas, por outro lado, a União Europeia em si não tem, nem recursos financeiros, nem recursos humanos (e pode-se argumentar que não tem mandato) para iniciar políticas industriais a nível europeu.

Parece uma situação sem saída, mas não é. É que, a Europa tem um grande exemplo de projeto de política industrial muito bem-sucedido. É a Airbus, líder mundial da aviação civil, setor de alta tecnologia e que garante dezenas de milhares de empregos qualificados na Europa.

O caso da Airbus é interessante precisamente porque é um projeto de iniciativa / patrocínio de estados europeus, mas fora dos mecanismos e estruturas da UE. Basicamente, em 1967 a França, Alemanha e Inglaterra juntaram as suas empresas de aeronáutica (estatais ou com influência estatal) num consórcio para desenvolver um avião comercial, consórcio esse que se alargou a outros países, e evoluiu depois para empresa cotada.

O seu sucesso comercial tem sido indiscutível, e a Airbus mostra vários pontos relevantes para a nossa discussão.

Primeiro, mostra que é possível fazer política industrial na Europa.

Segundo, mostra que não é provável que seja a burocracia de Bruxelas a construir esse tipo de projetos, é necessário a vontade política a nível nacional. Embora Bruxelas possa e deva ajudar.

Mas, terceiro, mostra também que essa vontade política tem faltado nos últimos anos.

Os políticos europeus que construíram um projeto empresarial de liderança mundial, puseram esse modelo de lado e passaram a preocupar-se com regulamentos de proteção de dados …

Todo este problema que discutimos nestes três artigos talvez seja tão simples quanto isto: os eleitores e os agentes económicos europeus querem mais projetos como a Airbus, e menos regulação.