José Melo Alexandrino

Doutor em Direito pela Universidade de Lisboa. Professor associado da Faculdade de Direito de Lisboa e investigador do Centro de Investigação de Direito Público do Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da mesma Faculdade.

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Não parece merecer crítica a omissão do direito à liberdade do artigo 27.º da Constituição no decreto presidencial de declaração do estado de emergência

A recente divulgação de um artigo do Professor Jorge Reis Novais a qualificar como “um grave erro de enquadramento” o facto de, no decreto presidencial de declaração do estado de emergência, não constar do elenco dos direitos fundamentais parcialmente suspensos o direito à liberdade pessoal do artigo 27.º da Constituição[1] pôs em evidência o interesse na clarificação de um tema que entre nós se tem revelado particularmente controvertido.

Segundo Jorge Reis Novais, apenas através de revisão constitucional ou da suspensão parcial das garantias individuais do artigo 27.º seria possível atenuar a “actual rigidez” do artigo 27.º da Constituição ou superar a “anomalia” que se reflecte “na impossibilidade/dificuldade de determinar quarentenas gerais obrigatórias de não doentes ou o internamento compulsivo de doentes”.

Nas palavras do autor, “se o Estado confina compulsivamente não doentes no espaço das suas residências ou de outros estabelecimentos, pode afectar indirectamente o direito de deslocação (direito cuja suspensão foi prevista no decreto presidencial), mas restringe/viola directamente o direito fundamental garantido no art. 27.º, já que priva parcialmente da sua liberdade tais cidadãos”. Em consequência, não tendo este direito sido suspenso, o Governo não poderá legislar sobre ele, de forma inovadora relevante, sem a necessária autorização legislativa da Assembleia da República.

Subjacente à tese defendida pelo autor está ainda o entendimento segundo o qual o artigo 27.º da Constituição consagra uma norma-regra e não uma norma-princípio, devendo retirar-se desse artigo 27.º que o legislador constituinte quis fazer aí todas as ponderações sobre a privação total ou parcial da liberdade, dispondo por isso os correspondentes enunciados de uma validade jurídica inequívoca, absoluta e definitiva[2] – interpretando por conseguinte essas disposições como tendo sido estabelecidas sob a forma de regra, daí se segue, segundo o autor, que teria de haver suspensão do direito à liberdade do artigo 27.º.

Colocado o problema, talvez não seja de mais lembrar logo de início que o Direito não é matemática, não sendo muitas vezes possível chegar a respostas definitivas ou afastar totalmente as dúvidas, devendo a correcção aferir-se então pelo método e pela consistência dos argumentos apresentados e debatidos no fórum público.

Deixando deliberadamente de lado todas as demais apreciações críticas ao decreto presidencial feitas pelo autor, a última das quais de enorme pertinência, são quatro as notas jurídico-constitucionais a que pretendo resumir a demonstração de que o decreto do Presidente da República n.º 10-A/2020, de 18 de Março, não incorreu em erro de enquadramento ao ter omitido o direito à liberdade pessoal entre os direitos objecto de suspensão.

1. A primeira nota incide sobre as lições a extrair da génese e das sucessivas alterações introduzidas no artigo 27.º da Constituição, que consagra o direito à liberdade e à segurança.

Como cedo notou Manuel de Lucena, em matéria de liberdade física, a Constituição de 1976 foi muito longe na reacção ao regime corporativo, constituindo sem dúvida esse um dos casos em que o Estado, por excesso de protecção, correu o risco de ficar desarmado perante o cidadão[3]. A Constituição foi tão longe, que as sucessivas revisões constitucionais se sentiram forçadas a aditar novas ou mais extensas excepções (ou limites) ao princípio da liberdade (ou a delimitar restritivamente algumas das suas expressões e garantias), tanto mais quando a legislação ordinária insistia teimosamente na previsão de diversas outras situações de privação da liberdade[4].

Na verdade, a resposta a esse excesso de protecção foi dada antes de mais pela prática (revelada pelo legislador ordinário, pela doutrina e pela jurisprudência do Tribunal Constitucional) e, só depois, pelo legislador de revisão constitucional[5], que, ao longo de duas décadas, se encarregou de ir acomodando as normas constitucionais aos factos e mais tarde também às soluções do Código de Processo Penal de 1987, tendo-se admitido uma “intenção convalidatória” na revisão de 1982[6] e concluído que, pelo menos entre 1989 e 1997, se esteve “perante uma lista apenas nominalmente taxativa de excepções ao princípio da liberdade”[7].

Ora, a principal resultante tanto do excesso de reacção ao regime autoritário, como da experiência das vicissitudes sofridas pelo artigo 27.º foi o eco do repetido discurso político (agravado a cada revisão constitucional) de que as únicas restrições ao direito de liberdade seriam as excepções taxativamente fixadas nos números 2 e 3 do mesmo artigo: na lógica desse discurso, a admissão de novas hipóteses de restrição apenas seria possível por revisão constitucional, através do alargamento do elenco das excepções expressamente previstas[8].

A ilusão e o erro de perspectiva, sendo embora manifestos do ponto de vista jurídico, encontram no entanto uma justificação na matriz genética e na prática discursiva das revisões constitucionais, na base de uma leitura apressada do texto constitucional, elemento que se impõe investigar.

2. A segunda nota respeita por isso às lições a extrair do programa normativo do artigo 27.º, na procura de uma interpretação adequada dos correspondentes enunciados, e visa em última análise esclarecer em que medida poderá o mesmo aplicar-se a situações como as do confinamento compulsivo, do estabelecimento de cercas sanitárias ou a medidas equivalentes de afectação da liberdade física por parte de autoridades sanitárias, administrativas ou da protecção civil, dentro ou fora de um contexto de urgência ou calamidade.

Olhando ao artigo 27.º como um todo, a primeira impressão que dele se retira é sem dúvida a da sua enorme complexidade: deixando aqui de lado dimensões teóricas que seriam deslocadas nesta sede, do programa normativo retiramos antes de mais estar aí previsto o direito à liberdade, mas também o direito à segurança ou, em fórmula unitária (mas não menos complexa), “o direito à liberdade e à segurança”; em segundo lugar, sendo embora dois valores constitucionais e dois direitos fundamentais da pessoa enunciados lado a lado (e que devem ser lidos em conjunto)[9], há um evidente conflito entre a liberdade e a segurança[10], acrescendo que esta última se apresenta igualmente como obrigação prestacional do Estado, como verdadeiro dever estadual[11]; em terceiro lugar, verifica-se que o artigo 27.º, excluindo talvez o seu n.º 1, abre o bloco sistemático da “Constituição penal e processual penal” (que se estende até ao artigo 32.º); em quarto lugar, relativamente ao direito à liberdade do artigo 27.º, n.º 1, o que está aí em causa é uma específica dimensão da liberdade, a liberdade física, entendidacomo liberdade de “ir e vir”, como direito de não ser detido, aprisionado, ou de qualquer modo fisicamente confinado a um determinado espaço[12]; em quinto lugar, se o n.º 2 do artigo 27.º se apresenta como o limite[13] principal ao direito à liberdade, o n.º 3 enuncia toda uma série de outros limites complementares ao direito à liberdade, formulados como “excepções” ao princípio enunciado no n.º 2; em sexto lugar, os n.os 4 e 5 do artigo 27.º têm uma ligação mais intensa com o direito à segurança (de que são garantias) do que com o direito à liberdade; por fim, regista-se a singularidade de o n.º 3 do artigo 27.º qualificar expressamente a norma do n.º 2 como “princípio”, sendo este o único caso de auto-qualificação expressa de uma norma como princípio em todo título II da parte I da Constituição.

Avancemos um pouco mais. Naquela que continua a ser a decisão mais marcante do Tribunal Constitucional sobre o (objecto e âmbito material de protecção do) direito à liberdade e à segurança, o Acórdão n.º 479/94, onde se procurou clarificar o conceito de privação total ou parcial da liberdade do artigo 27.º, n.º 2, a partir da distinção germânica entre privação da liberdade (Freiheitsentziehung)e restrição da liberdade (Freiheitsbeschränkung), José Manuel Cardoso da Costa concluía desta maneira a sua declaração de voto: “votei a decisão com o respectivo fundamento (…) – embora sem acompanhar, ou, pelo menos, com reservas, quanto a este último, de alguns desenvolvimentos dele que se fazem no acórdão (tais são, nomeadamente, os relativos aos termos da distinção entre «privação total», «privação parcial» e «restrição» da liberdade, que deixo, por isso, a benefício de melhor estudo)”[14].

As palavras não deixavam de esconder a dificuldade da empresa[15].

Uma vez que esse estudo não parece, ainda hoje, ter sido satisfatoriamente levado a cabo entre nós, convirá talvez sintetizar um pouco os elementos essenciais da dogmática constitucional alemã neste campo[16]: (i) na Alemanha, é absolutamente natural a distinção entre restrições e privação da liberdade, por tal distinção ser traçada directamente no artigo 104.º da Lei Fundamental; (ii) na Alemanha, são diferentes não só os nomes, mas também os elementos caracterizadores e o regime aplicável a cada uma das figuras, sem prejuízo de a restrição da liberdade (de que se ocupa o artigo 104.º, n.º 1) se apresentar como a situação geral e as privações da liberdade como casos especiais (Sonderfälle) de restrição da liberdade[17]; (iii) segundo a jurisprudência do Tribunal Constitucional, existe restrição da liberdade quando alguém, por vontade do poder público, é impedido de aceder ou de permanecer num local que é (de facto ou juridicamente) acessível; (iv) por sua vez, a privação da liberdade, sendo a forma mais severa de afectação da liberdade física, existe quando a liberdade de movimento da pessoa é suprimida em todas as direcções, limitando a pessoa a um espaço confinado; todavia, uma vez que é fluída a fronteira entre a restrição da liberdade e a privação da liberdade, devem ainda ser consideradas nesta última a intensidade, a duração da afectação e eventualmente outras circunstâncias; (v) quanto ao regime, ao passo que as restrições da liberdade, além dos limites gerais aplicáveis, estão sujeitas a uma reserva de lei formal (segundo o artigo 104.º, n.º 1), as privações de liberdade estão ainda sujeitas a uma reserva de juiz, a quem compete decidir sobre a admissibilidade e sobre a continuação de uma privação da liberdade (segundo o artigo 104.º, n.º 2).

À luz de um texto constitucional que se refere apenas à “privação total ou parcial da liberdade”, como se devem entender as coisas? Corresponderá, como pretende alguma doutrina[18], o conceito de privação total da liberdade ao conceito alemão de Freiheitsentziehung e o conceito de privação parcial da liberdade ao conceito alemão de Freiheitsbeschränkung? Uma vez que nunca foi claro o alcance da ideia de privação parcial da liberdade (introduzida na revisão constitucional de 1982), não deveriam investigar-se melhor os exemplos fornecidos pela doutrina de referência? Deverá admitir-se sem reservas a vigência de um princípio de tipicidade das privações totais ou parciais da liberdade?[19]

Eis algumas das perguntas a que não temos de responder nesta sede, por lidarem com problemas ainda não devidamente resolvidos e por requererem aprofundamentos para os quais não dispomos nem da especialização, nem dos dados, nem do tempo.

Tal não inibe uma outra conclusão: independentemente do estrito respeito pelos limites definidos no artigo 27.º, n.os 2 e 3, o direito à liberdade, tal como o direito à segurança, são passíveis de restrições nos termos gerais, estando sujeitas ao correspondente regime.

3. Sem pretender discutir agora o critério de distinção entre princípios e regras[20], uma terceira nota incide sobre a natureza das normas constitucionais em apreciação, na medida em que é por demais evidente que tanto o direito à liberdade como o direito à segurança consagrados no artigo 27.º, n.º 1, mesmo adoptando os critérios de Jorge Reis Novais, estão aí enunciados numa norma princípio, e não numa norma regra.

Na verdade, o artigo 27.º n.º 1, não se afasta nem se podia afastar, nesse aspecto, do artigo 24.º, n.º 1 (que garante o direito à vida), do artigo 25.º, n.º 1 (que garante o direito à integridade pessoal) ou do artigo 26.º, n.º 1 (que, entre outros, garante do direito ao desenvolvimento da personalidade). Mais: o artigo 27.º, n.º 1, está para cada um desses direitos enunciados em princípios, como o artigo 27.º, n.os 2 e 3, está para os artigos 24.º, n.º 2, ou 25.º, n.º 2, cuja natureza de normas-regra não é objecto de discussão.

Mas cremos que, ao admitir “excepcionalmente o confinamento de doentes em risco iminente e actual de contaminação de outras pessoas, em atenção ao colidente dever estatal de protecção da saúde de outras pessoas”, Jorge Reis Novais está na realidade a reconhecer a natureza de princípio da norma do artigo 27.º, n.º 1, à qual faltará por isso mesmo “o carácter de garantia absoluta, definitiva”[21].

Assim, mesmo sem recorrer à doutrina da reserva geral imanente de ponderação a que, segundo Jorge Reis Novais, estão sujeitos os direitos fundamentais[22], a derrotabilidade ou restringibilidade[23] da norma do artigo 27.º, n.º 1, é irrecusável[24].

4. Importa, finalmente, esclarecer se, numa situação de estado de emergência, os direitos, liberdades e garantias apenas são passíveis de suspensão[25] ou, se pelo contrário, podem igualmente ser objecto de outro tipo de afectações[26].

A resposta aqui é clara: num cenário de estado de emergência, nem está excluída a atendibilidade de restrições previamente definidas em lei, nem está excluída a possibilidade de introduzir legislativamente (novas) restrições aos direitos, liberdades e garantias, “paralelas à suspensão propriamente dita”[27], nem está excluída a possibilidade de a própria suspensão implicar ou envolver a restrição de certos direitos, liberdades e garantias[28].

Todas essas hipóteses (e outras ainda)[29] de afectação dos direitos, liberdades e garantias são absolutamente naturais num quadro de estado de necessidade constitucional, por tal ser directamente ditado pela gravidade, natureza e excepcionalidade das circunstâncias do caso, como é fácil de demonstrar na nossa actual situação: (i) exemplos de restrições previamente definidas por lei podem ver-se nos artigos 6.º, n.º 4, 22.º, n.os 2 e 3, 24.º e 26.º da Lei de Bases da Protecção Civil, no artigo 17.º da Lei do Sistema de Vigilância em Saúde Pública e nas bases 34, n.os 2 e 3, e 35 da nova Lei de Bases da Saúde; (ii) exemplos de restrições definidas de forma inovadora ainda antes da decretação do estado de emergência (e posteriormente ratificadas) podem ver-se nos artigos 9.º a 12.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março; (iii) exemplo de restrição “paralela à suspensão” definida no seguimento da decretação do estado de emergência pode ver-se no artigo 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março; (iv) restrições implicadas na suspensão de direitos[30] estão presentes em múltiplas disposições do decreto n.º 2-A/2020, de 20 de Março[31], bem como numa multiplicidade de actos legislativos e regulamentares entretanto editados[32].

Por tudo isso, no nosso ordenamento, não só são plenamente válidas e eficazes as restrições decretadas por lei para a generalidade dos direitos, liberdades e garantias, como, relativamente ao direito à liberdade, são plenamente válidas e eficazes as restrições (periféricas ou marginais) ao direito à liberdade que, não se traduzindo em situações de “privação da liberdade” e respeitando os parâmetros da proporcionalidade, se revelem fundamentadas: (1) na necessidade de salvaguardar outros bens e interesses constitucionais, (2) no cumprimento dos deveres estatais de protecção do direito à vida e do direito à saúde das outras pessoas e (3) ainda nas exigências decorrentes do dever fundamental de defender e promover a saúde[33] (na forma como esse dever fundamental se encontra expressamente configurado por lei).

A restringibilidade do direito à liberdade, fora das hipóteses de privação da liberdade, não parece ser questionável, a menos que ingenuamente se pretendesse ver no artigo 27.º, n.os 2 e 3, um lapidar paralelo da norma do artigo 18.º, n.º 2, na parte em que pretendeu proibir as restrições aos direitos, liberdades e garantias não expressamente previstas na Constituição; ora, a demonstração do carácter ilusório e supérfluo dessa regra do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição foi feita, com suficiente profundidade pela nossa melhor doutrina[34], que concluiu tratar-se de uma norma de objecto juridicamente impossível[35]. Mas questionar a restringibilidade do direito à liberdade, fora das mesmas hipóteses, revela-se ainda mais surpreendente para quem defenda a tese de que os direitos fundamentais estão condicionados por uma reserva geral imanente de ponderação, ou seja, pelo facto de estarem sujeitos a uma reserva de “compatibilização com todos os bens que mereçam, em Estado de Direito, protecção jurídica”[36].

No final, num contexto de calamidade pública, afigura-se-nos altamente problemática à partida a eventualidade da suspensão tanto do direito à liberdade (do artigo 27.º, n.º 1) como de qualquer uma das garantias do artigo 27.º, n.os 2 e 3, razão pela qual nem do ponto de vista da oportunidade política veríamos razão alguma para criticar a omissão do direito à liberdade na declaração do estado de emergência em Portugal.

NOTA: por opção do autor, este artigo foi escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico.


[1] Jorge Reis Novais, «Estado de emergência – Quatro notas jurídico-constitucionais sobre o decreto presidencial», in Observatório Almedina, 19 de Março de 2020, disponível online.

[2] Notas que, na teorização do autor, definem a natureza de uma norma-regra (cfr. Jorge Reis Novais, As restrições aos direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição, Coimbra, 2003, pp. 322 ss.; Id., Direitos Sociais – Teoria jurídica dos direitos sociais enquanto direitos fundamentais, Coimbra, 2010, p. 270; Id., Direitos fundamentais e justiça constitucional em Estado de Direito democrático, Coimbra, 2012, pp. 88, 90-91, nota 103).

[3] Manuel Lucena, O estado da revolução – A Constituição de 1976, Lisboa, 1978, p. 646.

[4] Com estas palavras, cfr. José de Melo Alexandrino, A estruturação do sistema de direitos, liberdades e garantias na Constituição portuguesa, vol. II – A construção dogmática, Coimbra, 2006, pp. 646-647.

[5] Com os devidos apontamentos sobre todo esse longo processo de acomodação político-constitucional à realidade processual penal, neste domínio, cfr. José de Melo Alexandrino, A estruturação do sistema direitos, liberdades e garantias na Constituição portuguesa, vol. I – Raízes e contexto, Coimbra, 2006, pp. pp. 646 ss., 665, 674, 689, 717 ss., 720, 739.

[6] Miguel Galvão Teles, «Inconstitucionalidade Pretérita», in Jorge Miranda (org.), Nos Dez Anos da Constituição, Lisboa, 1987, p. 336, nota 79.

[7] José de Melo Alexandrino, A estruturação do sistema…, vol. I, cit., p. 716, nota 1201.

[8] Foi com essa lógica que chegou a ser apresentado o projecto de revisão constitucional n.º 1/XIV, de 4 de Março de 2020, entretanto retirado, em que se propunha a introdução de uma nova alínea i), no artigo 27.º, n.º 3, a prever o internamento compulsório, em caso de iminente ameaça à saúde pública.

[9] José Lobo Moutinho, «Artigo 27.º», in Jorge Miranda / Rui Medeiros, Constituição da República Anotada, vol. I, 2.ª ed., Lisboa, 2017, p. 464.

[10] Neste sentido, vejam-se os dois importantes Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 403/2015 e 464/2019 (cfr. www.tribunalconstitucional.pt).

[11] Acórdão n.º 464/2019 (cfr. www.tribunalconstitucional.pt).

[12] Colhendo as formulações de diversos autores, vejam-se neste sentido os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 479/94, 663/98, 471/2001, 144/2006, 71/2010, 181/2010, 54/2012 ou 463/2016.

[13] Sobre o conceito de limite, aplicado à dogmática dos direitos fundamentais, com outras indicações, José Melo Alexandrino, Direitos Fundamentais – Introdução geral, 2.ª ed., Cascais, 2011, pp. 121 ss.

[14] Cfr. Diário da República, n.º 195/1994, Série I-A, de 24 de Agosto de 1994, p. 4931.

[15] Sobre alguns dos problemas ainda não completamente resolvidos, na “recompreensão” das fórmulas constitucionais portuguesas, José Lobo Moutinho, «Artigo 27.º», cit., pp. 465-466.

[16] Para um ponto de partida, cfr. Christoph Gusy, «Freiheitsentziehung und Grundgesetz», in Neue juristische Wochenschrift, 45 (8), 1992, pp. 457-463 (também disponível online).

[17] Michael Sachs, Verfassungsrecht II – Grundrechte, Berlin / Heidelberg /New York, 2000, p. 216, número marginal 125.

[18] Lendo dessa maneira o Acórdão n.º 479/94, cfr. José Lobo Moutinho, «Artigo 27.º», cit., pp. 466-467.

[19] Respondendo negativamente, José Lobo Moutinho admite a interpretação segundo a qual “a Constituição não terá querido estabelecer uma enumeração taxativa senão das medidas coativas que impõem uma privação total da liberdade” (cfr. «Artigo 27.º», cit., p. 469).

[20] Na doutrina portuguesa, o esforço de distinção talvez mais assinalável de todos seja o que foi empreendido por Pedro Moniz Lopes (cfr. The Syntax of Principles: Genericity as Logical Distinction between Rules and Principles», in Ratio Juris, vol. 30, n.º 4, December 2017, pp. 471-490; Id., Derrotabilidade normativa e normas administrativas – o enquadramento das normas regulamentares na teoria dos conflitos normativos, Parte I – O enquadramento da norma e a derrotabilidade normativa, Lisboa, 2019, pp. 157-198), autor para o qual o critério de distinção reside na genericidade dos princípios (que se traduz numa indiferenciação das condições da previsão, no sentido de que os princípios se aplicam a acções não especificadas); para uma não menos estimulante justificação da recusa da distinção entre regras e princípios, Rúben Ramião, «Sobre a Teoria dos Princípios Jurídicos», in Estudos sobre o Direito: Princípios Jurídicos e Proporcionalidade, Lisboa, 2019, pp. 11-79; num caso como outro, trata-se de autores que contestam a fórmula de Ronald Dworkin (em que Jorge Reis Novais essencialmente se apoia).

Como mínimo denominador comum (entre esses três distintos autores portugueses), podemos talvez dizer que, apesar da interminável disputa, a distinção entre princípios e regras parece residir na difusa percepção de que nos princípios há um maior grau de indeterminação (do conteúdo) da norma do que nas regras, levando a que em grande parte dos casos a aplicação dos princípios não possa de facto escapar à ponderação e a um correspondente (e inevitável) maior subjectivismo por parte do intérprete/aplicador.

[21] Jorge Reis Novais, Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional…, cit., p. 91, nota 103.

[22] Cfr. Jorge Reis Novais, As restrições aos direitos …, cit., pp. 41, 278, 569 ss., 955; Id., Direitos Fundamentais: trunfos contra a maioria, Coimbra, 2006, pp. 49 ss.; Id., Direitos Sociais…, cit., pp. 103 ss.; Id., Direitos fundamentais e justiça constitucional…, cit., pp. 68 ss.

[23] Sobre o fundamento da restringibilidade, no meu modo de ver, José de Melo Alexandrino, A estruturação do sistema…, vol. II, cit., pp. 478-480.

[24] Veja-se, por exemplo, como, no recente Acórdão n.º 134/2020, o Tribunal Constitucional releva a ofensa ao artigo 27.º, n.º 1, por referência aos parâmetros do artigo 18.º, n.º 2, que lhe são aplicáveis como a qualquer outro direito fundamental passível de restrições (cfr. www.tribunalconstitucional.pt).

[25] Sobre o conceito de suspensão e a distinção relativamente ao conceito de restrição, José Melo Alexandrino, Direitos Fundamentais…, cit., pp. 143 ss.

[26] Lembrando que a palavra “afectar” é expressamente utilizada no artigo 19.º, n.º 6, da Constituição a respeito dos direitos fundamentais insusceptíveis de suspensão, tenho definido as afectações como as acções que atingem desfavoravelmente a norma, o objecto, o conteúdo ou outros efeitos de protecção de um direito, liberdade e garantia (cfr. José Melo Alexandrino, Direitos Fundamentais…, cit., p. 113).

[27] José de Melo Alexandrino, A estruturação do sistema…, vol. II, cit., p. 437, nota 1840.

[28] Neste sentido, com explicações suplementares, José Melo Alexandrino, Direitos Fundamentais…, cit., p. 144, nota 450.

[29] Como é manifestamente o caso das intervenções restritivas, ou seja, de actuações agressivas sobre um bem protegido de um direito fundamental, incidentes sobre uma posição jurídica concreta, e que, num contexto de estado de emergência, tanto podem estar fundadas numa restrição legislativa (ou eventualmente em leis harmonizadoras e conformadoras), como na suspensão de direitos, liberdades e garantias (e em toda a série dos correspondentes actos de execução).

[30] A enumeração dos direitos, liberdades e garantias suspensos consta do artigo 4.º do decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de Março.

[31] Este diploma, sem pergaminhos constitucionais claros, foi objecto de posterior rectificação, pela declaração de retificação n.º 11-D/2020, de 20 de Março (cfr. https://dre.pt/web/guest/home/-/dre/130531801/details/maximized?serie=I&day=2020-03-20&date=2020-03-01).

[32] Para uma lista actualizada, cfr. https://dre.pt/legislacao-covid-19-por-data-de-publicacao.

[33] Previsto no artigo 64.º, n.º 1, da Constituição.

[34] Cfr. Jorge Reis Novais, As restrições aos direitos…, cit., pp. 13 ss., 227 ss., 279 ss., 542 ss., 569 ss., 581 ss.; Pedro Moniz Lopes, Derrotabilidade normativa e normas administrativas – o enquadramento das normas regulamentares na teoria dos conflitos normativos, Partes II e III, Lisboa, 2019, pp. 513 ss.

[35] Neste sentido, Jorge Reis Novais, As restrições aos direitos…, cit., pp. 587 ss.; Pedro Moniz Lopes, Derrotabilidade normativa…, Partes II e III, cit., p. 516, nota 942.

[36] Jorge Reis Novais, As restrições aos direitos…, cit., p. 955.