Inês Neves

Assistente Convidada da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, desde outubro de 2018.
Investigadora colaboradora do Centro de Investigação Jurídico-Económica (CIJE), da Faculdade de Direito da Universidade do Porto.
Advogada na Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, onde integra o departamento de europeu e concorrência, a French Desk e a equipa ‘Sustentabilidade: ESG e Direitos Humanos’.

Benedita Sequeira

Assistente Convidada da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, desde setembro de 2020.
Investigadora no Centro de Investigação Jurídico-Económica (CIJE), da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, desde dezembro de 2021.
Assistente de Investigação no “NOVA Center on Business, Human Rights and the Environment”, desde outubro de 2020.


A 23 de fevereiro do presente ano, a Comissão Europeia adotou a tão esperada Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade([1]). Como se sabe, por dever de diligência em matéria de direitos humanos – ou, na expressão original, human rights due diligence – pretende-se referir o processo ou o conjunto de medidas adotadas por uma empresa, tendo em vista a identificação, a prevenção e atenuação, a cessação e a minimização dos efeitos negativos – potenciais ou reais – das suas operações, das suas filiais e, bem assim, das cadeias de valor em que inserida, nos direitos humanos e no ambiente([2]).

O impacto da normação e a mudança de paradigma que lhe subjaz justificam dedicar-lhe algumas notas e, acima de tudo, antecipar aqueles que poderão assumir-se como verdadeiros parâmetros da ação empresarial. Neste texto, avançar-se-á uma exposição sumária do conteúdo da Proposta, procurando identificar algumas das suas principais implicações para as empresas, seguindo-se uma reflexão breve sobre alguns dos aspetos mais críticos da adoção, a este propósito, de normas vinculativas dirigidas, quer aos Estados(-Membros), quer às empresas ‘visadas’.

O rationale da Proposta de Diretiva de que se trata contende, em essência, com um propósito de melhoria das práticas de governação empresarial, tornando-as ‘mais sustentáveis’, através, inter alia, da responsabilidade e responsabilização das empresas e respetivos administradores pelos efeitos negativos das suas atividades e decisões, nos direitos humanos e no ambiente([3]). Assim, e em certa medida, visam-se corrigir o que se consideram como falhas do mercado associadas ao chamado short-termism([4]) ou orientação das empresas para o curto prazo, porquanto incompatível ou inimiga de uma estratégia pró-sustentabilidade, necessariamente carecida de investimentos e associada a alguma incerteza.

Assim, é porque se reputa o business-as-usual([5]) de insuficiente que se procura internalizar o problema([6]), partindo, para o efeito, do acervo de soft-law internacional, com destaque para i) os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos das Nações Unidas; ii) as Linhas Diretrizes da OCDE para as Empresas Multinacionais; iii) o Guia da OCDE de Devida Diligência para uma Conduta Empresarial Responsável e demais guias setoriais, e, bem assim, iv) as recomendações da Declaração Tripartida de Princípios sobre Empresas Multinacionais e Política Social da Organização Internacional do Trabalho (‘OIT’).

No que respeita ao âmbito subjetivo da Proposta de Diretiva, e ao contrário do alcance mais lato subjacente à Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de março de 2021([7]), ficarão abrangidas pela Diretiva([8]) três categorias de empresas([9]). Num primeiro grupo, encontram-se i) todas as empresas europeias com mais de 500 trabalhadores em média e um volume de negócios superior a 150 milhões de euros no último exercício financeiro. Num segundo grupo – atinente a empresas cuja obrigação de diligência se aplicará apenas dois anos após o decurso do prazo de transposição – encontram-se ii) as empresas europeias com mais de 250 trabalhadores em média e um volume de negócios líquido superior a 40 milhões de euros, desde que pelo menos 50% desse volume de negócios tenha sido gerado em um ou mais de três setores identificados como de “alto risco”, a saber: têxteis, agricultura e minerais. Por fim, a futura Diretiva visará, ainda, iii) as empresas de países terceiros com “operações significativas na UE”, circunstância que se entende resultar do preenchimento de uma das seguintes condições: a) ter(em) gerado um volume de negócios líquido superior a 150 milhões de euros, no exercício anterior ao último exercício financeiro, ou então (este, um critério alternativo aplicável apenas dois anos após a data do termo do período de transposição), b) ter(em) gerado um volume de negócios líquido superior a 40 milhões de euros, mas inferior a 150 milhões de euros, no exercício anterior ao último exercício financeiro, contanto que pelo menos 50% do seu volume de negócios líquido mundial tenha sido gerado em um ou mais dos setores de “alto risco”. Ainda a este propósito, saliente-se que, apesar de um âmbito subjetivo aparentemente circunscrito às empresas com um poder económico substancial, as obrigações previstas na Proposta poderão vir a ter um impacto – ainda que indireto – nas pequenas e médias empresas([10]).

No que respeita ao seu objeto e conteúdo, a Diretiva não surge, de facto, num vazio regulatório.

Desde logo, diferentes Estados-Membros vêm adotando legislação e impondo às empresas um conjunto de obrigações inclusive mais rigorosas (comparando com as esperadas), em matéria de dever de diligência ambiental e de direitos humanos. A título meramente exemplificativo, destacamos o caso da França, cuja Loi relative au devoir de vigilance([11]), de 2017, impõe às grandes empresas francesas a adoção, a implementação efetiva, e, bem assim, a comunicação de um plano de vigilância, conducente à prevenção e mitigação de violações graves de direitos humanos. Em 2019, também os Países Baixos adotaram legislação específica em matéria ao trabalho infantil – a Wet zorgplicht kinderarbeidm([12]) -, da qual resulta que as empresas que forneçam bens e serviços a consumidores no mercado neerlandês, deverão adotar e conduzir um exercício de diligência devida em relação aos riscos de trabalho infantil. Já a Alemanha avançou, em 2021, a Sorgfaltspflichtengesetz([13]), impondo obrigações de diligência às empresas alemãs. Outros Estados-Membros vêm, por sua vez, anunciando propostas no mesmo sentido([14]).

Não é só, porém, no plano nacional que se vem assistindo à adoção de medidas relevantes. Com efeito, também no âmbito da União Europeia se encontram já Regulamentos impondo o exercício de human rights due diligence em setores específicos, considerados de “alto risco”([15]), não podendo, de igual modo, ignorar-se a Diretiva Europeia sobre a Divulgação de Informações Não Financeiras([16]), que “impõe a certas grandes empresas a obrigação de divulgar as políticas adotadas em relação a questões ambientais, sociais, laborais, de respeito pelos direitos humanos e em questões de anticorrupção e crime financeiro”([17]), ou, ainda, o Regulamento Divulgação de Informações sobre Sustentabilidade dos Serviços Financeiros([18]).

A esta luz, não se nos afigura exato associar a Diretiva ora proposta – ao menos quanto ao seu rationale – a qualquer novidade stricto sensu. Do que se trata, na verdade, e antes, é de procurar harmonizar e conferir força vinculativa a um conjunto de instrumentos normativos de fonte nacional e internacional que, pelas suas limitações, se revelaram incapazes ou insuficientes para o alcançar de progressos significativos em matéria de proteção dos direitos humanos e da prevenção de danos ambientais([19]),insuficiência ou incapacidade bem patentes em alguns estudos, com destaque para o Corporate Human Rights Benchmark, de 2020([20]), ou o Estudo para a Comissão Europeia sobre Diligência Devida ao longo da Cadeia de Produção, também de 2020([21]).

A esta luz, compreende-se que a Diretiva vise, também, i) colmatar essa insuficiência, ii) garantindo, também, às empresas maior segurança jurídica. E como? Reunindo – agora em instrumento vinculativo – um conjunto de obrigações de meios (cf. considerando 15), pelos quais as empresas abrangidas se verão obrigadas a: i) integrar o dever de diligência nas suas estratégias e políticas empresariais (art. 5.º); ii) adotar medidas adequadas a identificar impactos adversos, reais ou potenciais, nos direitos humanos e no ambiente (art. 6.º)([22]); iii) prevenir e atenuar os efeitos negativos potenciais (art. 7.º); iv) fazer cessar e minimizar a extensão dos efeitos negativos reais (art. 8.º), prevendo-se, ainda, v) um dever específico ou, pelo menos, autonomizado em matéria ambiental e de combate às alterações climáticas (art. 15.º).

E repare-se que se está perante obrigações que se estendem a toda a cadeia de valor da empresa, i.e., que incluem, naturalmente, as atividades próprias (e das respetivas subsidiárias), mas, e também, as suas relações comerciais com outras entidades (fornecedores, clientes, etc.)!

No que à monitorização respeita, cumpre notar que a estas obrigações vão acoplados três mecanismos, exigindo das empresas i) a manutenção de um procedimento de reclamação (art. 9.º); ii) a avaliação e o controlo da eficácia das medidas adotadas em matéria de dever de diligência (art. 10.º), e, bem assim, iii) a comunicação pública das informações sobre o dever de diligência (art. 11.º)([23]).

Já em sede de enforcement– matéria particularmente suscetível de apontamentos críticos quanto à respetiva adequação e/ou suficiência – a Proposta trata, quer da responsabilidade civil das empresas por danos causados em razão do incumprimento das suas obrigações de diligência (cf. art. 22.º), quer, e bem assim, do sistema de public enforcement, caracterizado pela intervenção de autoridades de supervisão, às quais atribuídos poderes vários, entre os quais o de impor sanções administrativas pecuniárias, baseadas no volume de negócios da empresa (cf. arts. 18.º e 20.º).

Ainda quanto ao conteúdo da Proposta, importa relevar o papel reconhecido aos administradores na internalização das questões de sustentabilidade na cultura da empresa. A este propósito, parece-nos resultar, de forma clara, da Diretiva, o objetivo de clarificar, de forma harmonizada, a extensão ou o conteúdo do dever de cuidado, ou – e para usar as palavras da Proposta – do dever geral de diligência dos administradores de agir no interesse da empresa. Em particular, estabelece-se, i) não só o dever de os administradores terem em conta as questões de sustentabilidade nas suas decisões, adaptando a estratégia empresarial em conformidade, como e, bem assim, ii) a sua responsabilidade pela adoção, aplicação e supervisão das medidas relativas ao dever de diligência, sempre tendo em conta o contributo das partes interessadas e das organizações da sociedade civil(cf. considerandos 63 e 64 e arts. 25.º e 26.º da Proposta)([24]).

Apresentados os traços identitários da Proposta, passemos, agora, ao tratamento do respetivo impacto e, bem assim, de algumas das dúvidas ou problemas por ela suscitados.

À cabeça, crê-se como pacífico que a presente Diretiva representa um importante passo na responsabilização das empresas por comportamentos que, não obstante ‘lucrativos’, se afiguram lesivos do ambiente e dos direitos humanos. E isto, quer se trate de i) danos causados pela própria empresa, quer se trate de impactos negativos ii) para os quais as empresas contribuíram, iii) ou que se encontrem diretamente ligados às suas atividades ou relações comerciais. Em resultado, as obrigações de meios ora estabelecidas exigirão das empresas ‘visadas’ um comprometimento contínuo com o respeito pelos direitos humanos e pelo ambiente, sob pena de eventual responsabilidade pelos danos advenientes do incumprimento de um dever de pronta e diligente atuação([25]).

Em segunda linha, e em face de um status quo cuja fragmentação se adensa – com tudo o que isso acarreta no plano do level playing field e da própria gestão de risco pelas empresas – à Diretiva subjazem, também, objetivos claros de promoção da certeza e da segurança jurídicas. Com efeito, vêm sendo, até aqui, várias as incertezas associadas ao comportamento esperado das empresas, o que dificulta ou pode mesmo inviabilizar qualquer estratégia de mitigação do risco. A título de exemplo, basta pensar que, para uma empresa que atua em diferentes jurisdições, fornecendo bens ou serviços (o que não é incomum num mercado globalizado, estruturado em torno de cadeias de produção à escala global), os diferentes e variáveis padrões de conduta exigidos, consoante a jurisdição aplicável, poderão repercutir-se de forma muito negativa na atividade empresarial. A esta luz, e em linha, aliás, com os Princípios Orientadores da ONU sobre empresas e Direitos Humanos([26]), é de aplaudir o propósito da Diretiva no sentido de harmonizar ou, pelo menos, de cimentar o manto de retalhos resultante dos standards existentes, i) não só clarificando as obrigações impostas às empresas([27]), como, e bem assim, ii) procurando garantir o acesso à justiça para as vítimas. De todo o modo, não se ignore que – sendo a Diretiva um instrumento carecido de transposição -, o equilíbrio adequado entre a adoção de conceitos que se pretendem suficientemente plásticos ou flexíveis, por um lado, e a necessidade de evitar a fragmentação cujos perigos se pretendem, afinal, mitigar, por outro, poderá ser bastante difícil de conseguir na prática. E, portanto, espera-se que do procedimento legislativo saia um equilíbrio idóneo neste sentido([28]).

            Quase a terminar, importa referir um terceiro plano, quiçá digno de maior destaque, e que contende com a importante alteração do status quo a que a Diretiva vem associada. Em particular, crê que a Diretiva proposta terá o condão de transformar aquele que era, até então, visto sobretudo como “padrão geral de conduta” num conjunto de normas jurídicas vinculativas. Em resultado, aqueles que se apresentavam, até aqui, como standards sobretudo pensados para os Estados (destinatários das Convenções internacionais), e resultantes de soft law internacional, vêm, agora, consagrados em normasvinculativas, tendo por destinatárias finais as empresas. Ou seja, e ao jeito de qual toque de Midas, a soft law internacional vem transformada em hard law europeia, sendo que uma abordagem que era, então, do tipo ‘do not harm([29]) surge, agora, transmutada sob a forma de dever de agir.

Aqui chegados, cumpre notar que o que acaba de se avançar não legitima, porém, fechar os olhos às críticas que aqui e ali se vêm dirigindo à Proposta. E isto, seja para i) lhe imputar alguma falta de alinhamento com a soft law internacional e os próprios instrumentos da União Europeia, sobretudo no que ao setor financeiro respeita; seja para ii) criticar um ‘miss the target’, atento o objetivo – quiçá não conseguido – de evitar uma compliance do tipo box-ticking [quando o dever de diligência tem necessariamente de ser visto (mais) como processo ou como dinâmica]; seja, enfim, para iii) apontaralgumas insuficiências em sede de complementaridade entre os sistemas de public e de private enforcement([30]).

Todavia – e apesar das críticas a que sujeita (que poderão e deverão ser consideradas em sede de procedimento legislativo) – crê-se que a Proposta acerta no alvo e a mudança de paradigma que lhe subjaz será, pois, de acolher com entusiasmo. Importa, no entanto – para que as suas vantagens não se vejam suplantadas pelos seus perigos -, que assegurar um correto equilíbrio entre a sustentabilidade como meta e o escopo lucrativo como fim, garantindo que os comportamentos ora exigidos às empresas sejam devidamente avaliados segundo um padrão de proporcionalidade, apenas lhes podendo ser exigíveis medidas que, além de razoavelmente disponíveis, se afigurem, também, economicamente sustentáveis([31]).


([1])           Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade e que altera a Diretiva (UE) 2019/1937 – COM/2022/71 final 2022/0051(COD). Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/?uri=CELEX%3A52022PC0071, [último acesso 03.06.2022], doravante ‘Proposta’ ou ‘Proposta de Diretiva’.

([2])           Cf., inter alia, NAÇÕES UNIDAS – ‘Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos: Aplicação do quadro das Nações Unidas Proteger, Respeitar e Reparar’ (2011), HR/PUB/11/04, disponível em https://www.ohchr.org/Documents/Publications/GuidingPrinciplesBusinessHR_EN.pdf, [último acesso em 03.06.2022], em particular, os princípios 17 e ss.; e ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO (‘OCDE’) – ‘Linhas Diretrizes da OCDE para as Empresas Multinacionais’ (atualização de 2011), disponível em: http://mneguidelines.oecd.org/guidelines/, [último acesso em 03.06.2022], §14 e ‘Guia da OCDE de devida diligência para uma conduta empresarial responsável’, disponível em http://mneguidelines.oecd.org/guia-da-ocde-de-devida-diligencia-para-uma-conduta-empresarial-responsavel-2.pdf, [último acesso em 03.06.2022], p. 15. Aludindo à densificação do conceito pela soft law internacional, cf. considerando 6 da Proposta de Diretiva.

([3])           Cf. Ponto 1 da Exposição de Motivos que antecede a Proposta (Razões e objetivos da proposta).

([4])           Sobre a questão, vd. DIRECTORATE-GENERAL FOR JUSTICE AND CONSUMERS (EUROPEAN COMMISSION) / EY – ‘Study on directors’ duties and sustainable corporate governance – Final report’, 29.07.2020, disponível em: https://op.europa.eu/en/publication-detail/-/publication/e47928a2-d20b-11ea-adf7-01aa75ed71a1/language-en, [último acesso em 03.06.2022], doravante ‘Relatório EY’.

([5])           Cf. Relatório EY, p. 30 e ss.

([6])           O que leva inclusive alguns Autores a deslocar o foco ou natureza da Proposta, de uma legislação pura de Direito Comercial ou de corporate governance, para a regulação pública – cf. FERRARINI, Guido – exposição oral em seminário online, organizado pelo European Corporate Governance Institute (ECGI), em colaboração com o SSE Institute of Corporate Governance, nos dias 28 e 29 de março de 2022. Gravação disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Ykfc5Vl0tCQ, [último acesso em 03.06.2022].

([7])           Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de março de 2021, que contém recomendações à Comissão sobre o dever de diligência das empresas e a responsabilização das empresas [2020/2129 (INL)]. Doravante ‘Resolução do Parlamento Europeu’.

([8])           Uma vez aprovada e devidamente transposta pelos Estados-Membros.

([9])           O artigo 3.º (a) da Proposta de Diretiva delimita o conceito relevante de ‘empresa’.

([10])         De acordo com a Exposição de Motivos que acompanha a Proposta, “as pequenas e médias empresas (PME) […] estão excluídas do dever de diligência. Para esta categoria de empresas, os encargos financeiros e administrativos decorrentes da criação e aplicação de um processo de dever de diligência seriam relativamente elevados […] Além disso, a cadeia de valor do setor financeiro não abrange as PME que recebem empréstimos, crédito, financiamento, seguros ou resseguros”. Contudo, porque “estarão expostos [sic] a alguns dos custos e encargos por via das relações empresariais com empresas abrangidas, uma vez que se espera que as grandes empresas repercutam as exigências nos seus fornecedores”, “serão necessárias medidas de apoio para ajudar as PME a criar capacidade operacional e financeira. As empresas cujo parceiro comercial seja uma PME são igualmente obrigadas a apoiá-lo no cumprimento dos requisitos em matéria de dever de diligência, caso tais requisitos comprometam a viabilidade da PME”. Vd., a este propósito, inter alia, considerandos 34, 39, 47 e 48, e artigos 7.º, n.º 2, al. d); 8.º, n.º 3, al. e) e 14.º da Proposta.

([11])         Loi du 27 mars 2017 relative au devoir de vigilance des sociétés mères et des entreprises donneuses d’ordre, 2017, disponível em: https://www.legifrance.gouv.fr/jorf/id/JORFTEXT000034290626/, [último acesso em 04.06.2022].

([12])         Wet zorgplicht kinderarbeidm, 2019, disponível em: https://zoek.officielebekendmakingen.nl/stb-2019-401.pdf, [último acesso em 04.06.2022].

([13])         Sorgfaltspflichtengesetz, 2021, disponível em: https://www.bgbl.de/xaver/bgbl/start.xav?startbk=Bundesanzeiger_BGBl&jumpTo=bgbl121s2959.pdf#__bgbl__%2F%2F*%5B%40attr_id%3D%27bgbl121s2959.pdf%27%5D__1654435457968, [último acesso em 05.06.2022].

([14])         No que diz respeito aos países do Espaço Económico Europeu (‘EEE’), a Noruega adotou, em 2021, legislação em matéria de dever de diligência. Para um ‘panorama’ da legislação e das iniciativas dos Estados-Membros e do EEE, vd. anexo 8 da avaliação de impacto que acompanha a Proposta de Diretiva.

([15])         Cf., em particular, o Regulamento (UE) n.º 995/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de outubro de 2010 , que fixa as obrigações dos operadores que colocam no mercado madeira e produtos da madeira e o Regulamento (UE) n.º 2017/821 do Parlamento Europeu e do Conselho de 17 de maio de 2017, que estabelece as obrigações referentes ao dever de diligência na cadeia de aprovisionamento que incumbe aos importadores da União de estanho, de tântalo e de tungsténio, dos seus minérios, e de ouro, provenientes de zonas de conflito e de alto risco.

([16])         Cf. Diretiva 2014/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 22 de outubro de 2014 que altera a Diretiva 2013/34/UE no que se refere à divulgação de informações não financeiras e de informações sobre a diversidade por parte de certas grandes empresas e grupos.

([17])         Cf. Resolução do Parlamento Europeu, cit.

([18])         Cf. Regulamento (UE) n.º 2019/2088 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, relativo à divulgação de informações relacionadas com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros. A que acresce o ‘Regulamento Taxonomia’ (cf. Regulamento (UE) n.º 2020/852 do Parlamento Europeu e do Conselho de 18 de junho de 2020 relativo ao estabelecimento de um regime para a promoção do investimento sustentável, e que altera o Regulamento (UE) 2019/2088).

([19])         E do acesso à justiça, com elas intimamente relacionado.

([20])         Cf. WORLD BENCHMARKING ALLIANCE – ‘Corporate Human Rights Benchmark 2020’, 2020, disponível em: https://www.worldbenchmarkingalliance.org/publication/chrb/, [último acesso em 04.06.2022].

([21])         Smith, Lise [et. al.] – ‘Study on due diligence requirements through the supply chain’, European Commission, 2020, disponível em: https://op.europa.eu/en/publication-detail/-/publication/8ba0a8fd-4c83-11ea-b8b7-01aa75ed71a1/language-en, [último acesso em 04.06.2022].

([22])         Nos termos do n.º 2 do artigo 6.º da Proposta, “as empresas a que se refere o artigo 2.º, n.º 1, alínea b), e o artigo 2.º, n.º 2, alínea b), só são obrigadas a identificar os efeitos negativos graves potenciais ou reais pertinentes para o setor em causa a que se refere o artigo 2.º, n.º 1, alínea b).

([23])         Segundo o considerando 44 da Proposta, “A fim de evitar a duplicação das obrigações de comunicação de informações, a presente diretiva não deverá, por conseguinte, introduzir quaisquer novas obrigações de comunicação de informações para além das previstas na Diretiva 2013/34/UE para as empresas abrangidas por essa diretiva, nem as normas de comunicação de informações que deverão ser desenvolvidas nos termos da mesma. No que diz respeito às empresas abrangidas pelo âmbito de aplicação da presente diretiva, mas que não são abrangidas pela Diretiva 2013/34/UE, a fim de cumprirem a sua obrigação de comunicação no âmbito do dever de diligência previsto na presente diretiva, devem publicar no seu sítio Web uma declaração anual numa língua de uso corrente na esfera empresarial internacional”.

([24])         Além disso, e ainda que em termos injustificadamente circunscritos, há também referência à introdução de métricas de sustentabilidade na componente variável da remuneração. Sobre a inclusão, no esquema de remuneração dos administradores, de métricas ESG, relacionadas com as metas da empresa em matéria de sustentabilidade, vd. Relatório EY, p. 118 e ss. Para uma crítica da opção seguida na Proposta, vd. PRINCIPLES FOR RESPONSIBLE INVESTMENT – ‘PRI Statement: European Commission Proposal on Corporate Sustainability Due Diligence’, de 2 de março de 2022, disponível em https://www.unpri.org/download?ac=15897, [último acesso em 03.06.2022], p. 2.

([25])         Referindo-se à ‘due diligence defense’ como uma defesa, e não como ‘porto seguro’ – vd. SHIFT – ‘Shift’s Analysis of the EU Commission’s Proposal for a Corporate Sustainability Due Diligence Directive’, de março de 2022, disponível em https://shiftproject.org/resource/eu-csdd-proposal/shifts-analysis/, [último acesso em 03.06.2022], p. 9.

([26])         De onde resulta clara a necessidade de aposta numa mistura inteligente de medidas nacionais e internacionais, vinculativas e voluntárias, de modo a assegurar e promover o respeito dos direitos humanos pelas empresas.

([27])         De acordo com aquilo que foi sugerido por diversas entidades empresariais, grupos da sociedade civil e ONGs, a Proposta clarifica as obrigações a que as empresas se encontram sujeitas nas suas operações levadas a cabo dentro e fora do mercado europeu, pugnando por uma conduta social e ambientalmente responsável. – Veja-se, neste sentido, ECCJ – ‘Over 100 civil society organisations demand human rights and environmental due diligence legislation’, de 2 de dezembro de 2019, disponível em: https://corporatejustice.org/news/16800-over-100-civil-society-organisations-demand-human-rights-and-environmental-due-diligence-legislation, [último acesso em 04.06.2022]. E ainda, a entrada no Business & Human Rights Resource Centre, sobre ‘Big business makes joint call for legal duty of care for human rights and the environment’, de 2 de setembro de 2020, disponível em: https://www.business-humanrights.org/en/latest-news/big-business-makes-joint-call-for- -legal-duty-of-care-for-human-rights-and-the-environment/, [último acesso em 04.06.2022].

([28])         Sendo um dos objetivos da Diretiva assegurar maior segurança jurídica, a formulação das obrigações em termos de tal forma vagos ou, pelo menos, desamparados de uma qualquer orientação adicional, poderá afigurar-se potenciadora de divergências, a evitar, seja em sede de transposição, seja através da adoção de atos delegados. Quanto aos atos delegados, cf. arts. 11.º e 28.º da Proposta.

([29])         Cf. Relatório EY, p. 109.

([30])         Cf. sobre a questão, LAFARRE, Anne – exposição oral em seminário online, organizado pelo European Corporate Governance Institute (ECGI), em colaboração com o SSE Institute of Corporate Governance, nos dias 28 e 29 de março de 2022. Gravação disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Ykfc5Vl0tCQ, [último acesso em 03.06.2022].

([31])         Cf. FERRARINI, Guido, cit.