Paulo Ferreira da Cunha

Doutor em Direito pelas Universidade de Paris e Coimbra, agregado (Universidade do Minho), pós-doutor (Universidade de São Paulo) e Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, é Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça.

Consulta a sua obra em www.almedina.net


COVID-19: Estaremos num filme de ficção científica? Não. E não podemos ser espetadores pasmados. Dizia Chesterton: estudar hidráulica enquanto Roma arde.

São obviamente temerários quaisquer prognósticos a propósito do nosso futuro sob o signo da pandemia em curso. Poderá, contudo, avançar-se que mudanças significativas deverão ocorrer na sequência do COVID-19.

As alterações no quotidiano, pelo menos das pessoas conscientes e nos países que se revelam mais previdentes, já fazem antever que não serão só rotinas e modos de sociabilidade a mudar, pelo menos durante um certo tempo – mas sabe-se lá até quando!… Poderá ser mais ou menos alargado o período em que a normalidade se interrompe. Quando será que a “natureza” (e a cultura), retomarão “os seus direitos”?

Urge é pensar como se poderá reinventar a Humanidade neste meio tempo, e se será necessário, depois de passado o perigo, promover mudanças profundas. Certamente que será.

Há, assim, que aproveitar a quarentena. Sugerimos 17 Lições.

  1. Travar a Loucura Global

Do mesmo modo que uma pena de prisão não deveria ser apenas uma excomunhão (porque ex-comunicação) do mundo social, mas um tempo dado ao recluso para repensar a sua vida e (re)tomar um reto caminho (com vista à sua ressocialização), agora também a Humanidade confinada, acantonada, tem uma oportunidade de, sem entrar em pânico, sem se afundar na angústia depressiva, avaliar o rumo de destruição, desperdício, desgaste, futilidade, em que estava aturdida. Não vejamos o vírus como castigo para os erros, mas oportunidade para os emendar. Porque para além deste vírus, muitos outros males podem advir do prometeísmo humano levado ao extremo no último século.

Tem havido uma loucura global, que beira o suicídio coletivo. Os ares menos poluídos na China durante esta crise são um anúncio do que se poderia aproveitar com a crise sanitária atual. É preciso saber fazer limonada com os limões, mesmo se azedos. É um slogan banal de autoajuda, sim. Mas, neste caso, tem sabedoria.

[1] Reconhecer-se-á, naturalmente, a intertextualidade com a obra-prima de Gustavo Corção, Lições de Abismo, que não resistimos a “citar”. Tivemos, confessamos, algumas dúvidas sobre se nos deveríamos pronunciar sobre esta crise. Contudo, em situações de grave emergência como esta, e não estando em causa nenhuma questão sectária, mas desafio global que a todos sem exceção interpela, cremos que o cuidado e o conforto do recato (“Frescura da Sombra”, lhe chamámos num artigo em “As Artes entre as Letras”, ainda a crise pandémica não tinha deflagrado entre nós) podem, em certos casos, ceder ante o dever que cada um tem de se manifestar, pelo interesse público, se tiver algo a dizer. Fazendo-o, segundo cada caso, isso sim, com o cuidado e a contenção que sejam requeridas, pela sua circunstância pessoal e ainda pela situação geral. Este artigo desenvolve do artigo que sairá normalmente no referido periódico, a seu tempo, e outro, dele também tributário, que surgirá na revista Convenit Internacional. Agradecemos aos respetivos diretores. Tem também ecos do último capítulo do nosso livro Filosofia do Direito e do Estado, Coimbra, Almedina, que se encontra no prelo.

2.Repensar a Civilização, com valores

É um tempo em que se deve aproveitar para repensar a nossa socialização e a nossa ação no Planeta. E não é apenas a predação sem freio de recursos, a poluição, e outros grandes erros ambientais e afins. É a cosmovisão de pressa, de lucro, de sofreguidão, de acumulação, de materialismo. Do querer subir e acumular a todo o custo, calcando, traindo, desprezando tudo e todos. Numa indiferença que nos torna Zombies construindo uma distopia, reino sinistro sem valores (tentamos explicar no nosso recente livro Crimes & Penas como não é escandaloso moralismo querer uma sociedade com opções e com valores, e não um abstencionismo de “salve-se-quem-puder”).

Predação, desenvolvimentismo, sugar das pessoas até, algumas vezes, à morte por exaustão em único ou pluriemprego, permitir e fomentar as piores injustiças e depois induzir a uma consciência de Pilatos, lavando as mãos do que ocorre, fomentando o individualismo e uma ética de ceticismo do “vive e deixa morrer” tudo isso tem-nos levado a um plano inclinado de amoralismo potencialmente criminoso. É um modelo (não apenas de desenvolvimento) negativo, e uma cosmovisão e um plano de vida desumano.

3. Voltar aos afetos, ainda que longe

 É o desperdício dos afetos necessariamente consumidos com a crónica pressa, com a inevitável falta de tempo. Seria irónico, mas elucidativo (e espera-se que exemplar), que agora, à distância, por telefone, Skype, WhatsApp, acabássemos por contactar mais, estar mais, com os nossos amigos, familiares, todo aqueles a quem esquecemos quase… e a quem, contudo, queremos.

4. Reconhecer a Igualdade entre as Pessoas

No mínimo (mas há muito mais a pensar e a fazer), a situação de perigo (em muitos casos infelizmente concretizado) perante um flagelo, que a todos sem distinção atinge, certamente poderá alertar algumas consciências, fazendo compreender a importância da humildade e da solidariedade. O salve-se-quem-puder da ideologia da ganância, do triunfo a todo o preço, dividindo o mundo entre os winners e os losers, não funciona mesmo quando a doença não escolhe ricos ou pobres. E todos os nacionalismos, xenofobias, segregacionismos de género, racismos e afins são obviamente surpreendidos e derrubados por uma praga que atinge todos os seres humanos, sem desinências ou distinções.

5. Defender o Estado Social

Grande lição é a da necessidade social imperiosa de o Estado ter um papel decisivo na Saúde e noutros domínios de segurança básica e de sobrevivência dos cidadãos. O Estado não pode ser demissionário. Tem de ser um Estado Constitucional. Ora, como diria Peter Häberle, deve tratar-se de um Estado de direito, democrático, social, de cultura. E acrescentamos (embora esteja, cremos, implícito nesta teorização): Estado ecológico, civilizacionalmente avançado, ativo, dialogante, participado, pluralista.  É pedir muito? É pedir o que é necessário. E, agora, imprescindível. Vital.

6. Defender a Constituição

É, aliás, o que está muito na letra (e também no espírito) da nossa Constituição, que não se vislumbra como devesse (e sequer pudesse) ser revista agora.

À conta desta ou daquela adaptação de pormenor (com a melhor das boas vontades e em prol de qualquer legalismo ou preciosismo jurídico), que se poderá ultrapassar por interpretação (à luz do sentido de responsabilidade  e com razoabilidade), poderia sempre abrir-se a porta, com as ideias revisionistas, ao renascer de velhas aspirações que não pretenderam nunca melhorar esta Constituição, mas acabar com ela e com o seu sonho de uma sociedade “mais livre, mais justa e mais fraterna”, como diz o seu Preâmbulo.

Hoje, mais do que nunca, é preciso defender a Constituição. Não é a frente de batalha mais urgente, claro. Mas é um escudo protetor da retaguarda de que não poderemos prescindir. Quando passar o perigo, poderemos retocá-la, mas para a melhorar. Sempre com escrupuloso respeito pelos limites que ela própria impõe para uma tal revisão. Todos os limites.

7. Preservar a Autoridade Democrática

Voltemos ao Estado. Não se tenham, porém, ilusões sobre a capacidade de resposta de tal Estado, de que falámos. Tem de estar dotado de autoridade democrática, mecanismos de decisão e de poder, e na posse de meios essenciais de ação, desde logo de gestão, propriedade e liquidez.

Reforcemos um dos elementos da delimitação do quid pelo famoso constitucionalista alemão, já referido: estamos a falar de um Estado social. Ou seja, um Estado que não abandona os cidadãos à sua sorte.

8. Ser Solidário a todos os níveis

Perante esta catástrofe coletiva, o discurso individualista, egoísta, elitista encontra uma sua cabal e trágica refutação. Os países não suficientemente equipados de estruturas sociais sanitárias vão, infelizmente, dramaticamente, sofrer muito mais. Em contraponto, veja-se, neste momento, o que está a ocorrer com os números de mortos na Alemanha (bem protegida e que injetou milhões no ataque a esta crise sanitária) em comparação mesmo com países do sul da Europa que desinvestiram nos últimos anos na Saúde (não se necessitando sequer de comparações com países de fraquíssimo escudo sanitário “por tradição”).

 A menos que se encontrem formas criativas e seguras de luta nesses países abandonados por Estados demissionários, a menos que se gerem, nomeadamente, correntes de solidariedade privadas de grandes mecenas (oxalá!), a falta de meios, muitas vezes aliada à falta de sensibilização popular para os perigos, parece ser uma combinação explosiva.

Há, contudo, uma esperança na capacidade de auto superação dessas sociedades, habituadas a inventar para sobreviver. Mas a solidariedade internacional pode e deve manifestar-se. Um dos perigos atuais é o do isolacionismo nacionalista, cuidando alguns que tudo se resolve com a panaceia do “fechar fronteiras”, cercar populações de cordões sanitários, etc. Algumas medidas podem ser ou vir a ser necessárias, e até imprescindíveis. Contudo, o abraço global, ainda que virtual, é possível e é necessário. Ainda que possa parecer a alguns que não estamos todos no mesmo barco, a verdade é que estamos.

9. Apoiar os mais Fracos

A complexidade e magnitude desta ameaça mostra à evidência mais gritante que há setores básicos que precisam de ter uma forte, coerente, robusta, coordenada e financiada resposta pública. Evidentemente que se espera que os privados, se e quando chamados a entrar mais ativamente na luta, respondam sem hesitações.

Negar a necessidade do Público (não, evidentemente, como dédalo coletivista, antes como expressão organizada da Solidariedade), designadamente em nome de teorias abstratas de “liberdade” (realmente libertina) de mercados (liberdade que apenas a muito poucos aproveitou e já muitos levou à miséria – não se discutindo, porém, se “regulada”, porque essa é benéfica), é no mínimo uma falácia, que fica demasiado à evidência em tempos de generalizada vulnerabilidade, e especialmente dos mais débeis em todos os sentidos. Dos quais todos precisamos. Recordamos sempre o Preâmbulo da Constituição suíça: “sabendo que só é livre quem usa da sua liberdade e que a força de uma comunidade se avalia pelo bem-estar do mais fraco dos seus membros…”. Sublinhamos. É do que hoje se trata: como vamos poder dar a mão e uma palavra de conforto e carinho aos mais fracos entre nós. Sobretudo aos mais idosos, aos mais doentes, aos mais pobres.

10. Entender a Liberdade e a Segurança

Coloca-se ainda com muita acuidade a questão, clássica mas com novos contornos, do ponderar, de forma concreta e não teórica apenas, entre liberdade e segurança. Mas obviamente que, em tempos de especial emergência, a liberdade mais “superficial”, e designadamente lúdica ou do capricho, tem de ser ordenada ao bem comum: salus populi suprema lex est.

Foi chocante ver jovens em festas temáticas pretensamente desafiando o vírus, como é chocante (mas por outras razões) ver que há quem tenha feito manifestações de rua contra ele, ou (por outras razões ainda) grupos de pacatos anciãos velhinhos a jogar as cartas ou o dominó no seu soalheiro jardim de sempre.  Nenhum destes casos pode repetir-se nesta fase de guerra.

Porque uma pandemia, qualquer catástrofe natural alargada (terramoto, erupção vulcânica, etc.) é muito equiparável à guerra. É certamente pior. Aqui o inimigo é invisível, reproduz-se sem cessar, somos seus aliados involuntários… E por isso não se nos afigura haver qualquer problema em, mutatis mutandis (sublinhe-se o mutatis mutandis), aplicar com razoabilidade, bom senso, normas pensadas para uma à outra, se acaso inexistirem para o caso vertente. Mas irão existir muitas medidas concretas. Mais preocupante é se se conseguirão aplicar, e como.

11. Reaprender o Essencial e o Bom Senso

 Uma das coisas que as situações de calamidade devem propiciar é uma redescoberta do que é elementar, do simples, do vital. Ora, de entre estas coisas, avulta o bom senso. É verdade que crises deste género podem levar (oxalá não) a loucuras coletivas, como corridas a hipermercados, e outras manifestações de medo. Mas também são oportunidade para não complicar a vida, para depurar a existência, para abrandar o ritmo (muito, no caso, para alguns). Isto, também, ao nível intelectual e, naturalmente, também jurídico.

Perante a ingência do mal que temos pela frente, modismos, esquisitices, lateralismos, suscetibilidades, deveriam dar lugar a uma união pela sobrevivência. A um parêntesis no superficial e no supérfluo. E não é apenas a concórdia entre partidos ou clubes de futebol, ou a oração ecuménica entre crenças. Está em causa obter a paz social mais profunda entre grupos e ideias que se guerreiam (por vezes por questões tão mesquinhas, que lembram as ficcionadas nas Viagens de Gulliver sobre os ovos). É, enfim, a necessidade de se entender que não existe, como alguns encarniçadamente vêm insistindo, apenas, nem fundamentalmente, este e aquele grupo (dito hoje “identitário”, por vezes) mas, antes de mais, a Sociedade e a Humanidade. Há sociedades e uma Humanidade. E há coisas válidas para todos, apesar de todos termos diferenças.

Depende da salvação geral a salvação deste e daquele grupo, desta e daquela pessoa em concreto. Oxalá esta lição pudesse ser rapidamente compreendida. Será que o egoísmo, mesmo o egoísmo grupal, seria capaz de falhar à obrigatória solidariedade numa hora como a presente? Queremos crer que não, que a “lei natural” da consciência continua gravada nos corações humanos, de todos e de cada um.

Voltando ao Direito. Tem é que se acautelar (como fazem várias Constituições, e desde logo a nossa) um círculo essencial de direitos, mesmo em caso de ser decretado algum dos estados de exceção. No caso português, tal está a ser cuidado, desde que se decretou o estado de emergência.

Nesta, como em muito mais matérias, a grande questão é de ponderar o bom senso e a capacidade de rasgo imaginativo e de decisão (isso distingue os estadistas dos políticos tout court), com um amor genuíno à liberdade, direitos e bem-estar do Povo. E, no limite, à sobrevivência geral, que não se confunde com uma estrita Arca de Noé, como no filme 2012 (Roland Emmerich, EUA, 2009).

12. Aproveitar bem o Tempo

Socialmente, avulta a oportunidade de que as quarentenas talvez possam propiciar a alguns mais tempo, para si e para as famílias. Oxalá o aproveitemos bem.

Felizmente, a Internet, por exemplo, dá mil e uma sugestões para se passar bem o tempo. Cursos online são oferecidos gratuitamente. A música existe a rodos. Há milhares e milhares de livros para baixar também de graça. Pode-se meditar, fazer ginástica, dançar, jogar um sem número de jogos. Pode-se aprender línguas, a tocar instrumentos. Ou simplesmente estudar, aprender… Ninguém pode alegar que está sem nada que fazer, aborrecido.

13. Esconjurar os monstros

Além dos demónios da depressão (o célebre “demónio do meio dia”, de Andrew Solomon), há outros monstros e demónios que podem agigantar-se. Questão a ponderar é até que ponto a pandemia e as fake news associadas e crescentes não poderão contribuir para o agigantar de fantasmas e o renascer de monstros ou demónios.

Já em 2013 Jean-Claude Juncker dizia que estes apenas se encontravam adormecidos. Desde então, o seu sono está menos profundo. Uma situação de grave crise multidimensional será certamente um fator catalisador de tentações anticonstitucionais.

Vetor do florescimento desta perversão do sistema será o deficit de educação política, cívica e mesmo cultural geral, de que as democracias em grande medida se foram demitindo pela prevalência do economicismo e do eleitoralismo. Deve aqui notar-se a grande moderação e bom senso do Povo Português, que em geral não tem embarcado nessas tentações, nem dado ouvidos a essas sereias.

Acresce a degradação das condições sociais e económicas de grandes camadas da população, as quais, em algumas latitudes, perderam a fé e a esperança em movimentos reformistas inseridos no sistema, podendo lançar-se nos braços do oportunismo demagógico. Nem sequer se apercebendo, frequentissimamente, da sua natureza ideológica. Agindo, assim, muitas vezes, como mero protesto contra a sua situação de vida degradada, quando não mesmo degradante. E culpando a torto e a direito, com ou sem razão, todas as instituições. Já não poupando nenhuma, embora com predileção por algumas na crítica, por vezes injustíssima, em termos globais. Nada escapando a uma crítica tão demolidora quão desesperada, de que as redes sociais, desde logo, se vão fazendo um agigantado eco.

Aliás, com o teletrabalho e o isolamento, será muito importante ir vendo o que por essas redes se diz, e a avalanche de boatos, notícias falsas, alarmismos e destilar de ódios e frustrações. Tem de haver formas alternativas de usar esses meios, para dar alento, para animar as pessoas, que já a eles vivem algumas como que “grudadas”.

A dúvida subsiste, em casos de sociedades que já fizeram opções (majoritárias) pela demagogia: até que ponto a crise que vão duramente enfrentar revelará a incapacidade do populismo lidar com a realidade, e pior ainda, com uma realidade deste jaez? Será a pandemia uma oportunidade para “caírem na real”? Ou novos populistas poderão apear os anteriores, numa espiral sem fim.

14. Fazer o seu Dever, e um Pouco Mais

Entretanto, em todos os países, há um remédio social fundamental e inesgotável para a situação: cada um faça o seu dever, cada um fique no seu posto. Cada um procure, com a especial prudência que esta situação requer, ajudar o próximo (que agora deve estar a uns metros, no contacto social).

Quando cada um faz o que deve, talvez um pouco mais do que deve, agiganta-se a solidariedade geral e cria-se um fenómeno social de dinâmica positiva.

15. Não Facilitar, Inventar

Não se pode, em nenhum setor, entrar pela via do facilitismo, do laxismo. O facto de estarmos em pandemia deve exortar-nos a fazer melhor e a dar mais de nós. Não foram decretadas férias.

Vemos com apreensão a possibilidade de se instalar em algumas áreas (não imediatamente visíveis, e de consequências mais a médio e longo prazo) uma cultura de distensão, de descontração e de adiamento sistemático. É necessário trabalhar, e muito. E ser capaz de reinventar o que se faz. Muitas condições vão mudar. Se não se consegue escoar o leite produzido, não se vai deitar fora: faça-se queijo, faça-se iogurte… Ofereça-se.

A capacidade de reinventar a atividade de cada um, das empresas, dos próprios países (os países de turismo, como o nosso, têm de encontrar, pelo menos temporariamente, alternativas sólidas) fará a diferença.

Não podemos ser países, empresas, famílias à espera dos subsídios do Estado. Estado social não quer dizer Estado que nos exima da responsabilidade pela própria vida, que nos transforme em súbditos dependentes. É uma grande rede, uma grande proteção, mas não pode nem tem condições para ser a ama-seca de quem não faça pela vida. Vai ser complicado, mas é preciso inteligência, criatividade, não conformismo. A adversidade aguça o engenho, já dizia Camões.

16. Ser Grato e Apoiar (a)os da Linha da Frente

Na frente de combate estão os profissionais da saúde, os bombeiros, os polícias, os militares… Mas também os políticos, gestores, decisores (que toda a máquina devem coordenar), e todos os que mantêm a Administração Pública e a Justiça a funcionar.

E não nos esqueçamos dos trabalhadores em geral, que, nos seus postos de trabalho ou em casa, alimentam as sociedades, as fazem subsistir vivas.

Professores e Estudantes continuam as aulas, editores continuam a publicar e autores a escrever, artistas não esmorecem, cientistas não param. Podemos fazer compras online (embora com entregas por vezes demoradas – preparemo-nos), e não estamos à mercê do crime. A todos, naturalmente, mas antes de mais aos primeiros, se deve tributo pela sua dedicação e tenacidade heroicas. E o apoio de que necessitem. Antes de mais, o cumprir as instruções sanitárias, e não atrapalhar. E a vida continua. Continuará.

17. Pensar-se e Agir

Um tempo como este, em que tudo e todos podemos perder, num ápice, é momento de pensar a nossa condição humana e a nossa história individual. Pensar o que andamos aqui a fazer, o que fizemos, o que podemos e queremos ainda fazer. É tempo de balanço, planos e ações. Descer ao fundo de nós, vermo-nos ao espelho da alma e da consciência. Muitos de nós temos andado na correria, muito esquecidos de nós próprios e dos nossos sonhos.

É tempo de interioridade, não apenas de interior. É tempo de meditar e de agir segundo o que achamos ser a nossa vocação, o nosso dever, a nossa missão. Não há ninguém que a não tenha. A História dirá se fomos capazes de aproveitar o Vírus para melhorar.

Espera, Esperança (aguarela e caneta ), Paulo Ferreira da Cunha

Porto, 21 de março de 2020, chegada da Primavera.