David Falcão
Professor no Instituto Politécnico de Castelo Branco e na Universidade da Beira Interior, Doutor em Direito
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Vários artigos têm sido publicados sobre a pretensa ilicitude da imposição, por parte da entidade patronal, do gozo de férias, durante este período de pandemia.
Pretende-se, nesta breve publicação, desarticular a eventual ilicitude da imposição do gozo de férias, sem nos debruçarmos sobre questões demasiado técnicas.
As férias são marcadas por acordo entre empregador e trabalhador. Na falta de acordo, o empregador marca as férias, ouvindo para o efeito a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa do trabalhador interessado. De realçar que em pequena, média ou grande empresa, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente.
Ora bem, será de admitir que
o empregador imponha o gozo de férias num determinado período?
A resposta é, perentoriamente, afirmativa no caso de microempresas (que
empreguem menos de 10 trabalhadores), uma vez que a Lei não vincula, o
empregador, à marcação de férias durante o período de 1 de maio a 31 de
outubro. Por outro lado, contam-se pelos dedos de uma mão as microempresas que
terão uma comissão de trabalhadores, uma comissão intersindical ou uma comissão
sindical representativa do trabalhador, sendo, portanto, inútil falar-se na
audição destas estruturas para o efeito. Mesmo existindo, o seu parecer deverá
ter-se como meramente indicativo e, naturalmente, não vinculativo, sob pena de
se atropelar a liberdade de gestão e atividade da empresa que decorre da
liberdade de iniciativa económica privada, prevista no artigo 61.º da
Constituição.
No que concerne às pequenas, médias e grandes empresas e, na falta de acordo sobre a marcação do período de férias, como se disse, o parecer das estruturas de representação dos trabalhadores deve ser tido como indicativo e não vinculativo, atendendo aos argumentos expostos. No entanto, no caso destes três tipos de empresa, o empregador depara-se com as amarras do período temporal, durante o qual as férias têm de ser marcadas, 1 de maio a 31 de outubro. Tal período temporal pode ser dispensado em duas situações:
Se o instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho o dispensar, ou previr período distinto;
ou,
Se o parecer dos representantes dos trabalhadores admitir época diferente.
No que diz respeito a esta segunda situação, parece que, tendo em conta o momento terrível que atravessamos, seria extremamente incauto, por parte das estruturas de representação do trabalhador, não admitir o gozo de férias em período distinto.
As empresas estão sufocadas, estão já a ser promovidos despedimentos coletivos, suspensões de contratos de trabalho, e ainda se argumenta que a entidade patronal não pode marcar unilateralmente férias?
É isto defender os interesses do trabalhador?
É preferível que desapareçam os postos de trabalho?
É imperativo que se processe uma inversão de paradigma na visão extremamente conservadora do mercado de trabalho. O empregador não pode ser sempre visto como opressor e o trabalhador como oprimido. Na verdade, as entidades patronais estão, nos dias de hoje, pelas horas da morte, e não me parece que estejam, consequentemente, em condições de oprimir quem quer que seja!