Catarina Serra

Licenciada em Direito, Mestre e Doutora, na especialidade de Ciências Jurídico-Empresariais, pela Universidade de Coimbra. Agregada em Ciências Jurídicas, na especialidade de Ciências Jurídicas Privatísticas, pela Universidade do Minho.Professora Associada com Agregação da Escola de Direito da Universidade do Minho. Juíza Conselheira do Supremo Tribunal de Justiça.

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1. O status quo em matéria de insolvência e de reestruturação de empresas

Em Portugal não houve, durante a primeira fase do estado de emergência com fundamento na situação de calamidade pública causada pela pandemia COVID-19 (que perdurou de 19 de Março a 2 de Abril de 2020[1]), uma única medida que versasse, de forma directa, a reestruturação de empresas e / ou a insolvência.

A segunda fase do estado de emergência (que se iniciou a 3 de Abril e cessará a 17 de Abril[2]) levou à revisão do conjunto, já amplo, de medidas excepcionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica nas diversas áreas de acção legislativa.

É neste contexto que se regista a publicação da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril[3], que altera a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março[4], e introduz a primeira medida em matéria de insolvência na legislação de emergência portuguesa: a suspensão do prazo de apresentação à insolvência [artigo 7.º, n.º 6, al. a), da Lei n.º 1-A/2020].

Encontram-se ainda, entre as alterações, duas outras medidas, com relevo (positivo) indirecto para esta matéria: a suspensão das acções executivas [artigo 7.º, n.º 6, al. b), da Lei n.º 1-A/2020] e ainda a possibilidade clara de prosseguimento dos processos judiciais urgentes através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente (artigo 7.º, n.º 7, da Lei n.º 1-A/2020).

Veja-se o articulado relevante para os presentes efeitos.

Artigo 7.º

Prazos e diligências

1– Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, ficam suspensos até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARSCoV-2 e da doença COVID-19, a decretar nos termos do número seguinte.

6. Ficam também suspensos:

a) O prazo de apresentação do devedor à insolvência, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

b) Quaisquer atos a realizar em sede de processo executivo, designadamente os referentes a vendas, concurso de credores, entregas judiciais de imóveis e diligências de penhora e seus atos preparatórios, com exceção daqueles que causem prejuízo grave à subsistência do exequente ou cuja não realização lhe provoque prejuízo irreparável, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 137.º do Código de Processo Civil, prejuízo esse que depende de prévia decisão judicial.

7 – Os processos urgentes continuam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências, observando-se quanto a estes o seguinte:

a) Nas diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;

b) Quando não for possível a realização das diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, nos termos da alínea anterior, e esteja em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes, pode realizar-se presencialmente a diligência desde que a mesma não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes;

c) Caso não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de atos ou a realização de diligências nos termos previstos nas alíneas anteriores, aplica-se também a esses processos o regime de suspensão referido no n.º 1.

A norma do artigo 7.º contém, pelo menos, três medidas benéficas para as empresas que estejam em dificuldades por causa da pandemia.

Por um lado, as acções executivas ficam impedidas de prosseguir, o que significa um alívio evidente para as empresas (quase todas) que não estão em condições de cumprir as suas obrigações [artigo 7.º, n.º 6, al. b)].

Por outro lado, ficando definitivamente esclarecido que a regra é a de que os processos urgentes devem prosseguir (artigo 7.º, n.º 7), nada impede que o planos de insolvência / recuperação ou de reestruturação sejam homologados e produzam os seus efeitos, como havia sido defendido noutra ocasião[5].

Mas o beneficio em destaque é, evidentemente, o que deriva da suspensão da obrigação de apresentação à insolvência [artigo 7.º, n.º 6, al. a)]. Os empresários e os administradores de sociedades apercebem-se de que, por uma causa extraordinária, a empresa deixou de ter liquidez e que em breve lhe será (se não lhe é já) impossível fazer face aos seus compromissos e sabem que, se não cumprirem a obrigação de apresentação à insolvência nos trinta dias seguintes à data do conhecimento da insolvência ou à data em que devessem conhecê-la, ficam sujeitos aos efeitos da insolvência culposa [cfr. artigo 18.º, n.ºs 1 e 3, 19.º e 189.º, n.º 2, al. a), e 186.º, n.º 2, do CIRE]. Mas não será de equacionar a hipótese de, no final do período crítico, a empresa retomar a actividade sem dificuldades de maior? Para esta avaliação é preciso tempo e é este hiato de tempo que, finalmente, é concedido, desaparecendo com isto uma enorme fonte de pressão para os empresários e os administradores de sociedades.

Duas perguntas se impõem, porém.

Terá a medida sido consagrada da forma mais adequada?

Será a medida suficiente para responder às necessidades das empresas em matéria de insolvência e reestruturação de empresas?

Das respostas (que se adivinham negativas) e das críticas que se farão a final não deve retirar-se a ideia de que a legislação portuguesa é um caso isolado. É patente em todos os países a desorientação na escolha das áreas mais urgentes e das melhores formas de intervenção legislativa. Tudo considerado, o legislador português nem é dos menos atentos. Deve, porém, continuar a procurar as soluções mais adequadas e completas.

Antecipa-se um comentário, já partilhado a propósito da legislação de emergência para empresas: às medidas agora consagradas na Lei n.º 1-A/2020 depois da alteração pela Lei n.º 4-A/2020 devem rapidamente suceder-se outras, para satisfazer necessidades sentidas tanto no domínio dos processos de insolvência como no domínio da reestruturação.

2. Olhar para o lado: perspectiva comparativa

Depois de uma apreciação global das opções legislativas já tomadas ou previstas nos ordenamentos europeus na sequência da pandemia no âmbito da insolvência e da reestruturação de empresas, pode dar relevância à medida da suspensão da obrigação de apresentação à insolvência e dividir-se estes ordenamentos em dois grandes grupos[6].

O primeiro grupo é o dos ordenamentos que procederam já, de forma expressa, à suspensão da obrigação de apresentação à insolvência (Espanha, Alemanha e, agora, Portugal), à sua prorrogação (Áustria) ou em que se prevê a adopção de uma medida do tipo (República Checa).

O segundo é o dos ordenamentos em que nada disto aconteceu mas é possível – ou se sustenta que é possível – atingir os efeitos que a suspensão visa por outras vias. Estas podem ser a suspensão generalizada dos prazos processuais (Luxemburgo e Itália), a proibição temporária das acções executivas (Suíça), a fixação no tempo da situação relevante e a desconsideração da insolvência actual (França).

Fora destes dois grupos, portanto, isolado, fica um único ordenamento (Reino Unido). Não existe aí obrigação de apresentação à insolvência, pelo que os esforços se concentram na limitação de outros fundamentos da responsabilidade dos administradores. O caso demonstra que ainda há muitas matérias por regular.

2.1. Espanha

Em Espanha, onde o prazo para apresentação à insolvência é de dois meses [artigo 5 (1), da Ley Concursal], optou-se por um modelo de suspensão da obrigação de apresentação à insolvência subordinada a um termo.

O artigo 43 do Real Decreto-ley 8/2020, de 17 de marzo, de medidas urgentes extraordinarias para hacer frente al impacto económico y social del COVID-19[7], versa o prazo da obrigação de requerer a abertura do processo de insolvência. Estabelece que a obrigação de apresentação à insolvência (concurso voluntario) fica suspensa enquanto subsistir o estado de emergência (estado de alarma) e que, durante dois meses a contar da cessação deste, os tribunais não devem dar início a processos de insolvência requeridos por sujeitos diferentes do devedor (concurso necesario) durante o estado de emergência ou durante esses dois meses. Se a empresa se apresentar à insolvência, a petição apresentada por ela deve ser admitida com preferência sobre o requerimento apresentado por outros sujeitos[8] [9].

Tão-pouco terá o dever de se apresentar à insolvência durante o estado de emergência a empresa que tenha comunicado ao tribunal competente o início de negociações com os credores com vista à sua reestruturação (mais precisamente, com vista a obter um acuerdo de refinanciación, um acuerdo extrajudicial de pagos ou adhesiones a una propuesta anticipada de convenio), mesmo que se tenha esgotado o prazo a que se refere o artigo 5 bis (5) da Ley Concursal (ou seja, de três meses a contar daquela comunicação).

Esta solução tem sido vivamente criticada, primeiro, pela exiguidade dos prazos estabelecidos, argumentando os especialistas espanhóis que tais prazos não asseguram um período de tempo razoável para as empresas se restabelecerem depois da crise, e segundo pelo seu carácter geral, que dá o benefício da suspensão a todas as empresas e permite o seu uso oportunístico[10].

Cabe salientar, de qualquer forma, que está iminente a alteração da Ley Concursal. O Conselho de Ministros aprovou um acordo solicitando à Comissão Permanente do Conselho de Estado um parecer com carácter urgente em relação a um projecto legislativo através do qual se aprovará o texto consolidado da Ley Concursal[11]. Talvez nesta ocasião os aspectos menos positivos da solução sejam corrigidos e venham a ser reguladas outras matérias.

2.2. Alemanha

Na Alemanha, onde o prazo para a obrigação de apresentação à insolvência é de três semanas (artigo 15a da Insolvenzordnung), criou-se um modelo distinto, em que a suspensão fica simultaneamente subordinada a um termo e a requisitos substantivos.

As medidas em matéria de suspensão do pedido de declaração de insolvência e de limitação da responsabilidade dos órgãos em situações de insolvência causada pela pandemia COIVID-19 estão consagradas no artigo 1, §§ 1 a 4, da Gesetz zur Aussetzung der Insolvenzantragspflicht und so weiter, das COVID-19 Insolvenzaussetzungsgesetz (COVInsAG), de 27 de Março de 2020[12] [13] [14].

No que às empresas respeita, determina-se no § 1 (sobre a suspensão da obrigação de apresentação à insolvência) que a obrigação está suspensa até 30 de Setembro de 2020. Isto não vale quando a insolvência não seja uma consequência da pandemia ou quando não haja perspectivas de evitar a insolvência. Presume-se que a insolvência é consequência da pandemia sempre que, em 31 de Dezembro de 2019, o devedor não estivesse em situação de insolvência (impossibilidade de cumprir) ou houvesse perspectivas de evitar a insolvência.

No § 2 (sobre as consequências da suspensão) estabelece-se um conjunto de garantias que constituem, rigorosamente, desvios seja ao regime da impugnação dos actos prejudiciais aos credores seja à disciplina da responsabilidade dos administradores de sociedades.

Dispõe-se aí, grosso modo: primeiro, que os pagamentos em dinheiro necessários ao curso normal da actividade ou à reestruturação que sejam realizados enquanto estiver suspensa a obrigação de apresentação à insolvência não darão origem à responsabilidade dos administradores; segundo, que o reembolso de empréstimos contraídos durante o período de suspensão que seja realizado até 30 de Setembro de 2023 não será considerado prejudicial aos credores, valendo o mesmo para as garantias concedidas a favor destes créditos durante o mesmo período e para o reembolso de suprimentos; terceiro, que a concessão de crédito e de garantias a favor de tais créditos durante o período da suspensão não deverá ser considerada contrária aos bons costumes para efeitos de agravamento da insolvência (Insolvenzverschleppung); e, quarto, que os actos que proporcionem ao credor uma garantia ou uma satisfação do crédito em termos que aquele pudesse exigir naquele momento não serão impugnados em processo de insolvência subsequente. Esclarece-se que as últimas três disposições valem para as empresas que não estejam sujeitas à obrigação de apresentação à insolvência.

No § 3 (sobre os fundamentos para a declaração de insolvência a requerimento dos credores) estabelece-se que a abertura de processos de insolvência a requerimento dos credores no período entre 28 de Março e 28 de Junho de 2020 pressupõe que o fundamento para a declaração de insolvência já existisse em 1 de Março de 2020.

Por fim, no § 4 determina-se que a suspensão referida nos §§ 1 e 3 é susceptível de ser prorrogada até 31 de Março de 2021, se isso se justificar por alguma circunstância.

Salta à vista o alcance das medidas e o grau de pormenor conferido à formulação de cada uma.

No que toca exclusivamente à obrigação de apresentação à insolvência, cabe sublinhar duas coisas. Desde logo, o prazo da suspensão é muito mais longo do que o da lei espanhola (até 30 de Setembro de 2020, com possibilidade de extensão até 31 de Março de 2021). Depois, não obstante a suspensão estar dependente também de requisitos substantivos, a conclusão de que a insolvência é consequência da pandemia está facilitada por uma presunção.

Deve advertir-se, porém, que nas hipóteses em que a presunção não funcione (porque não se consegue apurar a situação da empresa em 31 de Dezembro de 2019), a empresa tem de o ónus de demonstrar que a insolvência não teria ocorrido não fosse a pandemia. E, evidentemente, quando se conclua que a insolvência não é imputável à pandemia, o dever de apresentação à insolvência mantém-se, gerando a sua omissão a responsabilidade dos administradores e outras consequências.

2.3. República Checa

Na República Checa, foi aprovada pelo Governo, no dia 31 de Março 2020, uma lei para mitigação do impacto da epidemia, que, previsivelmente, será adoptada em meados de Abril.

Além da suspensão da obrigação de apresentação à insolvência desde a data de entrada em vigor da lei e até seis meses após a cessação do estado de emergência (mas não depois de 31 de Dezembro de 2021), se a insolvência for um efeito da situação extraordinária, as alterações deverão compreender as seguintes medidas: fixar a preferência pelo envio de documentos através do registo público para reduzir o peso da actividade administrativa dos tribunais; obrigar os tribunais a considerarem desculpável o incumprimento de prazos processuais sempre que ele for consequência das medidas extraordinárias, salvo quando o caso esteja já decidido; determinar a impossibilidade de propositura de processos de insolvência pelos credores desde a data de entrada em vigor da lei até 31 de Agosto de 2020; criar a possibilidade de suspensão temporária da execução de planos de reestruturação durante a vigência das medidas de emergência (para planos aprovados até 12 de Março de 2020 e ainda não cumpridos) sem que haja o risco de declaração de insolvência durante este período; descontar o tempo da vigência das medidas de emergência e os seis meses subsequentes ao prazo relevante para acções de impugnação pauliana; e alterar a lei da insolvência para introdução de uma moratória extraordinária com a duração máxima de seis meses, aplicável às empresas que não estivessem insolventes no dia 12 de Março de 2020.

Destaca-se, naturalmente, esta moratória extraordinária. O seu principal objectivo é assegurar protecção temporária em circunstâncias extraordinárias a todas as empresas que são viáveis em circunstâncias normais e assenta na proibição de propositura de acções executivas e da execução de garantias (esta última muito facilitada pelas recentes alterações à lei civil checa). Mas é igualmente concedida alguma protecção aos credores. Por exemplo, continua a ser possível a compensação de créditos, ao contrário do que acontece na moratória típica, o que é plenamente justificado, dado que agora os sujeitos tendem a ser simultaneamente credores e devedores.

Para facilitar o recurso à moratória extraordinária não se exige o consentimento de uma maioria de credores, limitando-se o tribunal a verificar certos requisitos formais. O consentimento só será exigido para a extensão da moratória.

A moratória extraordinária é preventiva por natureza, logo, a sua concessão não pressupõe a apresentação à insolvência. Isto seria fatal para as empresas com as características referidas atrás, que são as destinatárias naturais da moratória. Ao mesmo tempo, a possibilidade de uma moratória extraordinária manter-se-á mesmo depois da abertura do processo de insolvência a pedido de qualquer sujeito que não o devedor. Em qualquer caso, ela aplica-se apenas às empresas que enfrentam dificuldades relacionadas causalmente com a pandemia e não estavam insolventes antes da imposição do estado de emergência.

A concessão da moratória extraordinária também importa restrições: os empresários ou administradores de sociedades devem abster-se de actos que alterem a afectação dos bens ou reduzam o valor do património da empresa. Não ficam impedidos, porém, de recurso aos auxílios especiais do Estado. O tribunal pode nomear um administrador judicial provisório e impor limitações aos poderes de administração e disposição dos empresários ou administradores.

Assim que a moratória extraordinária cesse, não se lhe seguindo um processo de insolvência, o facto de a empresa ter recorrido a ela deve ser automaticamente eliminado do registo.

2.4. Áustria

Na Áustria o Parlamento aprovou, em 21 de Março de 2020, a 2. COVID-19-Gesetz[15].

Por força desta lei, o prazo da obrigação de apresentação à insolvência, que é de sessenta dias a contar da data em que ocorre a insolvência (falta de liquidez ou situação patrimonial líquida negativa) [artigo 69(2), da Insolvenzordnung], estendeu-se para cento e vinte dias.

O artigo 69(2) (a) da Insolvenzordnung prevê expressamente esta extensão na hipótese de a insolvência se dever a desastre natural. Esclareceu-se agora que a noção de desastre natural abrange as pandemias e as epidemias.

No que respeita aos processos judiciais, incluídos os processos executivos e os processos de insolvência, a lei determina que os prazos se interrompem até ao final de Abril e retomam a sua contagem no dia 1 de Maio de 2020. Além disso, o período entre 23 de Março e o final de Abril de 2020 não deve ser contado para efeitos dos prazos dentro do qual devem ser propostas certas acções e praticados certos actos, o que releva, principalmente, nos casos de prazos de caducidade e de prescrição.

2.5. Luxemburgo

No Luxemburgo, o Règlement grand-ducal du 25 mars 2020 portant suspension des délais en matière juridictionnelle et adaptation temporaire de certaines autres modalités procédurales, suspendeu os prazos processuais desde o dia 25 de Março.

O Ministro da Justiça veio esclarecer que aquela suspensão se aplicava no domínio da insolvência e, em particular, abrangia o prazo de trinta dias a contar do conhecimento da situação de insolvência (cessation de paiements) durante o qual os administradores de devem, em representação da sociedade, apresentar-se à insolvência (artigo 440 do Code de Commerce).

2.6. Itália

Em Itália, a primeira iniciativa do legislador italiano respeita à entrada em vigor do (novo) Codice della crisi d’impresa e dell’insolvenza (Decreto legislativo 12 gennaio 2019, n. 14)[16].

Estava previsto que o Codice della crisi entrasse em vigor, na generalidade, no dia 15 de Agosto de 2020[17]. Isto permitiria pôr de parte, definitivamente, a obsoleta Legge Fallimentare (de 1942) e aplicar, por fim, instrumentos modernos e mais adequados à crise das empresas. Começou a recear-se, porém, que, justamente quando é previsível que aconteça uma grande vaga de casos de reestruturação e insolvência, os profissionais (administradores judiciais e tribunais) se deparassem com as dificuldades inerentes à aplicação de regras novas. Por isso, por força do Decreto-Legge 2 marzo 2020, n. 9 (“Decreto Coronavirus”)[18] foi adiada a entrada em vigor de certas disposições do Codice della crisi (respeitantes ao sistema de alerta de empresas em dificuldades[19])[20], equacionando-se agora a possibilidade de adiamento da sua entrada em vigor, in totum, por um ano, ou seja para o dia 15 de Agosto de 2021.

Digno de nota é ainda o Decreto-Legge 17 marzo 2020, n. 18, Misure di potenziamento del Servizio sanitario nazionale e di sostegno economico per famiglie, lavoratori e imprese connesse all’emergenza epidemiologica da COVID-19 (“Decreto Cura Italia”)[21]. Determina-se aí, no artigo 83, 1 e 2, que entre o dia 9 de Março ao dia 15 de Abril de 2020 todas as diligências no âmbito de processos civis e penais pendentes são diferidas para o dia 15 de Abril de 2020[22] e que fica suspenso o curso de todos os prazos para a prática de qualquer acto no âmbito mesmos processos. Suscitou-se a dúvida quanto aos processos de insolvência e de reestruturação de empresas, em particular quanto aos concordatos preventivos pendentes. Na ausência de um esclarecimento oficial, a interpretação da norma tem variado consoante os tribunais, devendo dizer-se que alguns propendem para uma interpretação abrangente, portanto, para a inclusão destes processos na ressalva do artigo 83, 3), a),apenasquando seja comprovado ou evidente um “grave prejuízo para as partes[23].

A falta de outras iniciativas legislativas é criticada, em especial quanto aos poderes processuais dos credores. Defende-se que deveria suspender-se ou limitar-se a possibilidade de propositura de acções executivas contra as empresas bem como os pedidos de declaração de insolvência[24].

Em Itália, não é absolutamente claro que exista uma obrigação de apresentação à insolvência não se referindo expressamente a ela a norma do artigo 6 da Legge Fallimentare, que regula os sujeitos com legitimidade para o pedido de declaração de insolvência. Contudo, o artigo 217, 4), da Legge Fallimentare prevê que os administradores que omitam ou retardem a apresentação incorrem no crime de bancarotta semplice sempre isso origine o agravamento da insolvência, retirando-se daqui a existência daquela obrigação.

2.7. Suíça

Na Suíça, aos primeiros sinais da crise COVID-19, suspenderam-se, em todo o território nacional, e sem mais requisitos, os processos de tipo executivo e de falência (Konkurs)[25].

A medida foi consagrada na Verordnung über den Rechtsstillstand gemäss Artikel 62 des Bundesgesetzes über Schuldbetreibung und Konkurs, em vigor de 18 de Março a 4 de Abril de 2020 (artigo 1)[26] [27].

Note-se que a lei das sociedades suíça sujeita o órgão de administração à obrigação de apresentação à insolvência (apenas) na hipótese de situação patrimonial liquida negativa (Überschuldung) e que estão salvaguardados os casos em que é provável uma reestruturação, a curto prazo, da empresa ou em que os credores acordem na subordinação dos seus créditos.

2.8. França

Contrariando o ritmo dos acontecimentos, a França demorou algum tempo adoptar medidas legislativas no domínio da reestruturação e da insolvência, sendo a única notícia conhecida a de que o Ministro da Justiça tinha enviado instruções aos tribunais no sentido de se absterem de dar início a processos de recuperação ou de insolvência[28].

Por fim, surgiu a Ordonnance n° 2020-341 du 27 mars 2020 portant adaptation des règles relatives aux difficultés des entreprises et des exploitations agricoles à l’urgence sanitaire et modifiant certaines dispositions de procédure pénale[29].

Estabelece-se aí que até que sejam decorridos três meses sobre a data de cessação do estado de emergência a insolvência (cessation de paiements) deve apreciada tendo em consideração a situação do devedor à data de 12 de Março de 2020, sem prejuízo, designadamente, da possibilidade de o devedor pedir a abertura de um processo de insolvência para o fim da recuperação da empresa (redressement judiciaire) ou para o fim da liquidação patrimonial (liquidation judiciaire).

A medida tem sido interpretada, na prática, como um congelamento da obrigação de apresentação à insolvência, que, em França, está sujeita ao prazo de quarenta e cinco dias a contar da data da cessation de paiements (artigo L.631-4 do Code de commerce). Desconsiderando a situação actual (em que a insolvência, presumivelmente, já existe) e mandando dar relevo à situação anterior (em que, presumivelmente, ainda não existia insolvência), ela permite, de facto, ficcionar que não se verifica a situação que desencadeia a obrigação de apresentação à insolvência, trazendo aos administradores os mesmos benefícios que lhes traz a suspensão desta obrigação.

São apontadas ainda outras vantagens à medida, como o facto de ela se traduzir, na prática, numa prorrogação do prazo em que os empresários e os administradores podem recorrer aos processos preventivos (conciliation e sauvegarde).

2.9. Reino Unido

Como se sabe, no Reino Unido não existe, rigorosamente, obrigação de apresentação à insolvência, pelo que não há necessidade de a suspender para evitar a responsabilidade dos administradores por incumprimento.

 Em contrapartida, existem dois institutos importantes, que consagram outras causas de responsabilidade destes sujeitos: o fraudulent trading (section 213 do Insolvency Act) e o wrongful trading (section 214 do Insolvency Act). O primeiro é aplicável quando se demonstra que o administrador teve a intenção de prejudicar os credores. O segundo tem um alcance maior, exigindo apenas que se demonstre que o administrador não adoptou todas as medidas necessárias para eliminar ou reduzir as perdas para os credores apesar de saber ou dever saber que a liquidação da empresa era provável, ou seja, aplica-se sempre que a insolvência é criada ou agravada pela conduta negligente do administrador.

Na sequência de uma proposta apresentada ao Governo inglês pelo Insolvency Committee da City of London Law Society[30], o Insolvency Service anunciou, em 28 de Março de 2020, planos para a reforma do quadro legal. Os objectivos essenciais são a suspensão do wrongful trading e a introdução de um novo quadro normativo para a reestruturação de empresas[31].

Mais precisamente, propõe-se a suspensão temporária do wrongful trading desde o dia 1 de Março e pelo período de três meses, de forma a que os administradores de sociedades possam continuar a gerir a empresa sem a ameaça da responsabilidade, considerando-se os regimes do fraudulent trading e da disqualification (perda de idoneidade para o exercício de certas funções[32]) suficientes para prevenir as condutas desconformes.

Os outros instrumentos previstos são: um novo instrumento de reestruturação em que o plano seja vinculativo para todos os credores; uma moratória baseada na suspensão das acções executivas dos credores durante certo período; a protecção dos fornecimentos para permitir às empresas continuar a actividade durante a moratória; e a criação de garantias para o pagamento dos credores e dos fornecedores.

3. Voltar atrás (reflectere): perspectiva reflexiva

Confrontando os vários modelos disponíveis com a medida de suspensão do prazo de obrigação de apresentação à insolvência agora adoptada na lei portuguesa, destacam-se três aspectos menos positivos.

Em primeiro lugar, destaca-se a independência da suspensão de quaisquer requisitos substantivos.

Com vista a excluir a cobertura dos casos que não merecem ser contemplados, faria sentido exigir-se condições mínimas, pelo menos no que toca à viabilidade ou à recuperabilidade da empresa, como acontece na Alemanha. Uma opção em que as condições são impostas pela negativa e facilitadas por presunções, como acontece na solução alemã, apareceria como razoável, pois asseguraria aquele objectivo sem sobrecarregar excessivamente o empresário ou os administradores de sociedades.

Em segundo lugar, destaca-se o espectro temporal fixado para a suspensão.

Há que reconhecer que as empresas não conseguirão retomar o curso normal da sua actividade imediatamente após a cessação do estado de emergência: nesta data elas estarão exactamente na situação em que estiveram durante todo o período de suspensão, sendo exigível algum tempo até que a situação melhore – o que acontecerá lentamente e só nalguns casos. Seria aconselhável, pois, que a obrigação de apresentação à insolvência ficasse suspensa durante um período (mais) razoável / realista e, dada a imprevisibilidade das circunstâncias, fosse susceptível de prorrogação, como acontece, mais uma vez, na Alemanha. Caso contrário, o efeito da medida é quase nulo.

Por último, mas não menos importante, destaca-se a inserção sistemática da medida no artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, ou seja, numa norma que versa, em conformidade com a sua epígrafe, prazos e diligências.

A singularidade da matéria respeitante à insolvência justificaria bem o tratamento desta medida num regime autónomo. Pior do que isso: a inexistência de um regime autónomo deixa sem resposta questões que podiam e deviam ter sido também reguladas.

Desde logo, nada se diz sobre os requerimentos de declaração de insolvência apresentados por sujeitos distintos da empresa devedora (i.e., distintos do empresário e dos administradores sociais), maxime os credores (cfr. artigo 20.º, n.º 1, do CIRE).

Ora, não obstante a suspensão, até à cessação da situação excepcional, de todos os prazos e as outras limitações introduzidas à prática de actos processuais e procedimentais no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, constantes do n.º 1 e de outros números daquele artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, a verdade é que, ao abrigo do disposto no n.º 7, os processos urgentes, como o processo de insolvência, devem tramitar, sem suspensão ou interrupção de prazos, actos ou diligências, através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente, salvo não sendo possível ou adequado.

Se a suspensão do prazo de apresentação à insolvência protege os empresários e os administradores sociais de responsabilidade e fica automaticamente precludida a abertura de processo de insolvência por iniciativa destes sujeitos, torna-se ainda necessário eliminar quaisquer hipóteses de abertura de processos de insolvência das empresas nesta altura, portanto, também daqueles que possam ser requeridos por outros sujeitos. Não pode esquecer-se que muitas empresas estariam solventes não fosse a pandemia e que algumas delas serão viáveis apesar dela. É preciso evitar o risco de que sejam sujeitas a um processo que, supletivamente (i.e., quase sempre), reveste cariz liquidatório.

A necessidade ficaria assegurada – só ficaria assegurada – se se dispusesse expressamente que (também) fica suspenso o poder processual dos outros sujeitos legitimados, como acontece na Alemanha assim como em Espanha[33].

A necessidade não está coberta – não se argumente – com a regra, já referida, da al. b) do n.º 6 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 (suspensão dos actos a realizar em sede de processo executivo). Por mais que seja costume dizer-se que o processo de insolvência é uma execução universal, o processo de insolvência não é um processo executivo, por razões exaustiva e reiteradamente enumeradas[34], sendo suficiente recordar que a sua finalidade é diferente e respeita a uma situação especial do sujeito (a insolvência).

A segunda consequência daquela opção de localização sistemática é que nada se diz – nada se pode dizer – sobre outras obrigações que impendem sobre os empresários e dos administradores de sociedades, em particular as associadas à situação de insolvência iminente ou de insolvência provável (que, a par da insolvência, é a outra situação provável, tendo em vista a subsistência de custos fixos e a ausência de receitas a que sujeitas).

É pertinente recordar o disposto no artigo 19.º da Directiva sobre reestruturação e insolvência[35]. Obriga-se aí os administradores a adoptar uma conduta adequada a evitar ou a prevenir a insolvência, obrigação esta que está em perfeita compatibilidade com a disciplina dos deveres fundamentais e da responsabilidade dos administradores prevista, tal como prevista, no artigo 64.º, n.º 1, e 72.º e s. (maxime,72.º, 78.º e 79.º) do CSC.

Artigo 19.º

Obrigações dos administradores caso exista uma probabilidade de insolvência

Os Estados-Membros asseguram que, caso exista uma probabilidade de insolvência, os administradores têm em devida conta, pelo menos, os seguintes aspetos:

a) Os interesses dos credores, dos detentores de participações e das outras partes interessadas;

b) A necessidade de tomar medidas para evitar a insolvência; e

c) A necessidade de evitar uma conduta dolosa ou com negligência grosseira que ameace a viabilidade da empresa.

Numa leitura da norma em conjugação com os considerandos 70 e 71 da Directiva, é possível afirmar que, numa situação de pré-insolvência, os administradores devem, entre outras coisas,a procurar aconselhamento profissional em matéria de insolvência e reestruturação de empresas, recorrendo, por exemplo, aos instrumentos de alerta precoce e mantendo um registo actualizado da contabilidade da empresa; a obrigação de proteger o activo da sociedade, de modo a maximizar o valor e evitar a perda de activos essenciais; a obrigação de tomar em consideração a estrutura e as funções da empresa, a fim de analisar a sua viabilidade e reduzir as despesas; a obrigação de não sujeitar a sociedade a tipos de transacções que envolvam risco excessivo ou sejam susceptíveis de impugnação pela generalidade dos credores, excepto se tal se justificar do ponto de vista empresarial; a obrigação de prosseguir a actividade, caso tal seja adequado a fim de maximizar o valor da empresa em actividade; a obrigação de estabelecer negociações com os credores e iniciar o processo de reestruturação preventiva.

Decorre, em suma, da Directiva para os administradores uma obrigação de prevenção da insolvência. Vendo bem, este já era induzível de normas legais de protecção, como seja a do 186.º do CIRE[36], da qual resulta um dever geral ou genérico de não contribuir com dolo ou culpa grave para a criação ou agravamento da insolvência (cfr. artigo 186.º, n.º 1, do CIRE), mas agora surgem na Directiva, (mais) bem concretizado num conjunto de obrigações especiais ou específicas. Em consequência disto, a margem de discricionariedade dos administradores reduziu-se[37] e a sua responsabilização em caso de desvio ficou facilitada.

Ora, dadas as circunstâncias, os administradores podem não conseguir cumprir estas obrigações ou não conseguir cumpri-las cabalmente. Importaria tranquilizá-los, estabelecendo limites à sua responsabilidade por estas outras causas, como se fez na Alemanha e se planeia fazer no Reino Unido. Poder-se-ia, por exemplo, determinar que as operações que sejam indispensáveis ao curso normal da actividade ou à reestruturação da empresa não originam, nesta altura, a responsabilidade dos administradores.

Outros aspectos importantes para os desígnios de possibilitar a subsistência e favorecer a reestruturação de empresas ou, no mínimo, evitar insolvências em massa poderiam e deveriam ser regulados mas foram omitidos.

Referem-se apenas dois exemplos.

Primeiro, poderia limitar-se a possibilidade de resolução em benefício da massa e impugnação pauliana de certos actos praticados durante este período em processos de insolvência subsequentes. A medida levantaria um grande obstáculo à concessão de novos financiamentos às empresas.

Segundo, poderia estabelecer-se uma derrogação temporária das regras que regulam o incumprimento (muito provável) de obrigações previstas em planos de insolvência / recuperação ou reestruturação, de modo a que não se produzissem as consequências tipificadas na lei e, sobretudo, o incumprimento de planos de insolvência / recuperação não constituísse fundamento para pedidos de declaração de insolvência [artigo 20.º, n.º 1, al. f), do CIRE][38] [39].

Em conclusão, talvez seja o caso de o legislador português voltar ao local da intervenção e, simplesmente, tentar outra vez, com o conforto de saber que estão disponíveis modelos para as soluções necessárias no Direito estrangeiro, em especial – já se compreendeu – no Direito alemão.

A terminar, é irresistível dizer que o ideal seria que existisse uma medida-programa – uma medida-programa única, mais completa e independente de processos de insolvência ou instrumentos de reestruturação), que permitisse às empresas, durante o período crítico, conforme referido noutra altura[40], um abrigo, uma “hibernação” ou um “sono de Inverno” (Winterschlaf). Poderia designar-se “moratória extraordinária”, como a proposta na República Checa. Concentraria várias medidas extraordinárias que é possível encontrar avulsas, quais sejam a suspensão da obrigação de apresentação à insolvência, a concessão de estímulos e protecção aos novos financiamentos, a impossibilidade da propositura e do curso de providências de tipo executivo, a impossibilidade do exercício de certos direitos no âmbito dos negócios em curso e o dever de renegociação, em boa-fé, de certas obrigações (através da convenção de moratórias, redução do montante da dívida ou remissão) e outras. Deveria estar reservada a situações extraordinárias, mas estar pronta a aplicar (ex vi legis) em todas as situações extraordinárias, à imagem do que acontece na Áustria quanto à prorrogação da obrigação de apresentação à insolvência em situações de calamidade. Pode ter-se a ilusão de que a crise COVID-19 é uma crise extraordinária, logo irrepetível, mas a verdade é que outras crises extraordinárias aconteceram e tendem a acontecer. Deve, enfim, começar a aceitar-se que as crises extraordinárias fazem parte de uma espécie de rotina periódica ou cíclica na vida humana.

Talvez com mais tempo, ou noutro tempo, seja possível voltar a este assunto.

                                                                                   8 de Abril de 2020


[1] O estado de emergência foi declarado no Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de Março (disponível em https://dre.pt/application/file/a/130326423).

[2] O estado de emergência foi renovado no Decreto do Presidente da República n.º 17-A/2020, de 2 de Abril (disponível em https://dre.pt/application/file/a/131068189).

[3] Disponível em https://dre.pt/application/file/a/131193532.

[4] Disponível em https://dre.pt/application/file/a/130472765.

[5] Cfr. Catarina Serra, “COVID-19 / Para uma legislação para a crise das empresas em tempos de ‘crise total’”, in:Observatório Almedina,2020 (disponível em https://observatorio.almedina.net/index.php/2020/04/03/covid-19-para-uam-legislacao-para-a-crise-das-empresas-em-tempos-de-crise-total/).

[6] Já estão disponíveis tabelas ou breves textos com referência às medidas extraordinárias de cada país na sequência da pandemia. Cfr., por exemplo, CERIL Executive Statement 2020-1 on COVID-19 and insolvency legislation (Reporters: Stephan Madaus e Bob Wessels, de 20 de Março de 2020 (disponível em https://www.ceril.eu/news/ceril-statement-2020-1), Aurelio Gurrea Martínez “Insolvency Law in Times of COVID-19”, de 22 de Março de 2020 (disponível em https://www.derechoyfinanzas.org/en/insolvency-law-in-times-of-covid-19/), “INSOL Europe – Coronavirus (COVID-19) Tracker of insolvency reforms globally (as at 3 April 2020)” (disponível em https://www.insol-europe.org/technical-content/covid19), Stephan Madaus, “Covid-19 Maßnahmen weltweit – ein Überblick”, de 4 de Abril de 2020 (disponível em https://stephanmadaus.de/2020/04/04/covid-19-massnahmen-weltweit-ein-ueberblick/).

[7] Disponível em https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2020-3824.

[8] Prevalecendo o concurso necesario evita-se a responsabilização dos administradores e produzem-se as vantagens típicas do concurso necesario, como a manutenção da administração à frente da empresa.

[9] Para um comentário a esta medida cfr. Enrique Moreno Serrano, “El deber de solicitar el concurso de acreedores durante el estado de alarma”, de 18 de Março de 2020 (disponível em https://concursoysociedades.blogspot.com/2020/03/el-deber-de-solicitar-el-concurso-de.html).

[10] Cfr., por exemplo, Aurelio Gurrea Martínez “Insolvency Law in Times of COVID-19”, de 22 de Março de 2020 (disponível em https://www.derechoyfinanzas.org/en/insolvency-law-in-times-of-covid-19/).

[11] Disponível em https://www.lamoncloa.gob.es/consejodeministros/referencias/paginas/2020/refc20200324.aspx.

[12] Disponível em https://www.bgbl.de/xaver/bgbl/text.xav?SID=&tf=xaver.component.Text_0&tocf=&qmf=&hlf=xaver.component.Hitlist_0&bk=bgbl&start=%2F%2F*%5B%40node_id%3D%27449038%27%5D&skin=pdf&tlevel=-2&nohist=1.

[13] O acto tem eficácia retroactiva a 1 de Março de 2020.

[14] Os trabalhos preparatórios da lei foram sendo comentados por Stephan Madaus em “Covid-19 – Der Gesetzgeber muss das Insolvenzrecht anpassen”, de 15 de Março de 2020 (disponível em https://stephanmadaus.de/2020/03/15/covid-19-der-gesetzgeber-muss-das-insolvenzrecht-anpassen/), “Covid-19: Die bedingte Aussetzung der Insolvenzantragspflichten genügt nicht”, de 17 de Março de 2020 (disponível em https://stephanmadaus.de/2020/03/17/covid-19-die-bedingte-aussetzung-der-insolvenzantragspflichten-genuegt-nicht/) e “Covid-19: Insolvenzgesetzgeber bewegen sich (langsam) in die richtige Richtung”, de 23 de Março de 2020 (disponível em https://stephanmadaus.de/2020/03/23/covid-19-gesetzgeber-bewegen-sich-langsam-in-die-richtige-richtung/).

[15] Disponível em https://www.ris.bka.gv.at/eli/bgbl/I/2020/16.

[16] Disponível em https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2019/02/14/19G00007/sg.

[17] Antes de entrar em vigor, o Código foi já alterado pela Legge 28 febbraio 2020, n. 8, di conversione del Decreto Milleproroghe (Decreto-Legge 30 dicembre 2019, n. 162).

[18] Disponível em https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2020/03/02/20G00026/sg.

[19] O sistema italiano, previsto nos capítulos II e III do título II do Codice della crisi denomina-se, não gratuitamente, strumenti di alerta e procedimento di composizione assistita della crisi e apresenta certa complexidade. Compreende, entre outras coisas, obrigações que impendem, por um lado, sobre determinadas estruturas de controlo / fiscalização (auditores internos e externos) que se concretizam na obrigação de endereçar um alerta aos administradores da empresa, estando previsto um prazo curto (30 dias) para que estes adoptem as medidas adequadas à situação. No caso de não haver reacção, as estruturas de controlo informam o Organismo di Composizione della Crisi d’Impresa (OCRI), um organismo independente integrado no Registo Comercial e com competências no âmbito da crise da empresa. Existem, por outro lado, obrigações que impendem sobre credores públicos qualificados (Autoridade Tributária, Segurança Social e outros), igualmente concretizadas na obrigação de dirigir um alerta no caso de o passivo exceder determinados limites; se não houver alteração do passivo ou uma intervenção dentro de certo prazo (90 dias), estes credores informam também o OCRI. Sobre o sistema italiano em maior detalhe cfr., por exemplo, Paola Vella, “L’epocale introduzione degli strumenti di allerta nel sistema concorsuale italiano”, in: Questione Giustizia, 2019, 2, pp. 240 e s. (disponível em http://questionegiustizia.it/rivista/2019/2/l-epocale-introduzione-degli-strumenti-di-allerta-nel-sistema-concorsuale-italiano_668.php). Com as recentes alterações, continua com entrada em vigor prevista para o dia 15 Agosto de 2020 a norma que prevê as obrigações das estruturas de controlo das sociedades de assegurar que o órgão de administração avalia constantemente, assumindo as iniciativas que, em consequência, sejam necessárias, se a estrutura organizativa da empresa é adequada, se existe equilíbrio económico e financeiro e qual é o curso previsível da gestão da empresa, bem como de alertar estas estruturas para a existência de fundados indícios de uma situação de crise (art. 14, 1). Em contrapartida, é postergado o início de vigência para o dia 15 de Fevereiro de 2021 das normas que prevêem a obrigação das estruturas de controlo das sociedades de alertar o OCRI na hipótese de omissão ou resposta desadequada por parte daquele órgão de administração ou de não adopção das medidas consideradas necessárias para superar o estado de crise (art. 14, 2) e a obrigação de alerta a cargo dos credores públicos qualificados (cfr. art. 15).

[20] Diga-se, em abono da verdade, que o adiamento da entrada em vigor já estava previsto no Decreto legislativo recante disposizioni integrative e correttive al Codice della crisi d’impresa e dell’insolvenza, aprovado pelo Conselho de Ministros de 13 de Fevereiro de 2020, ao abrigo da autorização da Legge delega 8 marzo 2019, n. 20.

[21] Disponível em https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2020/03/17/20G00034/sg.

[22] O diploma foi antecedido pelo Decreto Legge 8 marzo 2020 n. 11/2020, Misure straordinarie ed urgenti per contrastare l’emergenza epidemiologica da COVID-19 e contenere gli effetti negativi sullo svolgimento dell’attività giudiziaria (disponível em https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2020/03/08/20G00029/sg), cuja única diferença para, os presentes efeitos, era a data-limite (22 de Março de 2020).

[23] É ainda de assinalar o disposto no art. 91 do mesmo diploma, que introduz uma novidade na disciplina da mora e do incumprimento definitivo: o respeito pelas medidas de contenção deve ser avaliado para efeitos da exclusão da responsabilidade do devedor. Por outras palavras, em situações de mora ou de incumprimento ocorridas neste período pode sempre invocar a impossibilidade do cumprimento em respeito daquelas medidas de contenção.

[24] Cfr. Marcello Pollio / Gianluca Vidal, “Codice della crisi verso il rinvio. Ma l’Italia potrebbe anche sospendere gli atti esecutivi”, in: Diritto & Fisco, 31 de Março de 2020, p. 27 (disponível em https://www.italiaoggi.it/news/codice-della-crisi-d-impresa-verso-il-rinvio-2436100).

[25] A duração prevista para a medida corresponde ao período de vigência desta Ordonnance, ou seja, de 19 de Março até 4 de Abril de 2020 (cfr. art. 2).

[26] Disponível em https://www.admin.ch/opc/fr/classified-compilation/20200804/index.html.

[27] Apesar de esta lei já não estar em vigor e de a medida não ter sido renovada, é consensual que as acções continuam suspensas, uma vez que se entrou a seguir à cessação da vigência desta lei em período de férias judiciais (férias da Páscoa). Note-se que estas férias foram prolongadas até 19 de Abril de 2020.

[28] Na mensagem enviada, o Ministro da Justiça explicava que a abertura destes processos não era, actualmente, uma prioridade e corria o risco de se tornar ineficaz, dado que os tribunais estão encerrados ou a funcionar com restrições. No caso dos processos em curso, a instrução era para que apenas fossem proferidas decisões sobre o plano de transmissão da empresa e quando este tenha impacto nos direitos dos trabalhadores. No que toca ao processo, confidencial e informal, de conciliação (conciliation), o Ministro da Justiça entendia que os prazos não eram compatíveis com a situação actual, uma vez que as negociações para o plano de restruturação deviam estar concluídas no prazo de cinco meses. Em contrapartida, o processo, também confidencial e informal, do mandat ad hoc era susceptível de disponibilizar às empresas que não tivessem cessado a sua actividade o apoio de que necessitam. Comentando esta situação, Emmanuelle Inacio [“A closer look at: The impact of COVID-19 on (pre-)insolvency”, in: Eurofenix – The Journal of INSOL Europe, 2020, n.º 79, pp. 14-15] preconizava o recurso aos meios electrónicos dada a necessidade de continuar a permitir às empresas aceder aos instrumentos de recuperação.

[29] Disponível em https://www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte=JORFTEXT000041762344&categorieLien=id.

[30] “Proposals for Mitigating the Short Term Effects on Viable Businesses of COVID-19” (disponível em http://www.citysolicitors.org.uk/storage/2020/03/CLSL-Insolvency-Law-Committee-Paper-mitigating-the-effects-of-Covid-19-002-1.pdf).

[31] O anúncio está disponível em https://www.gov.uk/government/news/regulations-temporarily-suspended-to-fast-track-supplies-of-ppe-to-nhs-staff-and-protect-companies-hit-by-covid-19.

[32] A disqualification é semelhante à inibição para a ocupação de certos cargos prevista no art. 189.º, n.º 2, al. c), do CIRE.

[33] Um modelo para uma disposição deste tipo é o n.º 11 do art. 7.º da Lei n.º 1-A/2020, segundo o qual ficam suspensas as ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa imóvel arrendada em certas circunstâncias).

[34] Cfr., por exemplo, Catarina Serra, A falência no quadro da tutela jurisdicional dos direitos de crédito — O problema da natureza do processo de liquidação aplicável à insolvência no Direito português, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 167 e s.

[35] Directiva (UE) 2019/1023 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de Junho de 2019 sobre os regimes de reestruturação preventiva, o perdão de dívidas e as inibições, e sobre as medidas destinadas a aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas, e que altera a Directiva (UE) 2017/1132 (disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32019L1023&from=EN).

[36] Cfr., neste sentido, Manuel Carneiro da Frada, “A responsabilidade civil dos administradores na insolvência” in: Revista da Ordem de Advogados, 2006, II, pp. 694 e s., Nuno Manuel Pinto Oliveira, Responsabilidade civil dos administradores – Entre o Direito Civil, Direito das Sociedades e Direito da Insolvência, Coimbra, Coimbra Editora, 2015, pp. 211 e s., e Jorge Coutinho de Abreu, “Direito das Sociedades e Direito da Insolvência: interacções”, in: Catarina Serra (coord.), IV Congresso de Direito da Insolvência, Coimbra, Almedina, 2017, pp. 189-190.

[37] Apontam neste sentido as conclusões de Jorge Coutinho de Abreu[“Administradores e (novo?) dever geral de prevenção da insolvência”, Catarina Serra (coord.), V Congresso de Direito da Insolvência, Coimbra, Almedina, 2019, pp. 234-235].

[38] Sobre o incumprimento do plano de insolvência / recuperação e as suas consequências, cfr. Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência, Coimbra, Almedina, 2019 (reimpressão), pp. 323 e s.

[39] Esta norma não é aplicável ao plano de reestruturação obtido em PER. Cfr., este sentido, Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência, cit., p. 485. A consequência do incumprimento destes planos é a “quarentena” de dois anos prevista art. 17.º-G, n.º 6, do CIRE mas propende-se para entender que está salvaguardada a força maior: a consequência é inaplicável quando a empresa demonstre que o requerimento de novo PER é motivado por factores alheios ao próprio plano e a alteração superveniente é alheia à empresa (cfr. art. 17.º-F, n.º 13, do CIRE). Sobre o incumprimento do plano de reestruturação obtidos em PER e suas consequências, cfr. Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência, cit., pp. 482 e s.

[40] Cfr. Catarina Serra, “COVID-19 / Para uma legislação para a crise das empresas em tempos de ‘crise total’”, in:Observatório Almedina,2020 (disponível em https://observatorio.almedina.net/index.php/2020/04/03/covid-19-para-uam-legislacao-para-a-crise-das-empresas-em-tempos-de-crise-total/).