Cláudia Rodrigues Rocha

Licenciada em Direito pela Universidade Portucalense Infante D. Henrique.
Mestre em Direito Tributária pela Escola de Direito da Universidade do Minho.
Advogada na Henrique Pina Lopes & Associados, Sociedade de Advogados, R.L.


O Preço da Justiça – As Taxas na Justiça sob uma Perspetiva Jurídico-Tributária é a recente obra de sua autoria. Obra publicada pelo Grupo Almedina e disponibilizada no mercado a 1 de Setembro de 2022.

Consulte a obra neste link.


Enquadramento

A taxa de justiça – este figurino tão proeminente quando se está perante o acesso à justiça, e, em última instância, a própria realização do Direito – ainda não foi merecedora da devida atenção no Direito tributário. Para tal impolidez na dogmática tributarista, prognosticamos, contribuirá a ideia de que a ciência jurídica não se deverá ocupar de uma matéria tão menor ou estéril como esta e que, da mesma, apenas devem ser conhecedores os funcionários judiciais. Tal forma de ver as coisas, porém, não nos parece persuasiva. Independentemente dos motivos que têm conduzido a esta negligência no seu tratamento – e de que não importa aqui cuidar – não custará reconhecer que a taxa de justiça é um tributo público[1] e que, por isso, a sua análise deve, em primeira instância, ser efetuada através da objetiva do Direito tributário. Deverá, então, perguntar-se: estaremos perante uma genuína taxa, como a designação assim parece intuir, ou, pelo contrário, um imposto encapotado? A relevância desta questão não se esgota num mero exercício teórico ou de arrumação de matérias. É que, identificada a sua natureza jurídico-tributária, impõe-se apurar os critérios adequados a uma justa repartição dos encargos públicos, o que, por sua vez, coloca várias, complexas e delicadas questões, a começar pela base tributável da taxa de justiça.

O presente artigo apresenta-se, assim, como um modesto contributo para uma análise da taxa de justiça sob a lente do Direito tributário, com especial enfoque para a sua natureza jurídico-tributária.

1.      O sistema financeiro do Estado e o tributo enquanto receita pública (brevíssima introdução)

Uma das funções do Estado é a satisfação de necessidades de natureza coletiva, ou seja, necessidades que, concretamente, se fazem sentir pela comunidade, conforme se extrai, desde logo, do art. 81.º, da nossa norma normarum. A realização desta tarefa, implica, inexoravelmente, despesa pública, o que, por sua vez, significa que o Estado necessita dinheiro, ou seja, financiamento. Como, por certo, já resulta do que acabamos dizer, a atividade financeira do Estado deve perseguir um objetivo capital: o da prossecução do interesse público[2]. Ora, de entre as diversas formas de obtenção de receita com vista à perseguição do bem comum, merecem aqui destaque as receitas públicas, mais concretamente as receitas tributárias[3]. O tributo não se encontra normativamente definido, sendo tarefa da doutrina mais avalizada conceder-lhe uma noção jurídica. Tradicionalmente, a noção jurídica de tributo é estruturada pela doutrina à luz da captação de receitas públicas (e consequente satisfação de necessidades coletivas) a prosseguir através desta figura. Neste particular, Alberto Xavier sustenta que o “[t]ributo é a prestação patrimonial estabelecida por lei a favor de uma entidade que tem a seu cargo o exercício de funções públicas, com o fim imediato de obter meios destinados ao seu financiamento”[4]. Em perfeita sintonia, J. L. Saldanha Sanches define tributos como sendo “[…] as receitas cobradas pelo Estado ou por outros entes públicos para a satisfação de necessidades públicas, sem função sancionatória”[5]. O tributo configura-se, portanto, como uma prestação de natureza pecuniária, de índole legal, exigido por entes que exercem funções ou tarefas públicas, para acudir financeiramente a necessidades coletivas e sem finalidades sancionatórias. Importa, ainda, fazer notar que, em nosso ver, para se compreender este figurino legal na sua amplitude, não podemos olvidar as finalidades orientadoras ou extrareditícias[6] que algumas espécies tributárias podem, em concreto, prosseguir[7]. O tributo, além da prototípica finalidade financeira stricto sensu, pode assumir-se como um instrumento, por exemplo, de reorientação de comportamentos individuais, de desincentivo à prática de certos atos ou de limitação da procura de certo bem ou serviço, casos em que a arrecadação de receita assume um papel secundário[8]. Os tributos que prosseguem estas finalidades são também apelidados de tributos pigouvianos em homenagem a Arthur Cecil Pigou, ou tributos corretivos[9]. Ora, entre as receitas tributárias, identificamos os impostos, as taxas e as contribuições[10]. O presente artigo orbita em torno da taxa de justiça e uma rigorosa entrada nessa matéria e, em particular, na respeitante à reflexão sobre a sua natureza jurídico-tributária, implicaria prima facie abordar as diversas espécies tributárias que acabamos de referir. Não o faremos, porém, não só por evidente limitação expositiva, mas porque, como é sabido, as mesmas têm sido objeto de abundante estudo pela doutrina. Com esta nota, olhemos, então, para a personagem principal deste artigo – a taxa de justiça.

2.      Perfil da taxa de justiça

2.1.  Uma clarificação: a distinção entre taxa de justiça e custas processuais

O n.º 1, do art. 3.º, do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pela Decreto – Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, com a última redação conferida Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro[11], consigna que “[a]s custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de partes”. Ora, antes de avançarmos, torna-se desde logo evidente a imprecisão de que resulta da utilização indistinta dos termos custas e taxa de justiça. Não se trata de uma questão meramente terminológica. Para uma melhor compreensão, importa começar por distinguir entre custas em sentido amplo e custas em sentido estrito[12]. No primeiro caso, as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte. Já as custas em sentido estrito referem-se apenas aos encargos e custas de parte, estando relacionadas com o decaimento na causa, e não com o impulso processual. Ora, embora a taxa de justiça integre o conceito de custas lato sensu, não se confunde com estas, porquanto as custas processuais são a categoria genérica que integra cada uma das espécies de custos ou dispêndios que o acesso à justiça envolve[13]. Esta é uma nota de magna relevância, por um lado, porque é muito comum encontrarmos na jurisprudência e em construções doutrinais a utilização inexata do termo custas quando se pretende apenas referir-se à taxa justiça[14] e, por outro lado, porque esta distinção implica, desde logo, consequências ao nível tributário. É que, em bom rigor, apenas a taxa de justiça poderá integrar uma relação jurídica tributária. Não cremos, portanto, ser de atribuir natureza tributária aos encargos e custas de parte. De uma forma extremamente sintética, dir-se-á que os encargos se traduzem numa despesa com terceiros (que não se encontram em confronto na lide, portanto), como é o caso dos peritos e das testemunhas, ao passo que as custas de parte traduzem-se numa compensação devida pelo vencido ao vencedor, e que integra, entre outras, um montante equivalente ao que este haja despendido a título de taxa de justiça, na proporção do vencimento[15]. As custas de parte integram, assim, uma relação creditícia estabelecida unicamente entre os litigantes, motivo pelo qual não podemos comungar com algumas construções dogmáticas que atribuem natureza tributária à “taxa de justiça” paga pelo vencido ao vencedor[16].  Desmitificando, esta “taxa de justiça” que o vencido está obrigado a pagar ao vencedor não é mais do que uma compensação no valor equivalente à taxa de justiça por este paga, não podendo qualificar-se como uma taxa, nem sequer reconhecer-lhe natureza tributária. Nem se compreenderia que assim fosse. Qual seria o seu pressuposto? E a sua finalidade? Onde se descortina a finalidade de angariação de receita pública se estamos perante uma compensação entre os litigantes? Mas, antes de continuarmos, uma última reflexão, por oportuna. A taxa justiça paga pelo sujeito processual ativo não deve ser submetida a tratamento diverso daquela que é paga pelo sujeito processual passivo, uma vez que há uma identidade de pressuposto, finalidade e de facto tributário. Como veremos adiante, o pagamento da taxa de justiça é independente da posição processual que o sujeito passivo ocupe na causa, ou seja, se é autor, requerente, recorrente, réu, requerido, recorrido, et cetera. O que é relevante é que – mesmo que, posteriormente, se venha a apurar, por exemplo, não deter personalidade judiciária ou seja declarada a sua ilegitimidade processual – tenha ativado o aparelho judicial. Com efeito, também nos afastamos de algumas posições doutrinárias que procuram neste contexto operar uma distinção[17].

2.2. A construção doutrinal do conceito de taxa de justiça

Guarda-se no n.º 1, do art. 6.º, do RCP, a definição normativa de taxa de justiça e que, assim, corresponde “[…] ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento […]”. Em sintonia, o n.º 2, do art. 529.º, do Código de Processo Civil[18], explica que “[a] taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais”. No preâmbulo do Decreto – Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, pode ler-se que a taxa de justiça é “[…] o valor que cada interveniente deve prestar por cada processo como contrapartida da prestação de um serviço”. Estas definições, porém, pecam por não conseguir revelar a taxa de justiça na sua amplitude. Sobrevoando, então, a doutrina, a taxa de justiça pode ser definida como “[…] a prestação pecuniária que o Estado, em regra, exige aos utentes do serviço judiciário no quadro da função jurisdicional por eles causada ou da qual beneficiem, ou seja, trata-se do valor que os sujeitos processuais devem prestar como contrapartida mínima relativa à prestação aquele serviço” [19], nas palavras de Salvador da Costa. No seu estudo dedicado ao princípio da equivalência como critério de igualdade tributária, Sérgio Vasques refere que “[a] taxa de justiça constitui um tributo público com raízes históricos fundas, destinado a remunerar a administração da justiça por parte dos tribunais, e que, juntamente com os encargos, destinados a remunerar as prestações instrumentais de entidades públicas e particulares, compõe as custas judiciais […][20]”. José António Coelho Carreira, ainda que sem registar expressamente uma definição de taxa de justiça, coloca a tónica no impulso processual e, assim, anota que “[c]om a expressão «devida pelo impulso processual», mais não pretende o legislador significar que quando uma parte inicia a sua actividade processual, deverá efectuar o pagamento da taxa de justiça devida  ou, dito de outra forma, quando o interessado «solicita» ou incita, com a sua intervenção processual, que lhe seja prestado o serviço, cujo pagamento da taxa de justiça constitui a contrapartida”[21]. De acordo com os ensinamentos de António Santos Abrantes Geraldes, a taxa de justiça “[…] tem como objectivo compensar o Estado pelos serviços que envolve a tramitação de uma qualquer ação judicial, deste modo imputando aos responsáveis ou aos beneficiários pelo menos uma parte da despesa realizada”[22]. O autor também assinala que “[e]m bom rigor, apenas a taxa de justiça justifica a configuração da obrigação de pagamento de custas como relação jurídica para-fiscal, uma vez que os componentes dos encargos integram meros reembolsos de despesas […]”. Hélder Martins Leitão salienta que “[e]xistindo a prestação de um serviço por parte de uma entidade, natural é que quem dele beneficia contribua para o seu pagamento, melhor dizendo, para, pelo menos, a diminuição de encargos que aquele ocasiona. […] Como quer que seja, permanece na base uma relação de carácter obrigacional, isso é um facto, no qual o Estado ocupa a posição de sujeito activo e o utente do serviço de justiça, a de sujeito passivo”[23].

2.3. A anatomia da taxa de justiça

Considerando os subsídios doutrinários que acabamos de analisar, não custará concluir que, independentemente da natureza jurídico-tributária – que analisaremos a seguir -, a taxa de justiça tem vindo a ser delineada como uma compensação ao Estado pelo serviço justiça. Aprofundemos, então, esta afirmação, trançando um esboço da taxa de justiça olhando aos elementos objetivo, subjetivo e teleológico. Assim, podemos começar por dizer que, sob o ponto de vista objetivo, a taxa de justiça apresenta-se como uma prestação pecuniária, traduzindo-se na entrega em dinheiro, e não na prestação de um facto ou na entrega de uma coisa[24] e, como prestação que é, integrará uma relação jurídica obrigacional. É, ainda, tendencialmente definitiva porque a importância pecuniária paga pelo sujeito passivo, em princípio, não confere direito a reembolso, restituição ou indemnização[25]. No que respeita à incidência subjetiva podemos afirmar que se dirige a um específico sujeito passivo que é, efetivamente, o causador ou o beneficiário da prestação pública, e que tanto pode ser uma pessoa singular ou coletiva, um ente particular ou público, e independentemente da posição processual que ocupe na lide (autor/réu, requerente/requerido, recorrente/recorrido, etc.), sem prejuízo das isenções legalmente tipificadas e do benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo[26]/[27]. No pólo ativo da relação jurídica encontrar-se-á sempre um ente público, embora a definição do sujeito ativo da relação jurídica tributária de taxa de justiça – que não abordaremos aqui – não se afigure empreitada fácil[28]. O derradeiro elemento é o elemento teleológico, e, neste contexto, podemos dizer que a taxa de justiça se destina à captação de receita pública, embora, como veremos, direcionada para uma vertente compensatória.

3.      A natureza jurídico-tributária da taxa de justiça

3.1. Considerações doutrinais e jurisprudenciais sobre a natureza jurídico-tributária da taxa de justiça

É chegado o momento de analisar a natureza jurídico-tributária da taxa de justiça[29].

Durante vários anos, até 1935, o sistema de tributação dos litígios assentava no critério “acto por acto e termo por termo”[30]. Esta regra constava da Tabela de Emolumentos e Salários Judiciais, aprovada pela Lei de 13 de maio de 1896, à qual se seguiu a Tabela dos Emolumentos Judiciais, em vigor até à aprovação do Decreto – Lei n.º 25 882, de 1 de outubro de 1935. Na verdade, foi só com aquele diploma, que logo entrou em vigor, que se operou uma profunda alteração no modelo de tributação do acesso à justiça, criando-se o imposto de justiça[31]. Esta terminologia vigorou na nossa ordem jurídica durante cerca de cinquenta anos. A modificação do termo “imposto de justiça” para “taxa de justiça” viria, então, a ocorrer com o Decreto – Lei n.º 387-D/87, de 29 de dezembro. Sobrevoando o seu texto preambular, consta que a designação de taxa de justiça “[…] se reputa mais adequada do que a de imposto de justiça” [32]. Terá sido uma mera questão de terminologia ou terá mesmo o legislador pretendido adequar o nomen iuris à sua natureza jurídica? A doutrina portuguesa parece estar consolidada no que respeita à qualificação da taxa de justiça: trata-se de uma genuína taxa. Para Salvador da Costa “[a] designação de «taxa de justiça» é a correta porque o imposto consiste na prestação coativa e unilateral exigida pelo Estado com vista à realização de fins públicos, e a taxa corresponde ao preço, autoritariamente estabelecido pela utilização de bens que dela é contrapartida”[33]. Em sintonia, António Santos Abranges Geraldes assinala que “[a] actual designação da componente essencial das custas judiciais (a taxa de justiça) veio substituir a expressão «imposto de justiça», correspondendo, assim, a uma forma tecnicamente mais correcta de identificar a contrapartida devido ao Estado pelos particulares que recorrem aos serviços judiciais para resolução de conflitos de natureza privada”[34]. A propósito das taxas devidas pela prestação de um serviço, J. L. Saldanha Sanches afirma que “[h]á um serviço público no caso das actividades notariais e registrais, nos casos da educação e da justiça, ou não mera passagem de uma certidão”[35]. Pedro Soares Martinez também sufraga o entendimento de que o imposto de justiça correspondia a uma taxa[36], e, no mesmo sentido, António Braz Teixeira observa existirem “[…] taxas designadas na lei como impostos, como, por ex., o chamado imposto de justiça[37]. Casalta Nabais, ainda que não aborde diretamente a matéria, observa, ao referir-se às taxas, enquanto contraprestação de uma atividade específica, que se trata de “[…] actividade que se vem a concretizar seja na prestação de um serviço público, como as taxas devidas […] pelos serviços de justiça (taxa de justiça) […]”[38]. Por fim, mas não menos importante, é curioso assinalar que Alberto Xavier distinguia, a propósito das taxas devidas pela prestação de serviços públicos, as taxas judiciais das taxas administrativas, consoante a natureza da atividade desenvolvida pelo ente público. Assim, as taxas judiciais reconduziam-se ao conceito tradicional de custas, abrangendo o imposto de justiça, o imposto do selo e os encargos, embora impressivamente assinalasse que estes não tinham carácter tributário, por se tratarem de reembolsos de despesas efetuadas pelos serviços, de papel, correio, etc.[39].

3.2. A posição do Tribunal Constitucional

De acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, a taxa de justiça também é uma verdadeira taxa, sustentando-se que “[o] que se chamava de imposto de justiça «não tem a natureza de um imposto, mas sim, verdadeiramente de uma taxa». O que está em causa é a «a prestação, ao menos em parte, de contrapartida pela utilização do ‘serviço de justiça’ e não a arrecadação de receitas para o Estado como modo de lhe proporcionar os meios financeiros necessários à prossecução dos seus encargos gerais, como é o caso dos impostos” [40]. Assim, “[…] é hoje possível dar como assente que a «taxa» de justiça se assume, no âmbito tributário, como uma taxa, e não como um imposto, o que significa que o facto que lhe dá causa não é uma dada manifestação da capacidade contributiva, antes a prestação, pela administração da justiça, de um determinado serviço público[41].

3.3. A natureza tributária da taxa de justiça em ordenamentos externos

A discussão sobre a natureza jurídico-tributária da taxa de justiça – melhor dizendo, da prestação devida pelo serviço justiça, uma vez que pode assumir uma base terminológica distinta – não é exclusiva da nossa ordem jurídica, ocorrendo, por exemplo, em Espanha, no Brasil e na Colômbia. Neste contexto, podem ser apresentadas algumas definições jurídicas normativas. O Código Tributário do Rio de Janeiro, aprovado pelo Decreto – Lei n.º 05 de 15 de março 1975, com a última redação conferida pela Lei n.º 9.507/2021, estabelece que “[a] Taxa Judiciária incide sobre os serviços de atuação dos magistrados, e dos membros do Ministério Público, em qualquer procedimento judicial, e será devida, conforme o caso, por aqueles que recorrerem à Justiça Estadual, perante qualquer Juízo ou Tribunal, pelo interessado na prática do ato”. Do mesmo passo, em Espanha, o art. 1.º, da Ley 10/2012, de 20 de noviembre, dispõe que “[l]a tasa por el ejercicio de la potestad jurisdiccional en los órdenes civil, contencioso-administrativo y social tiene carácter estatal y será exigible por igual en todo el territorio nacional en los supuestos previstos en esta Ley […]”. Na Colombia, a taxa de justiça – ou arancel judicial – é definida no art. 2.º, da Ley 1653 de 2013, que “[…] es una contribución parafiscal destinada a sufragar gastos de inversión de la Administración de Justicia”. Daqui se torna fácil concluir que, embora seja reconhecida natureza tributária à taxa de justiça, tal consolidação já não se verifica na sua catalogação nas diferentes espécies tributárias, tomando aqui importância o imposto, a taxa e a contribuição[42]. Em Espanha, a maioria da doutrina propende no sentido de considerar a tasa judicial uma taxa, no entanto, há quem também entenda tratar-se de um imposto. Para Antonio Aparicio Pérez, não há dúvidas de que se trata de um imposto, desde logo, porque a criação da taxa de justiça, através da Ley 10/2012 não foi precedida de memória económico-financeira que exigia o art. 20.º, da Ley de Tasas y Precios Públicos, sob pena de nulidade da norma criadora[43]. Por outro lado, o autor também entende não ser possível determinar o alcance do benefício colhido pelo utilizador da justiça e, por outro lado, porque a taxa, para ser considerada como tal, deve ser de obrigatória, o que, segundo o autor, nem sempre se verifica[44]. Em sentido diverso, porém, Isabel Gíl Rodriguez entende que “[…] estamos ante un tributo con la naturaleza jurídica de tasa, de carácter estatal, que reúne los presupuestos legales establecidos en al art. 2 LGT y en el art. 6 LTPP, por cuanto estamos ante la prestación efectiva de un servicio público (el ejercicio de la potestad jurisdiccional en el orden jurisdiccional civil, contencioso-administrativo y social), que es competencia del Estado […], de carácter obligatorio (por la esencialidad del servicio público que se presta), susceptible de singularización en un destinatario concreto (el que promueve el ejercicio de la potestad jurisdiccional mediante la presentación de demandas y/o recursos, en los anteriores órdenes jurisdiccionales)[45]”. No mesmo sentido caminha Alfredo Ramos, para quem é óbvio que o legislador pretendeu enquadrar este tributo como uma taxa, apontando, desde logo, o nomen iuris. Porém, para este autor, o indício mais evidente é o que decorre de uma alteração na LTPP, levada a cabo pela Ley 53/2002, de 30 de deciembre, e que inseriu, no elenco do seu art. 13.º – que enuncia os serviços e atividades em regime de direito público que podem determinar a exigência de taxas – o segmento “el ejercicio de la potestad jurisdiccional en los órdenes civil, contencioso-administrativo y social[46]. A doutrina brasileira, e o Supremo Tribunal Federal, também têm considerado a sua taxa judiciária uma verdadeira taxa[47]. Ficamo-nos, por último, com um interessante apontamento. Na Colômbia, a taxa de justiça – denominada arancel judicial – parece ser concebida como uma contribuição parafiscal. Assim, “[e]l arancel se refiere a una tarifa oficial que se paga por unos derechos generados por procedimientos a la administración de justicia, en específico para el proceso judicial, los incidentes y los recursos. Se le ha denominado arancel en Colombia la contribución parafiscal que se paga por acceder a la justicia, para financiar la infraestructura y modernizar los estamentos pertenecientes a los órdenes judiciales[48]. Este posicionamento compreende-se face ao direito positivo. É que, como já haviamos referido, a Ley 1653 de 2013, que dispõe sobre a arancel judicial, começa por estabelecer, no seu art. 2.º, que “[e]l arancel judicial es una contribución parafiscal destinada a sufragar gastos de inversión de la Administración de Justicia”.

3.4. Breve referência ao princípio da equivalência enquanto concretização do princípio da igualdade

Pois bem, da consolidação, entre nós, ao nível doutrinal e jurisprudencial de que a taxa de justiça é uma genuína taxa, resulta uma consequência precípua: o apelo ao princípio da equivalência enquanto manifestação do princípio da igualdade em matéria tributária[49]. “O sentido essencial do princípio da equivalência está na exigência de que os tributos públicos se adequem ao custo que o sujeito passivo gera à administração ou ao benefício que a administração lhe proporciona”, nas palavras de Sérgio Vasques[50]. Na doutrina alemã, Klaus Tipke e Joachin Lang evidenciam que o princípio sistemático das taxas é o princípio da equivalência e que permite o cálculo do montante da taxa através da cobertura dos custos e da compensação da vantagem[51]. O princípio da equivalência pode, então, ser entendido como um critério de repartição, determinando que a custo ou benefício igual corresponda tributo igual e que, a custo ou benefício diferente, corresponda tributo diferente, ou como critério de quantificação, com influência sobre o quantum da prestação tributária que deve, assim, corresponder ao custo provocado ou ao benefício proporcionado[52]. Como se vê, a taxa, pela sua sinalagmaticidade, e enquanto tributo rigorosamente comutativo, é a espécie tributária que melhor permite concretizar o princípio da equivalência[53]. O princípio da equivalência e o princípio da capacidade contributiva são duas faces da mesma moeda, não existindo uma relação de hierarquia entre eles[54]. Em bom rigor, ambos são aptos a concretizar o princípio da igualdade em matéria tributária, tudo dependendo da estrutura do tributo em causa. Como, seguramente, já resulta do sobredito, anatomicamente, o princípio da equivalência pode decompor-se numa equivalência de custo ou numa equivalência de benefício[55]. Tratam-se de concretizações alternativas do mesmo princípio. Caberá, então, ao legislador definir, em concreto, o conteúdo do princípio da equivalência para cada tributo, podendo optar pelo critério do custo ou do benefício, isto é, adotando uma compensação direcionada para os custos que a prestação pública originou ou direcionada para o benefício proporcionado ao sujeito passivo. A concretização predominante do princípio da equivalência repousa, no entanto, no princípio da cobertura dos custos, daí que algumas construções dogmáticas se orientem apenas para a cobertura dos custos. Não está, porém, excluída a possibilidade de, num só tributo, se reunirem ambos os critérios, embora com as devidas cautelas, sob pena de conduzir a soluções incoerentes[56]. Esta adequação do montante deve, por sua vez, ser rigorosamente escrutinada pelos tribunais, em especial, pelo Tribunal Constitucional, numa vertente de controlo material, o que nem sempre se verifica entre nós[57].

§ O paradigma da capacidade contributiva do homem médio

Cabe, ainda, dar nota de que o Tribunal Constitucional tem preconizado o paradigma da capacidade contributiva do homem médio para afirmar que o montante da taxa de justiça (embora, como já dissemos acima, o tribunal se refira, por vezes, a custas) não pode ser manifestamente excessivo e desproporcionado[58]. É dizer, embora o Estado goze de liberdade na determinação do valor da taxa de justiça, não pode adotar soluções legais que, na prática, impeçam o cidadão médio de aceder à justiça, sob pena de contravenção ao n.º 1, do art. 20.º, da nossa norma normarum.  Uma cuidada análise desta questão implicaria, porém, que se chamasse à colação o problema da quantificação dos custos ou do benefício e, bem assim, o do controlo material do montante das taxas.

Num apontamento lateral, mas que nos parece interessante, a relevância do princípio da capacidade contributiva nas taxas assume outra expressão em Espanha[59]. Há autores que sustentam que o princípio da capacidade contributiva deve manter-se presente, não enquanto pressuposto, mas enquanto fundamento que determina que não devem ser exigidas taxas a quem demonstre não possuir essa força contributiva. A este propósito, e no contexto particular das tasas judiciales, César Martinez Sanchez fala no fenómeno da aristocratização do sistema judicial para se referir ao efeito que pode advir da imposição da taxa de justiça sem consideração pela capacidade contributiva dos sujeitos passivos, na medida em que a sua imposição nestes moldes desincentivaria o acesso dos que tem menor capacidade contributiva, ficando apenas acessível aos que possuem uma maior capacidade contributiva[60].

3.5. O pressuposto (breve referência ao facto tributário)

A classificação dos tributos públicos poderá fazer-se olhando, desde logo, para o seu pressuposto. Pela nossa parte, julgamos que o pressuposto da taxa de justiça é a prestação pública traduzida no serviço justiça, promovido por um sujeito processual – que é o efetivo causador ou beneficiário -, e que envolverá todo um rito processual ordenado, específico e adequado a cada caso concreto, isto é, a cada pretensão material. As duas prestações – o pagamento da taxa de justiça e a administração da justiça – surgem indissociáveis uma da outra. A obrigação tributária, traduzida no pagamento da taxa de justiça, pressupõe uma atividade ou serviço desenvolvido por um ente público, especialmente dirigido a quem é exigida a prestação. O pressuposto desta relação não se materializa, por exemplo, no consumo de bens ou na obtenção de rendimento, mas na prestação de uma atividade pública específica e divisível efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo[61]. Faz-se, assim, notar que o facto tributário, quanto a nós, corresponde ao impulso processual (que poderá ser desencadeado, por exemplo, pela apresentação de uma petição inicial ou de uma contestação), e não numa concreta manifestação de força contributiva que, com tal tributação, o legislador vise atingir. Em nossa opinião, não parece defensável uma tese que considere, por exemplo, apresentação de uma petição inicial ou de uma contestação o facto tributário da taxa de justiça. Podemos, portanto, dizer que é através desses atos que o sujeito processual desencadeia o impulso processual, que pede ou solicita a prestação do serviço justiça. Por outras palavras ainda, são os meios que o legislador tributário reconhece como virtuosos para desencadear a atividade jurisdicional.

Uma última palavra para dar nota de um aspeto temporal.

Por regra, a taxa de justiça deve ser paga aquando do impulso processual, o que significa que, normalmente, o seu pagamento mostra-se prévio ao serviço[62]. Neste contexto, haverá que perguntar sem existindo um desajuste temporal entre o cumprimento das prestações, na medida em que a prestação do serviço justiça, aquando do pagamento inicial, não se encontra concretizado, a sua natureza jurídica é influenciada. Ora, é certo que o serviço justiça não é concluído, prestado, de imediato – ou seja, concomitantemente com o pagamento da taxa -, contudo, não se olvide que um processo é um conjunto de atos ordenados em função de um determinado objetivo. Se preferimos outra terminologia, a prestação a cargo do ente público não é instantânea, mas duradoura (embora, em nosso ver, com respeito pelo direito de obtenção de uma decisão em prazo razoável[63]). A doutrina nacional tem entendido que a ausência de sincronismo entre as prestações não desvirtua a natureza jurídica de taxa[64]. No caso da taxa de justiça, esse assincronismo é uma particularidade que, sendo uma decorrência da própria função jurisdicional, não deverá influenciar a natureza jurídico-tributária da prestação em causa.

3.6. A finalidade

Igualmente essencial para a catalogação de um tributo é a sua finalidade. Se bem vimos, a finalidade da taxa de justiça é a compensação do Estado pela prestação de um serviço público individualizado ou, nas palavras de Sérgio Vasques, a sua função “[…] é a de fazer repercutir sobre os utilizadores do sistema judicial os custos do seu funcionamento, uma função confirmada pelas regras de consignação fixadas no Código das Custas Judicias […]”[65]. Assim, com a taxa de justiça, parece pretender-se compensar ou financiar o serviço justiça, enquanto prestação pública, que efetivamente, foi provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo. A sua finalidade, porém, será sempre recaudatória, no entanto, orientada para fazer face a uma despesa pública determinada[66], por oposição ao que sucede com os impostos, em que, existindo uma contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais[67], se destina à nutrição de despesas públicas genéricas. Por outro lado, a taxa de justiça pode, abstratamente, prosseguir finalidades extratributárias ou de ordenação, como a prevenção, dissuasão, racionalização do acesso à justiça ou reorientação do comportamento dos que se encontram na iminência de recorrer aos tribunais, seja no sentido de procurarem outros meios de resolução dos dissensos, como no de ponderarem sobre a bondade da sua pretensão. A prossecução de finalidades extratributárias, pela sua significativa importância, justifica uma abordagem autónoma.  Não o faremos neste artigo, desde logo, porque a sua análise, que se pretende rigorosa, implicaria chamarmos à colação uma outra questão a que já nos havíamos referido – a quantificação dos custos ou do benefício. De facto, para que a extratributação se manifeste com autonomia nos tributos comutativos, é necessário que se fixe o seu montante acima do custo ou do benefício (dependendo da forma como o legislador optou por concretizar o princípio da equivalência).  Dito de outro modo, para que se possa falar com autonomia em finalidades extratributárias não basta que a orientação ou modelação de comportamentos seja um efeito meramente decorrente da arrecadação de receita pública. É, pois, necessário que constitua o seu fim principal, sem, porém, deixar de perseguir um objetivo de angariação de receita pública, sob pena de ser tornar numa “taxa de estrangulamento”[68].

§ A consignação da receita

Por fim, poderá adiantar-se um terceiro critério que, embora não seja determinante, será seguramente auxiliador nesta catalogação – falamos, pois, da consignação da receita do tributo[69]. A receita obtida com a cobrança da taxa de justiça reverte, maioritariamente, a favor do IGFEJ[70].  O art. 34.º, da Portaria n.º 419-A/2009, determina que o IGFEJ é o organismo responsável pela gestão e pelo controlo das receitas e das despesas previstas no RCP. De facto, nos termos das als. a) e f), do n.º 2, do art. 9.º, do Decreto-Lei n.º 164/2012, de 31 de julho, que aprova a lei orgânica deste instituto, constituem receitas próprias do IGFEJ as atribuídas nos termos da lei, no âmbito do sistema judicial, registral e notarial, bem assim como o produto de taxas e outros valores de natureza pecuniária que lhe sejam consignados. Tal encontra-se em consonância com a al. a), do n.º 1, do art. 36.º, do RCP, que estabelece serem receitas do IGFEJ a taxa de justiça. No entanto, faz-se notar que uma parte do produto obtido com a sua cobrança – concretamente, as cobradas no âmbito de processos cíveis –, também constitui receita do Conselho Geral da Ordem dos Advogados e do Conselho Geral da Ordem dos Solicitadores, conforme preveem os n.os 1 e 2, do art. 39.º, da Portaria n.º 419-A/2009. As regras de consignação que acabamos de ver permitem, em nosso ver, sustentar que o produto da receita obtida com a taxa de justiça se destina ao financiamento da prestação pública (o serviço justiça) que efetivamente é provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, não sendo desviada para o financiamento das despesas públicas gerais. Pelo contrário, em Espanha, por exemplo, a receita obtida através da cobrança da tasa judicial reverte a favor do orçamento geral, não revertendo diretamente para a Administração da Justiça. Esta circunstância, só por si, pode, de facto, legitimar a discussão em torno da sua natureza jurídica, uma vez que, sendo assim, o produto da sua cobrança mesclar-se-á totalmente com o dos demais tributos, mormente, dos impostos. Sendo assim, desconhece-se como essa receita será canalizada, designadamente, se para a compensação do serviço justiça, ou se, genericamente, para as demais despesas do Estado. Mas mais. Se esta receita integra o orçamento geral, isso significa que os demais cidadãos tributários também acabam por contribuir para o financiamento da justiça. Tal parece não suceder entre nós, como acabamos de ver.

3.7. Uma tentativa de resposta (a nossa perspetiva)

Os desenvolvimentos anteditos permitem antever que, quanto a nós, a chave para a análise da natureza tributária da taxa de justiça reside no seu pressuposto e finalidade. O que serve de pressuposto à taxa de justiça é a prestação individualizada de um serviço ou atividade públicas, ou seja, o serviço justiça. A finalidade, por sua vez, reside na compensação dessa mesma prestação, podendo dirigir-se a uma compensação dos custos ou do benefício. Cremos, assim, ser possível afirmar estarmos perante um função retributiva ou compensatória, assente num princípio de responsabilidade ou causa e efeito, embora sem nunca perder a sua finalidade recolectora transversal a todos os tributos. Não negamos que, em abstrato, a taxa de justiça possa prosseguir finalidades extratributárias desde que, ainda que a título secundário, esteja presente a finalidade compensatória. Na defluência do exposto, considerando a sua estrutura interna, e a consignação da receita, a nossa perspetiva também vai no sentido de considerar a taxa de justiça uma genuína taxa, subordinada ao respetivo enquadramento constitucional.

   § Especial referência à sua natureza legal

Não obstante o que dissemos acima, em especial, quanto à delimitação conceptual da taxa de justiça, afigura-se-nos importante sublinhar que a taxa de justiça é coativa, ou duplamente coativa, pois nasce e se conforma com base na lei, estando, com efeito, subtraída ao princípio da autonomia da vontade, e o seu incumprimento, dentro dos prazos e condições legalmente instituídos, abre via à instauração de um processo de execução fiscal para a sua cobrança coerciva[71]. A afirmação justifica, assim, uma breve suspensão reflexiva sobre a natureza legal da taxa de justiça. É que, embora o seu facto tributário seja de realização voluntária, isso não confere substrato consensual à obrigação de pagamento. É dizer, uma taxa (in abstrato, portanto) pode ter origem numa solicitação espontânea do sujeito passivo, ou ser imposta por lei, contudo, em ambas as hipóteses, conserva-se a sua natureza legal[72].  O que sucede – e este é um aspeto que gostaríamos de sublinhar – é que os particulares ao dirigirem-se à Administração com um pedido “[…] revelam conhecer o elemento sinalagmático da prestação, situando-se, de forma mais ou menos espontânea no plano de incidência da taxa”[73]. Existe, portanto, uma certa liberdade, maior do que nos impostos, do particular em se constituir na situação que dá origem à obrigação tributária, o que, no entanto, não confere um carácter consensual à relação jurídica. Convocando as palavras de José de Campos Amorim e Patrícia Anjos Azevedo, “[r]egra geral, a taxa é devida sempre que o contribuinte queira adquirir um determinado serviço, o qual não implica um qualquer acordo de vontades entre a Administração e o contribuinte, uma vez que resulta da concretização de um pressuposto legal” [74]. Pelo contrário, esta solicitação parece mesmo ser condição lógica para a aplicação do princípio da equivalência[75]. A taxa de justiça é um tributo que nasce e se conforma exclusivamente com base na lei[76]. Desde que se verifique o facto sociológico, previsto na lei (em sentido material), temos um facto tributário, logo, a obrigação de pagamento desse tributo. Esta mecânica, de resto, é a que se verifica nos impostos, como bem observa Sérgio Vasques, ao sustentar que “[…] a concretização do pressuposto legal pode ser voluntária, mas, uma vez que este se concretize, gera-se inelutavelmente a obrigação tributária, sendo a vontade do contribuinte irrelevante à sua validade e conteúdo”[77].

Síntese conclusiva

No presente artigo, concluímos, antes de mais, a inafastável natureza tributária da taxa de justiça. Depois, procuramos deixar clara a distinção e a separação entre a taxa de justiça e as custas processuais. Desmitificamos, também, dois inequívocos: em primeiro lugar, que inexistem motivos – em especial, de ordem tributária – que devam conduzir a uma diferenciação entre a taxa de justiça impulsória paga pelo sujeito processual ativo da que é paga pelo que ocupa o lugar passivo desta relação; em segundo lugar, que não se pode falar em “taxa de justiça” exigida aos litigantes vencidos por as custas de parte integrarem uma relação creditícia estabelecida unicamente entre os litigantes. Concluímos, sob um ponto de vista conceitual, que a taxa de justiça pode ser desenhada como uma prestação pecuniária, tendencialmente definitiva, coativa e exigida por um ente público, com vista à compensação (ou retribuição) de um serviço individualizado de administração da justiça, efetivamente provocado ou aproveitado pelo sujeito passivo, e sem finalidades sancionatórias. Com esta clarificação, constatamos, então, que, no seu código genético, a taxa de justiça é uma verdadeira taxa, e corresponde à contraprestação pecuniária, devida ao Estado, e exigida aos utilizadores da justiça com a verificação do impulso processual. O pressuposto da taxa de justiça é uma concreta prestação pública traduzida, mais especificamente, na atividade jurisdicional. A sua finalidade é a compensação do Estado pela prestação individualizada desse serviço público. Os sujeitos passivos da taxa de justiça são, assim, os impulsionadores do serviço. É, com efeito, possível destacar um vínculo sinalagmático entre o pagamento da taxa de justiça e a prestação de uma atividade pública a quem, efetivamente, provocou ou beneficiou da mesma. Por outras palavras, verifica-se uma equivalência jurídica suficientemente robusta para que, em termos estruturais, de acordo com a doutrina e jurisprudência nacional, estejamos perante uma taxa, com todas as consequências que tal implica, mormente, ao nível do seu regime constitucional.

Como dissemos no começo deste artigo, a identificação da natureza jurídico-tributária da taxa de justiça suscita, ainda no plano tributário, questões delicadas. Por exemplo, será de conceder o valor da causa como essencialmente[78] a base tributável da taxa de justiça?[79] Tratar-se-á de um critério apto a traduzir o custo ou o benefício da prestação pública ou simplesmente alheio a tais? Deverá o Tribunal Constitucional proceder a um controlo material do montante da taxa de justiça mais rigoroso? Todas estas questões, como se vê, convergem num importantíssimo marco geodésico – a proteção dos sujeitos passivos, tarefa, para a qual, os tribunais (também eles atores no palco do Direito tributário) e, em especial, o Tribunal Constitucional, deverão estar mais atentos e sensibilizados. São, porém, pressupostos para outra reflexão.

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[1] No sentido de que a taxa de justiça é um tributo, e sem prejuízo dos subsídios doutrinários que mencionaremos adiante, por exemplo, AZEVEDO, Tiago Lopes de, “Lições de Direito das Contraordenações”, Coimbra, Almedina, 2020, p. 297.

[2] Neste particular, Joaquim Freitas da Rocha elucida que a despesa pública deve ser orientada para um específico fim – o da prossecução do interesse público. Cf. ROCHA, Joaquim Freitas da, “Direito da Despesa Pública”, Coimbra, Almedina, 2019, pp. 138-141. Igualmente, alerta Pedro Soares Martinez que “[…] o emprego dos dinheiros públicos há-de ser sempre condicionado por exigências do maior rigor, em ordem a evitar que as tentações humanas se sobreponham à realização do bem comum”. Cf. MARTINEZ, Pedro Soares, “A essência do fenómeno financeiro” in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, Número 2, Verão, 2008, p. 17. Nas contribuições doutrinárias externas, Marcus Abraham sustenta que o Estado moderno existe para atender às necessidades públicas, compreendendo as necessidades individuais, as necessidades coletivas e, ainda, as necessidades transindividuais (aqui se incluindo, por exemplo, a defesa nacional). O autor integra a administração da justiça nas necessidades coletivas. Cf. ABRANHAM, Marcus, “Curso de Direito Tributário Brasileiro”, Rio de Janeiro, Forense, 2022, p. 5.

[3] A atividade financeira do Estado está, evidentemente, aqui simplificada de modo grosseiro. Para maiores e cuidados desenvolvimentos, veja-se, entre outros, NABAIS, Casalta, “Direito Fiscal”, 11.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2019, pp. 27-30, AMORIM, José de Campos, AZEVEDO, Patrícia Anjos, “Lições de Direito Fiscal”, Porto, Primeira Edição, 2020, pp. 12-17, GIULIANI FONROUGE, Carlos M., “Derecho Financero – Vol. I”, 9.ª Edição, Buenos Aires, La Ley, 2004, pp. 3-4.

[4] Cf. XAVIER, Alberto, “Manual de Direito Fiscal”, Volume I, Lisboa, 1974, p. 35.

[5] Cf. SANCHES, J. L. Saldanha, “Manual de Direito Fiscal”, 3.ª Edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 22. Para outras noções jurídicas, embora convergentes, vide, por exemplo, ROCHA, Joaquim Freitas da, SILVA, Hugo Flores da, “Teoria Geral da Relação Jurídica Tributária”, Coimbra, Almedina, 2019 p. 40 e ss..

[6] Uma vez que estamos a falar de tributos, afigura-se-nos, salvo melhor opinião, mais correta a utilização das expressões “finalidades extratributárias” ou “extra-redíticias”, ao invés de “finalidades extrafiscais”.

[7] No sentido de que o conceito de tributo deve ter em consideração as finalidades sociais, vide, TIPKE, Klaus, LANG, Joachim, “Steuerrecht”, 18.ª Edição, 2005, tradução portuguesa de Luiz Dória Furquim, “Direito Tributário – Vol. I”, Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, pp. 134-136. De igual modo, Marcus Abraham também sustenta que a atividade financeira do Estado, além da função fiscal, também possui uma função extrafiscal ou regulatória. Cf. ABRANHAM, Marcus, “Curso de…”, op. cit., p. 6.

[8] Questão diferente, parece-nos, é se essa orientação ou regulação surge como um mero efeito colateral da arrecadação de receita e, portanto, sem se emancipar ou autonomizar da finalidade recaudatória. Para maiores desenvolvimentos sobre a autonomização das finalidades extratributárias, VASQUES, Sérgio, “O Princípio da Equivalência como Critério de Igualdade Tributária”, Coimbra, Almedina, 2008, pp. 577-595, em especial, pp. 584-586.

[9] O economista inglês, procurando uma forma de lidar com as exterioridades negativas que começaram a surgir com a revolução industrial, ensaiou um modelo – o modelo pigouviano – na sua obra The Economis of Welfare, de 1920, segundo o qual o Estado deveria procurar igualar o custo privado e o custo social (ou o benefício privado e o benefício social), concluindo que os tributos seriam um instrumento a considerar. Esta conceptualização, evidentemente, não esteve isenta de críticas. Para maiores desenvolvimentos, FLEISCHER, Victor, “Curb your Enthusiasm for Pigouvian Taxes”, in Vanderbilt Law Review, Vol. 68:6:1673, 2015, pp. 1682-1687. O autor acaba por concluir que, de uma forma geral, os tributos pigouvianos devem evitar-se. O seu campo preferencial e útil de atuação circunscreve-se ao ambiente e a situações de congestionamento. Com pertinência sobre a tributação corretiva, vide VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., pp. 307-321.

[10] O que corresponde à divisão tripartida de tributo ínsita no n.º 2, do art. 3.º, da Lei Geral Tributária (adiante designada por LGT), aprovada pelo Decreto – Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, com a última redação conferida pela Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro.

[11] Doravante designado por RCP.

[12] É curioso assinalar que Fernando Luso Soares distingue, ainda, entre custas judicias e gastos judicias. Para o autor, estes são “[…] os gastos relativos ao funcionamento da justiça, o qual exige a intervenção de vários actuantes (o juiz e os funcionários) e a concorrência de meios materiais (móveis e imóveis). Estes gastos genéricos não são na verdade assimiláveis às custas, pelo menos, diretamente, apesar de estarem, sem dúvida, afectos ao processo. Eles constituem despesas suportadas pelo Estado, que as cobre a sufraga através de verbas orçamentais de erário público…”. Cf. SOARES, Fernando Luso, “A responsabilidade Processual Civil”, Coimbra, Almedina, 1987, pp. 29-30.

[13] Num apontamento lateral, dir-se-á que, além das custas processuais, existem, evidentemente, outros custos associados a um processo. São exemplo disso os honorários devidos ao mandatário judicial.

[14] Por exemplo, SILVA, Paula Costa e, “A Litigância de Má Fé”, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, p. 282. A autora utiliza o termo custas quando, em nosso ver, parece pretender referir-se apenas à taxa de justiça. Também na jurisprudência, é possível arrolar alguns arestos, incluindo do próprio Tribunal Constitucional, em que os tribunais não conseguem fugir a esta tendência de confundir a taxa de justiça com as custas processuais. Assim, por exemplo, Ac. do TC n.º 301/2009, proferido no processo n.º 75/09, em 22 de junho de 2009, disponível em www.tribunalconstitucional.pt, e Ac. do TRP, proferido no processo n.º 1962/09.8TVPRT.P2, em 04 de maio de 2017, disponível em www.dgsi.pt. De referir que também o próprio legislador, por vezes, emprega indistintamente estes conceitos. Na exposição de motivos da Proposta de Lei 149/XIII/4.ª, que esteve na base da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, é referido que “[a]s custas processuais, com especial relevância para a taxa de justiça, representam o valor imputado às partes ou sujeitos processuais decorrente da mobilização dos meios judiciários necessários e aptos à prestação do serviço público de administração de justiça. Constituem-se assim como uma exigência tributária, de génese sinalagmática […]”.

[15] Cf. n.º 4, do art. 529.º, do CPC, e al. a), do n.º 3, do art. 26.º, do RCP.

[16] Por exemplo, PEREIRA, Manuel Henriques de Freitas, “Fiscalidade”, 6.ª Edição (Reimp. 2020), Coimbra, Almedina, 2018, p. 25. Segundo o mesmo, existem taxas – o autor atribui à taxa de justiça à natureza de taxa, portanto – em que o particular não obtém qualquer benefício, não sendo sequer ele que solicita a atividade pública que concretiza a contraprestação. “Veja-se, por exemplo, o caso das taxas judiciais pagas pelo condenado em tribunal.” Trata-se, porém, de uma análise para outra altura.

[17] Por este motivo, e sempre com o devido respeito, afigura-se-nos pouco rigorosa a afirmação de que “[…] há taxas que são independentes de solicitação, como é o caso das taxas judiciais exigidas aos réus, que não solicitaram os serviços prestados pelos tribunais, cujas ações foram intentadas pelos autores, mas que devem pagar essas taxas”. Cf. AMORIM, José da Campos, Azevedo, Patrícia Anjos, “Lições de…”, op. cit., p. 31. A citação do réu para a ação prende-se com o princípio do contraditório, proporcionando-lhe a hipótese – pois não é um ónus – de se defender da pretensão contra si formulada. Uma vez citado para a ação, o réu pode, ou não, contestar. Se assumir uma posição totalmente inerte, não intervindo de qualquer forma no processo (colocando-se num estado de revelia absoluta), não está sujeito ao pagamento da taxa justiça (questão diferente é a condenação em custas). Com efeito, o réu apenas pagará a taxa de justiça se, por exemplo, apresentar a sua contestação ou deduzir um incidente de intervenção principal provocada, ou seja, quando, e se quiser, impulsionar a atividade jurisdicional. Como bem observa António Santos Abrantes Geraldes, “[d]e facto, tendo em conta o princípio da igualdade consagrado no nosso sistema jurídico-processual, não é a parte que solicita a intervenção jurisdicional a única a suportar o ónus de pagamento gradual da taxa de justiça, mas também aquela que, uma vez demandada, pretende defender-se da pretensão contra si deduzida, ainda que lhe pareça injusta […]. Cf. GERALDES, António Santos Abrantes, “Temas Judiciários – Volume I”, Coimbra, Almedina, 1998, p. 203.

[18] Aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de julho, com a última redação conferida pela Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto (doravante designado por CPC).

[19] Cf. COSTA, Salvador da, “Regulamento das Custas Processuais”, 2.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2008. Numa outra compreensão, embora em sintonia com a que acabamos de ver, Salvador da Costa sustentava que a taxa de justiça era “[…] a contrapartida tendencial do concreto funcionamento do sistema judiciário”. Esta afirmação já não a encontramos na edição mais recente da sua obra “As Custas Processuais – Análise e Comentário”, contudo, parece-nos, sem prejuízo de superior opinião, que a ideia se mantem na sua generalidade e que o autor não terá alterado a sua posição. Cf. COSTA, Salvador da, “As Custas Processuais – Análise e Comentário”, 7.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2018, p. 135. 

[20] Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., pp. 598-599.

[21] Cf. CARREIRA, José António Coelho, “Regulamento das Custas Processuais – Anotado”, 2.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2018, p. 129. Itálico mantido conforme original.

[22] Cf. GERALDES, António Santos Abrantes, “Temas Judiciários – Volume I”, Coimbra, Almedina, 1998, p. 290.

[23] Cf. LEITÃO, Hélder Martins, “Das custas, multa e indemnização”, 2.ª Edição, Porto, Almeida & Leitão, Lda.,1997, p. 29.

[24] As regras relativas ao pagamento da taxa de justiça encontramo-las na Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril. Veja-se que o legislador nem sequer consagra a possibilidade de pagamento (voluntário) através de dação em pagamento (vide n.º 2, do art. 40.º, da LGT).

[25] Dizemos em princípio, por existirem situações em que o legislador prevê o direito ao reembolso da taxa de justiça. Tratam-se das hipóteses de erro na inserção do valor a pagamento constante do Documento Único de Cobrança (DUC) ou de este, embora emitido, não tenha sido utilizado, ou seja, apresentado a juízo, situações estas tipificadas nos art.os 23.º e 23.º-A, da Portaria n.º 419-A/2009, em conjugação com o n.º 8, do art. 14.º, do RCP Neste último caso, o interessado tem seis meses, a contar da data da emissão do DUC, para requerer a devolução da quantia, sob pena de reverter para o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos de Justiça, I.P (adiante designado por IGFEJ). Tratando-se do pagamento de taxa de justiça, poderá levantar-se a questão de saber a que título é que esse montante passa a integrar o erário público, uma vez que não encontra o seu pressuposto ou fundamento na prestação individualizada de um serviço público, questionando-se ainda a sua finalidade. Será, no entanto, reflexão para outro momento. Quanto ao DUC, é o mesmo regulado pela Portaria n.º 1423-I/2003, de 31 de dezembro.

[26] Vale a pena salientar que, nos termos do n.º 1, do art. 189.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (adiante CPTA), aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro, com a última redação conferida pela Lei n.º 56/2021, de 16 de agosto, o Estado e as demais entidades públicas estão sujeitos ao pagamento de custas e, portanto, da taxa de justiça, sem prejuízo da dispensa do prévio pagamento quando demandem ou sejam demandados nos tribunais administrativos ou tributários, salvo tratando-se de matéria administrativa contratual e pré-contratual e relativas às relações laborais com os funcionários, agentes e trabalhadores do Estado, prevista na al. a), do n.º 1, do art. 15.º, do RCP.

[27] É no art. 4.º, do RCP, que encontramos o rol de isenções (subjetivas e objetivas) de custas, logo, incluindo a taxa de justiça. Quanto à proteção jurídica na referida modalidade, vem a mesma prevista na al. a), do n.º 1, do art. 16.º, da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com a última redação dada pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[28] Pela nossa parte, o enigma do sujeito ativo da relação jurídica tributária de taxa de justiça residirá entre o IGFEJ e o Estado, enquanto Estado prestador.

[29] Nos desenvolvimentos subsequentes não se equacionará a hipótese de a taxa de justiça poder tratar-se de uma contribuição por a mesma estar, em nosso ver, afastada. De facto, considerando que no delineamento conceitual da taxa de justiça, e na esteira da doutrina mais autorizada, dissemos que a mesma se dirige a um sujeito passivo, singularmente considerado, que é efetivamente o causador ou o beneficiário da prestação pública, torna-se evidente que não estamos perante prestações presumivelmente provocadas ou aproveitadas e, nessa medida, pela nossa parte, justificado o afastamento dessa hipótese. A taxa de justiça agravada, a pagar pelos grandes litigantes, nos termos dos n.os 3, 4, 5 e 6, do art. 13.º, do RCP, é que poderá conduzir a uma discussão onde se inclua o tema das contribuições. Tal reflexão, porém, terá de ficar para outro momento.

[30] Sobre esta matéria, entre outros, GERALDES, António Santos Abrantes, “Temas Judiciários…”, op. cit., p. 171. O autor italiano Francesco Carnelutti também era critico desta forma de tributação que chegou a vigorar em Itália, desde logo, porque não permitia prever o custo de um processo. Cf. CARNELUTTI, Francesco, “Finanza e Processo”, in Rivista di Diritto Finanziario e Scienza delle Finanze, Vol. I – Parte I, 1937, p. 246. A obra, apesar de não ser recente, oferece algumas perspetivas interessantes nesta matéria.

[31] O imposto de justiça criminal, à data, já existia, por força do Decreto de 18 de novembro de 1910.

[32] Não obstante, é de assinalar que o legislador, no preâmbulo, acabou por utilizar quase que indistintamente ambos os termos. Por exemplo, é dito que “[…] este decreto-lei procede tão-só a uma modestíssima actualização do imposto de justiça”, porém, mais adiante, refere-se que “[…] bastar-lhe-á submeter a causa ao à forma de processo simplificado […] para que, no mesmo passo, a causa seja resolvida expeditamente e com uma taxa de justiça igual a metade da normal […]”. De todo o modo, esta confusão, ainda que evidenciando alguma falta de rigor técnico-jurídico, não tem a virtualidade de alterar ou determinar a qualificação jurídica do tributo em causa.

[33] Cf. COSTA, Salvador da “Regulamento das…”, op. cit., p. 15.

[34] Cf. GERALDES, António Santos Abrantes, “Temas Judiciários…”, op. cit., p. 170.

[35] Cf. SANCHES, J. L. Saldanha, “Manual de…”, op. cit., p. 31.

[36] Cf. MARTINEZ, Pedro Soares, “Direito Fiscal”, op. cit., p. 35.

[37] Cf. TEIXEIRA, António Braz, “Princípios de Direito Fiscal – Vol. I”, 3.ª Edição, Coimbra, Almedina, 1990, p. 45. Itálico mantido conforme original.

[38] Cf. NABAIS, Casalta, “Direito Fiscal”, op. cit., p. 36.

[39] Cf. XAVIER, Alberto, “Manual de…”, op. cit., pp. 49-50. No sentido de também considerar a taxa de justiça uma taxa, veja-se MACHADO, Jónatas E. M., COSTA, Paulo Nogueira, “Curso de Direito Tributário – perspetiva multinível”, 3.ª Edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2019, p. 19.

[40] Cf. Ac. do TC n.º 248/94, proferido no processo n.º 240/89, em 22 de março de 1994, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

[41] Cf. Ac. do TC n.º 844/2014, proferido no processo n.º 275/13, em 03 de dezembro de 2014, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. Itálico mantido conforme original. Mais recentemente, por exemplo, Ac. n.º 391/2020, proferido no processo n.º 955/2018, em 13 de julho de 2020, ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.

[42] No Brasil, sustenta-se a autonomia de uma quarta espécie tributária – os empréstimos compulsórios, previstos no art. 148.º, da Constituição Federal. Para maiores desenvolvimentos, ABRAHAM, Marcus, “Direito Tributário…”, op. cit., pp. 423-429.

[43] Em Espanha, o regime das taxas judiciais, pelo exercício do poder jurisdicional em matéria civil, contencioso-administrativo e social, é regulado pela Ley 10/2012, de 20 de noviembre. A Ley de Tasas y Precios Públicos foi aprovada pela Ley 8/1989, de 13 de abril, com a última redação conferida pela Ley 9/2017, de 8 de noviembre (adiante designada pela sigla LTPP). O n.º 1, do seu art. 20.º, establece que “[t]oda propuesta de establecimiento de una nueva tasa o de modificación específica de las cuantías de una preexistente deberá incluir, entre los antecedentes y estudios previos para su elaboración, una memoria económico-financiera sobre el coste o valor del recurso o actividad de que se trate y sobre la justificación de la cuantía de la tasa propuesta. La falta de este requisito determinará la nulidad de pleno derecho de las disposiciones reglamentarias que determinen las cuantías de las tasas”.

[44] Cf. APARICIO PÉREZ, Antonio, “El impuesto sobre la administración de justicia – Estudio histórico y actual. Análisis crítico”, Pamplona, Editorial Aranzadi, 2017, p. 80.

[45] Cf. GIL RODRÍGUEZ, Isabel, “Las tasas judiciales”, Valencia, Tirant Lo Branch, 2019, pp. 57-58.

[46] Cf. RAMOS, Alfredo, “Las Tasas Judiciales desde una Perspectiva Tributaria”, Valencia, Tirant lo Blanch, 2011, pp. 34-35.

[47] No sentido de que a taxa judiciária é uma taxa, enquadrada nas taxas de serviço, por exemplo, MARCUS, Abraham, “Curso de…”, op. cit., p. 411. Quanto à jurisprudência, vide, por exemplo, Representação n.º 1.077, do Estado do Rio de Janeiro, proferida em 28-03-1983, e Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.826, do Estado de Góias, proferida em 12-05-2010, ambos disponíveis em https://portal.stf.jus.br/.

[48] Cf. RUEDA FONSECA, María del Socorro, “El arancel o tasa judicialin LOZANO RODRÍGUEZ, Eleonora (coord.), Teoría y puesta en prática del análisis económico del derecho colombiano, Bogotá, Universidad de los Andes, 2016, p. 199.

[49] Não encontramos referência expressa ao princípio da equivalência na nossa Lei Fundamental, mas é, inelutavelmente, corolário do princípio da igualdade e do princípio da proporcionalidade. No plano infraconstitucional, o n.º 1, do art. 4.º, do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro, com a última redação conferida pela Lei n.º 117/2009, de 29 de dezembro, sob a epígrafe “Princípio da equivalência jurídica”, dispõe que “[o] valor das taxas das autarquias locais é fixado de acordo com o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da actividade pública local ou o benefício auferido pelo particular”. Porém, como certeiramente assinala J. L. Saldanha Sanches, “[…] o legislador reconduz a equivalência (a que chama «jurídica») à proporcionalidade”. Cf. SANCHES, J. L. Saldanha, “Manual de…”, op. cit., p. 40. Esta crítica também é efetuada por Sérvio Vasques, sustentado que “[…] possuindo embora a epígrafe de princípio da equivalência jurídica, consagra no seu n.º 1 um genuíno princípio de equivalência económica […]”. Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., p. 349-350. Itálico mantido conforme original.

[50] Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., p. 338.

[51] Cf. TIPKE, Klaus, LANG, Joachim, “Steuerrecht”, op. cit., p. 139.

[52] Assim, enquanto critério de repartição, surge como uma manifestação do princípio da igualdade, com guarida constitucional no art. 13.º, da Lei Fundamental, e, enquanto critério de quantificação, como uma manifestação do princípio da proporcionalidade, ínsito no n.º 2, do seu art. 266.º.

[53] Neste contexto, o Tribunal Constitucional assinala que “[n]o tocante aos tributos unilaterais, o critério que se afigura constitucionalmente mais adequado é o da capacidade contributiva, pois, tratando-se de exigir que os membros de uma comunidade custeiem os respetivos encargos, a solução justa é que sejam pagos na medida da força económica de cada um; já quanto aos tributos comutativos e paracomutativos, o critério distintivo da repartição é o da equivalência, pois, tratando de remunerar uma prestação administrativa, a solução justa é que seja paga na medida dos benefícios que cada um recebe ou dos encargos que lhe imputa”. Assim, “[…] o critério da capacidade contributiva já não se mostra materialmente adequado à repartição dos tributos comutativos – taxas e contribuições –, porque a sua natureza exige que a repartição se faça em função do custo provocado pelo contribuinte ou em função do benefício de que ele se aproveita. Com efeito, a bilateralidade ou sinalagmaticidade característica desse tipo de tributos apela a uma relação de equivalência entre o tributo e o custo provocado ou o benefício gozado: a custo ou benefício igual deve corresponder tributo igual e a custo ou benefício diferente deve corresponder tributo diferente”. Cf. Ac. do TC n.º 344/2019, proferido no processo n.º 673/2017, em 04 de junho de 2019, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

[54] Para César Martínez Sánchez, porém, o princípio da equivalência e o princípio da capacidade contributiva não são completamente antagónicos. Assim, “[e]l principio de equivalencia y el de capacidad económica no han de ser necesariamente contradictorios, sino que, por ele contrario, en determinados casos pueden coexistir de forma armónica”. Cf. SÁNCHEZ MARTINEZ, “Principio de Equivalencia en el Sistema Tributario Español”, Madrid, Marcial Pons, 2015, p. 134. No sentido de que o princípio da equivalência é a alternativa ao princípio da capacidade contributiva, e que é o princípio mais velho, TIPKE, Klaus, LANG, Joachim, “Steuerrecht”, op. cit., p. 204.

[55] Podemos, ainda, falar em critério da cobertura dos custos e critério da equivalência ou do ganho privado, embora, em nosso ver, se trate apenas de uma questão de base terminológica. Neste sentido, TEIXEIRA, Glória, NOGUEIRA, João Félix, “Breve anotação sobre o conceito de taxa”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, Ano II, 2005, pp. 169-170. Quanto ao princípio da cobertura dos custos, vide, entre outros, DOURADO, Ana Paula, “Direito Fiscal”, 3.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2018, p. 67. J. L. Saldanha Sanches, por sua vez, refere-se ao princípio do benefício ou da equivalência, sustentando ser este o princípio ordenador e legitimador das taxas e contribuições. Segundo o autor, “[…] a doutrina tem-se divido entre a determinação do seu quantum a partir do princípio do benefício – verificar que vantagens um certo serviço proporciona a um certo particular – e o princípio da cobertura do custo”. Cf. SANCHES, J. L. Saldanha, “Direito Fiscal”, op. cit., p. 17.

[56] Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit, p. 406 e ss.. Glória Teixeira e João Félix Nogueira também parecem admitir a aplicação conjunta de ambos os critérios. Cf. Teixeira, Glória, NOGUEIRA, João Félix, “Breve anotação…”, op. cit., p. 169.

[57] O problema do controlo material do montante das taxas, e bem assim, da taxa de justiça, é tema para outro momento.

[58] Por exemplo, Ac. do TC n.º 266/2006, proferido no processo n.º 421/2006, em 11 de julho de 2006, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

[59] O que pode, desde logo, ser explicado pelo n.º 1, do art. 31.º, da Constituição espanhola, que determina que “[t]odos contribuirán al sostenimiento de los gastos públicos de acuerdo con su capacidad económica […]”.

[60] Para maiores desenvolvimentos, MARTÍNEZ SÁNCHEZ, César, “Una aproximación crítica a las tasas judiciales desde el derecho financiero y tributario”, in Revista Jurídica de la Universidad Autónoma de Madrid, n.º 27, 2013, pp. 218-220.

[61] Como enfatiza Isabel Gil Rodriguez, sem embargo do que dissemos há pouco, “[e]l hecho imponible de esta tasa ni recoge, ni tiene por qué recoger una manifestación de capacidad económica”. Cf. GIL RODRÍGUEZ, Isabel, “Las tasas…”, op. cit., p. 115.

[62] Cf. n.º 1, do art. 6.º, do RCP, n.º 7, do art. 552.º, e art. 570.º, ambos do CPC. Existem, contudo, situações de dispensa de prévio pagamento da taxa de justiça, elencadas no art. 15.º, do RCP. Na prática, isto significa que com a notificação da decisão final, e independentemente de condenação a final – pois trata-se aqui do impulso processual, e não do decaimento na causa – os sujeitos processuais são notificados para proceder ao pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias.

[63] O n.º 4, do art. 20.º, da nossa norma normarum, dispõe que todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável. Nas normas infraconstitucionais, encontramos o n.º 1, do art. 2.º, do CPC, que também estabelece que a proteção jurídica através dos tribunais implica o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar, e bem assim o n.º 1, do art. 2.º, do CPTA.

[64] Neste sentido, RODRIGUES, Benjamim Silva, “Para uma reforma do sistema financeiro e fiscal do urbanismo em Portugal”, in CORREIA, Fernando Alves (coord.), 1.º Colóquio Internacional – O Sistema Financeiro e Fiscal do Urbanismo – Ciclo de Colóquios – O Direito do Urbanismo do Séc. XII, Coimbra, Almedina, 2002, p. 184 e, ainda, LOBO, Carlos Baptista, “Reflexões sobre a (necessária) equivalência económica das taxas”, in  Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Estudos jurídicos e económicos em homenagem ao Prof. Doutor António de Sousa Franco – Volume I, Coimbra, Coimbra Editora, 2006, p. 432.

[65] Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., p. 599.

[66] A Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, em declaração de voto no Ac. do TC n.º 349/02, salienta que “[é] certo que a taxa de justiça não se destina a pagar, apenas, o serviço correspondente à tramitação realmente processada em cada caso; no seu cálculo inclui-se também, como é natural, uma parcela para suportar o funcionamento da máquina de justiça em geral, funcionamento de que beneficia qualquer processamento”. Cf. Ac. do TC n.º 349/2002, proferido no processo n.º 632/01, em 15 de julho de 2002, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

[67] A expressão pode ser encontrada, por exemplo, no Ac. do TC n.º 539/2015, proferido no processo n.º 27/15, em  20 de outubro de 2015, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

[68] Neste sentido, VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., pp. 134-135, 142-145 e 584. Faz-se notar que em Espanha é amplamente aceite a ideia de que a tasa judicial prossegue duas finalidades – a racionalização do acesso à justiça e o financiamento do sistema judicial. Para uma abordagem a este tema na doutrina espanhola, por exemplo, GIL RODRÍGUEZ, Isabel, “Las tasas…”, op. cit., p. 67 e ss..

[69] “Se o princípio da equivalência não o impõe, sem dúvida que ele ao menos sugere a consignação de taxas e contribuições ao financiamento das prestações efetivas ou presumidas que lhes estão subjacentes […]”. Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., p. 621. Itálico mantido conforme original.

[70] O IGFEJ, entidade de Direito público por natureza, é um instituto público que integra o Ministério da Justiça, fazendo parte da administração indireta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e de património próprio.

[71] Cf. art.os 35.º e 36.º, do RCP.

[72] Cf. CARVALHO, Jorge, e OLIVEIRA, Fernanda Paula Marques de, “Perequação – Taxas e cedências: administração urbanística em Portugal”, Coimbra, Almedina, 2008, p. 57. Um exemplo de uma taxa imposta por lei pode ser dado com recurso à taxa de gestão de resíduos cujo regime jurídico se encontra regulado no Decreto – Lei n.º 178/2006, de 05 de setembro, com a última redação conferida pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, e na Portaria n.º 278/2015, de 11 de setembro. No mesmo sentido, por exemplo, CEDOUA, et al., “Direito do urbanismo e autarquias locais – realidade actual e perspectivas de evolução”, Coimbra, Almedina, 2006, p. 152, e FERNANDES, Filipe de Vasconcelos, “Direito Fiscal Constitucional – Introdução e Princípios Fundamentais”, Lisboa, AAFDL, 2020, p. 196. Em sintonia perfeita com esta compreensão, veja-se, entre outros, MARTÍNEZ SÁNCHEZ, César, “Principio de…”, op. cit., p. 74. O autor espanhol sustenta que “[l]a «provocación» puede ser directa, en los casos en los que media una solicitud del particular; o indirecta, en aquellos casos en que la Administración interviene de oficio invocando un interés general”.

[73] Cf. GARCIA, Nuno de Oliveira, “Contencioso de Taxas – Liquidação, audição e fundamentação”, 3.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2018, p. 180. A solicitação do serviço é, na ótica do autor, um dos motivos pelos quais há um relaxamento no dever de fundamentação nas taxas, que se dá dar por respeitado pela simples estrutura sinalagmática da taxa, por oposição ao que sucede nos impostos.

[74] Cf. AMORIM, José da Campos, AZEVEDO, Patrícia Anjos, “Lições de…”, op. cit., p. 31.

[75] Neste sentido, MARTÍNEZ SÁNCHEZ, César, “Principio de…”, op. cit., p. 65. O autor sustenta que “[…] la voluntariedad en la solicitud o recepción de los bienes o servicios públicos es una condición lógica, en tanto consecuente con su propio fin, para la aplicación del principio de equivalencia en la financiación de dichos bienes y servicios”.

[76] Em sintonia, GARCÍA NÓVOA, César, “El concepto de tributo”, Espanha, Marcial Pons, 2012, p. 262. O autor, porém, é avesso à utilização do termo “contraprestação”, por entender justamente que tal terminologia está reservada para as obrigações contratuais.

[77] Cf. VASQUES, Sérgio, “O Princípio…”, op. cit., p. 134.

[78] Dizemos essencialmente por existirem situações em que a complexidade da causa influencia o valor da taxa de justiça, embora, parece-nos, em sentido ascendente, e não no sentido de permitir uma diminuição dos seus valores. Para o que se deverá entender por complexidade da causa, veja-se o n.º 7, do art. 530.º, do CPC. As situações normativamente previstas em que a complexidade da causa assume relevância na fixação da base tributável, encontramo-las nos  n.os 5 e 7, do art. 6.º, e no n.º 9.º, do art. 8.º, ambos do RCP. O não pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, nos casos previstos no art. 14.º-A, do RCP, em particular, nos das als. b), c), d), e), i) e j), também poderá ser uma manifestação desse critério.

[79] Nos termos do art. 11.º, do RCP, “[a] base tributável para efeitos de taxa de justiça corresponde ao valor da causa, com os acertos constantes da tabela i, e fixa-se de acordo com as regras previstas na lei do processo respectivo”.