Glória Teixeira

Doutoramento QMC/Universidade de Londres), Professora Associada da Faculdade de Direito da Universidade do Porto

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Ouvi com bastante interesse o vídeo publicado por Downing Street, nº 10, do primeiro ministro inglês Boris Johnson, onde partilha a sua experiência enquanto paciente em estado crítico e elogia os enfermeiros que o assistiram nas 48 horas cruciais para a sua recuperação.

Senti um duplo orgulho local e internacional, quando ouvi a referência a um profissional português (Luís) e a sua associação próxima à 2ª maior cidade do país: o Porto.

Para muitos de nós, esta experiência supera a euforia nacional associada ao futebol e seus heróis e confirma o que já sabemos sobre ‘o capital humano português’.

De facto, e já em tempos recentes de crise financeira e apoio da ‘Troika’, foram claros os relatórios das organizações internacionais (e diferentemente do caso grego) quando evidenciaram a qualidade de algumas instituições nacionais como as universidades, a Autoridade Tributária e Aduaneira, etc. Da minha experiência internacional, como académica e observadora em organismos internacionais, é com agrado que testemunho a qualidade e profissionalismo dos nossos representantes nacionais no contexto internacional.

No entanto, este é um universo pequeno de profissionais e o discurso emotivo de Boris Johnson vem chamar à atenção para algumas deficiências nacionais, para as quais aliás o atual governo tem estado atento, nomeadamente com a recente introdução do ‘regime regressar’.

Na realidade, temos de concordar que em Portugal algumas categorias profissionais, no universo do ‘trabalho público’, conseguem fazer valer as suas legítimas pretensões e outras são esquecidas, não obstante a carga de trabalho e responsabilidade associada ao exercício da profissão (e.g. o caso dos enfermeiros e outras). Não será, pois, de espantar que num ambiente de mobilidade social, estes profissionais procurem outras alternativas no estrangeiro e, diferentemente do que acontecia no passado, já não regressem ao seu país de origem. Estes países saem duplamente prejudicados pois investiram na formação destes profissionais (os nossos impostos pagam quase na totalidade a sua formação) e vêm fugir ‘capital humano’, geralmente, para países mais desenvolvidos e economicamente mais fortes. E note-se que são essenciais no dia a dia e não apenas em tempos de crise.

Vivem-se idênticos problemas, no universo público universitário, tendo estes de ser encarados pelo legislador num futuro próximo sob pena de perdermos ou não atrairmos os nossos melhores ‘cérebros’ nacionais e internacionais.

À semelhança dos enfermeiros, são profissionais esquecidos nas ‘atualizações remuneratórias’ e existem problemas sérios de gestão institucional, nomeadamente ao nível de promoções, etc.

Pergunto se a omnipresença do Estado na regulação destas e outras profissões não será prejudicial, inclusive, para a própria economia nacional. Lembre-se que o excesso de regulação nas profissões tem vindo a ser denunciado por organizações internacionais e temos de estar atentos a estes avisos internacionais sérios e credíveis.

Podemos ignorar e ‘assobiar para o ar’ mas mais cedo ou mais tarde teremos de enfrentar estes problemas e encontrar soluções legislativas e institucionais adequadas e em consonância com as melhores experiências internacionais.

Se nada fizermos, corremos o risco de ver o atual e valioso ‘capital humano interno’ desaparecer, sem substituição, pois, penso eu, nem mesmo os incentivos fiscais do ‘regime regressar’ são força atrativa suficiente para trazer de volta ao nosso país esse excelente capital humano nacional no estrangeiro e predominantemente jovem.

Esta realidade traz-me de volta ao discurso de Boris Johnson onde de um modo direto e ‘sem pompa nem circunstância’ reconhece o trabalho destes profissionais ‘estrangeiros’ tantas vezes esquecidos e que merecem o nosso respeito e admiração.

Segue por último um agradecimento também a todos os profissionais da Autoridade Tributária e Aduaneira e outros que zelam pela nossa segurança nos portos e aeroportos, sendo também eles os ‘nossos heróis’ a combater na linha da frente.

Até breve!