Ana Sirage Coimbra

Mestre em Direito Judiciário e em Administração Pública pela Universidade do Minho.
Jurista em funções públicas desde 2001.
Investigadora no Centro de Investigação em Justiça e Governação (JusGov) da Escola de Direito da Universidade do Minho.
Formadora nas áreas do Direito das Contraordenações, Direito Administrativo e/ou Procedimento Administrativo e Legislação da Proteção de Dados Pessoais.


Simplex Ambiental Abreviado – Notas ao Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro é mais recente obra de sua autoria. Obra publicada pelo Grupo Almedina e disponível no mercado desde 06 de Julho de 2023.

Consulte a obra neste link.


O Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, procede à reforma e simplificação dos licenciamentos ambientais, e entrou em vigor no dia 11 de fevereiro de 2023[1]. No seu preâmbulo por ler-se, nomeadamente que: “[…] do exercício de simplificação que agora se efetua não decorre uma diminuição dos standards de proteção ambiental ou qualquer agravamento de risco para o ambiente. Pretende-se, isso sim, que a atividade da Administração Pública na área do ambiente fique mais concentrada na efetiva proteção das atividades com risco para o ambiente e na sua fiscalização e que, além disso, a exigência de licenças, autorizações e outros procedimentos administrativos não seja ela própria um obstáculo à adoção de comportamentos ambientalmente mais favoráveis”. Segundo Figueiredo Dias (2014: 895-896)[2], “uma alternativa ágil e relativamente eficaz que tem vindo a ser experimentada em relação a diversas atividades e instalações e tem também alguma aceitação na arena ambiental, apesar dos perigos potenciais que pode representar, é a da substituição de alguns controlos autorizativos por deveres de informação ou de comunicação – mais ou menos formalizada – à Administração do início de uma atividade, ficando esta com o poder de a proibir ou condicionar num determinado prazo. Esta substituição tem tido uma particular ressonância no direito alemão, com a subordinação de diversas atividades a Anmeldung ou a Anzeige e no direito italiano onde, desde 1990, se prevê no art. 19.º da Lei n.º 241/1990 a possibilidade substituir uma série de atividades sujeitas a actos autorizativos por uma simples denúncia de início de atividade, ficando a Administração competente com o ónus de averiguar oficiosamente a verificação dos pressupostos e requisitos legalmente exigidos e determinar, se for o caso, a proibição de prossecução da actividade – isto é, em vez de exercer o tradicional poder preventivo permissivo, a Administração passa a exercer um função de controlo sucessivo, no qual não lhe compete fazer qualquer ponderação discricionária”.

A Convenção da Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas (CEE/ONU) sobre Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente (usualmente intitulada Convenção de Aarhus[3]) foi assinada por Portugal em 1998 e ratificada através do Decreto do Presidente da República n.º 9/2003, de 25 de fevereiro, tendo sido aprovada, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 11 /2003, de 25 de fevereiro. A Convenção de Aarhus [4] é aplicada em Portugal na sequência da transposição de várias Diretivas da União Europeia, designadamente a Diretiva 2003/4/CE, que visa o acesso do público às informações sobre ambiente, e foi transposta para o direito nacional através da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto (que aprova o regime de acesso à informação administrativa e ambiental e de reutilização dos documentos administrativos, doravante LADA), com as alterações introduzidas pela Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto[5], Lei n.º 33/2020, de 12 de agosto[6] e mais recentemente pela Lei n.º 68/2021, de 26 de agosto[7]. A LADA entrou em vigor a 1 de outubro de 2016, e veio revogar a Lei nº 19/2006, de 12 de junho [lei que regulava o acesso à informação sobre ambiente (antes conhecida como LAIA), e a Lei nº 46/2007, de 24 de agosto, (lei que regulava o acesso aos documentos administrativos e a sua reutilização, também abreviadamente designada LADA), unificando-as num único diploma[8]. A Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (doravante CADA), é uma entidade administrativa independente que funciona junto da Assembleia da República, e a quem compete zelar pelo cumprimento das disposições da LADA. Em matéria de acesso a informação ambiental, esta entidade tem vindo a “reiterar que os fundamentos de indeferimento de acesso a documentação ambiental, incluindo a de ações ou omissões que respeitem à floresta, à água, ao Planeta Terra, devem ser interpretados restritivamente, face ao interesse público subjacente ao conhecimento e divulgação da informação”[9]. Neste sentido, ver os Pareceres da CADA n.º 378/2016, de 20/09/2016, Parecer n.º 58/2018, de 20/03/208, Parecer n.º 159/2021, de 09/06/2021 e Parecer n.º 210/2022, de 18/05/2022[10].

Para além do direito à informação ambiental[11] conferido a qualquer cidadão em geral no âmbito da LADA, os processos de participação pública e/ou obrigações de divulgação de informação em matéria ambiental já figuravam em diplomas legais ambientais agora alterados pelo Decreto-Lei n.º 11/2023, de 20 de fevereiro, tais como:

  1. O Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, na redação atual Avaliação de Impacte Ambiental (AIA): no Capítulo III (Fases da AIA), na Secção VII (Acesso à informação e participação pública), ver os artigos 28.º (Princípio geral), artigo 29.º (Consulta pública), artigo 30.º (Divulgação) e artigo 31.º (Modalidades de divulgação).
  2. Decreto-Lei n.º 127/2013, de 30 de agosto, na redação atual − Regime de emissões industriais aplicável à prevenção e ao controlo integrados da poluição, bem como as regras destinadas a evitar e ou reduzir as emissões para o ar, a água e o solo e a produção de resíduos: no Capítulo I (Disposições preliminares), Secção II (Disposições procedimentais comuns), ver os artigos 17.º (Informação prestada por operadores de instalações sujeitas ao regime de prevenção e controlo integrado de poluição) e artigo 18.º (Disponibilização de informação ao público); no Capítulo II (Instalações que desenvolvam as atividades previstas no anexo I), Secção II (Procedimento de licença ambiental), ver o artigo 39.º (Acesso à informação e à justiça e participação do público); no Capítulo IV (Instalações de incineração e coincineração de resíduos), Secção I (Disposições e princípios gerais), ver o artigo 65.º (Acesso à informação); no Capítulo V (Instalações e atividades que utilizam solventes orgânicos), ver o artigo 100.º (Prestação de informação).
  3. Decreto-Lei n.º 142/2008, de 24 de julho, na redação atual – Regime jurídico da conservação da natureza e da biodiversidade: no Capítulo III (Organização da informação sobre o património natural e os valores naturais classificados), ver o artigo 28.º (Sistema de Informação sobre o Património Natural), e o artigo 29.º (Cadastro Nacional dos Valores Naturais Classificados).
  4. Lei n.º 58/2005, de 29 de dezembro, na redação atual – Lei da Água: no Capítulo VIII (Informação e participação do público), ver os artigos 84.º (Princípio da participação), artigo 85.º (Conteúdo da informação), artigo 86.º (Origem da informação), artigo 87.º (Sistema nacional de informação de recursos hídricos), e artigo 88.º (Direito de acesso à informação).

De acordo com Amado Gomes (2018: 235)[12], «a participação constitui a dimensão fundamental, traduzindo um incremento de autonomia do cidadão e de fortalecimento da cidadania ambiental, decorrente da natureza – coletiva, transgeracional e metaestatal – do bem jurídico “ambiente”. Para bem participar é necessário estar informado, como para ter acesso à justiça em defesa do ambiente cumpre conhecer os dados, muitas vezes altamente técnicos, da atividade/produto cuja nocividade se quer iluminar. O acesso à informação é, por isso e simultaneamente, um direito autónomo (ser ambientalmente sensibilizado implica ter acesso à informação para estar ciente dos riscos – direito a saber), e um direito funcional, uma vez que está intrinsecamente ligado à participação em procedimentos de decisão sobre projetos com impacto significativo no ambiente, bem como à eventual contestação judicial das decisões adoptadas».

A propósito da efetividade jurídica da participação pública em matéria ambiental, Dickstein (2019: 125)[13] refere que “determinados instrumentos participativos delegam ao cidadão um poder de decisão (participação co-constitutiva), enquanto outros apresentam uma feição consultiva (participação dialógica). A distinção é relevante, pois permite compreender que a perspetiva da participação efetiva, embora imponha garantias de uma oportunidade adequada à participação cidadã, nem sempre condiciona o resultado final da decisão pública em formação. Assim, uma decisão pública formada a partir do plebiscito ou referendo tem força obrigatória, impondo-se o seu cumprimento. Nestes casos, eventual recalcitrância do poder público na observância da decisão popular é mais facilmente identificável e sanável. Diferentemente, no contexto de instrumentos consultivos, a efetividade da participação ganha complexidade, porquanto, diversos expedientes formais podem encobrir situações de não participação ou, ainda, de mero simbolismo participatório (tokenism). Nestas hipóteses, tem-se nada mais que um simulacro de participação pública, o que justifica uma atenção específica sobre os seus fatores jurídico-operativos de efetividade”.

Ainda que o Governo anuncie que o Simplex Ambiental não comprometerá a observância das regras de proteção do ambiente, a nosso ver, o novo regime de licenciamento ambiental só vem reforçar a importância de uma monitorização coletiva de todas as atividades que possam ter repercussões adversas em componentes ambientais, conferindo ainda maior relevo à participação cidadã na defesa do ambiente[14], revigorada no âmbito do direito de acesso à informação ambiental regulado pela LADA[15]

[cujo artigo 5.º atribui a todos, sem necessidade de enunciar qualquer
interesse, o direito de acesso aos documentos administrativos (incluindo em
matéria ambiental), o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e
de informação sobre a sua existência e conteúdo]

. Por último, acrescentamos que este direito de acesso a informação não procedimental[16] não afasta, mas complementa[17], o direito de acesso à informação procedimental ao abrigo do Código do Procedimento Administrativo[18], quando confere aos interessados[19] no procedimento, o direito de acesso à informação[20].

Atendendo à intensificação da crise energética, aos valores alarmantes de concentração de gases de efeito estufa, bem como à sucessão de eventos climáticos extremos, revela-se absolutamente crucial assegurar uma divulgação de informação credível alicerçada em dados fidedignos, que para além de fundamentar a implementação das políticas públicas adequadas para os objetivos que se pretendem alcançar, fomente uma consciencialização coletiva da importância da preservação do ambiente para a defesa da vida e do planeta.


[1] Acerca deste diploma, ver a anotação da Autora intitulada Simplex Ambiental Abreviado – Notas ao Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, que será objeto de publicação pelas Edições Almedina S.A, no decurso do mês de julho de 2023.

[2] DIAS, José Eduardo Figueiredo. A Reinvenção da Autorização Administrativa no Direito do Ambiente, 1.ª ed., Coimbra: Coimbra Editora S.A., 2014.

[3] Os alicerces desta Convenção centram-se na garantia dos direitos dos cidadãos no que concerne ao acesso à informação sobre o ambiente, à participação do público em processos de decisão e ainda no acesso à justiça em matéria ambiental. Trata-se de um acordo inovador, na medida em que para além de criar relações entre os direitos ambientais e os direitos humanos, atribui aos cidadãos e às sinergias que devem ser intensificadas entre o público e as entidades competentes nos seus diferentes níveis de atuação, um papel determinante na promoção do desenvolvimento sustentável. Pela sua pertinência, assinalamos que em 1 de janeiro de 2016 entrou em vigor a resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) intitulada “Transformar o nosso mundo: Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável”, que apresenta 17 objetivos, refletidos em 169 metas, que foi aprovada pelos líderes mundiais em 25 de setembro de 2015. Segundo informação da Global Compact Network Portugal (GCNP) − rede portuguesa do United Nations Global Compact (UNGC), que reúne os participantes da iniciativa com sede ou que operam em Portugal −, os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, “aprovados por unanimidade por 193 Estados-membros da ONU, reunidos em Assembleia-Geral, visam resolver as necessidades das pessoas, tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, enfatizando que ninguém deve ser deixado para trás. Os ODS foram pensados a partir do sucesso dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), entre 2000 e 2015, e pretendem ir mais longe e acabar com todas as formas de pobreza. A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável é uma agenda alargada e ambiciosa que aborda várias dimensões do desenvolvimento sustentável (social, económico, ambiental) e que promove a paz, a justiça e instituições eficazes. A mobilização dos meios de implementação – dos recursos financeiros às tecnologias de desenvolvimento e transferência de capacitação – é também reconhecida como fundamental. Transformar esta visão em realidade é essencialmente da responsabilidade dos governos dos países, mas irá exigir também novas parcerias e solidariedade internacional. Todos têm um papel a desempenhar”. Disponível em https://globalcompact.pt/index.php/pt/agenda-2030, acedido em 24-05-2023.

[4] Cf. ainda o Regulamento (UE) 2021/1767 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de outubro de 2021, que altera o Regulamento (CE) n.º 1367/2006 relativo à aplicação das disposições da Convenção de Aarhus sobre o acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente às instituições e órgãos comunitários. Disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=celex%3A32021R1767, acedido em 20-05-2023.

[5] Diploma que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (RGPD) – abreviadamente LPDP.

[6] Lei que adequa a composição da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), ao regime de incompatibilidades previsto no Estatuto dos Deputados. 

[7] Diploma que aprova os princípios gerais em matéria de dados abertos e transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE) 2019/1024 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativa aos dados abertos e à reutilização de informação do setor público, e que mereceu a Declaração de Retificação n.º 31/2021, de 20 de setembro.

[8] A exposição de motivos da proposta de Lei n.º 18/XIII/1, que esteve na origem da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, destaca que “[…] outra opção fundamental traduz-se na integração do conteúdo da Lei n.º 19/2006, de 12 de junho, que regula o acesso à informação sobre ambiente (tendo transposto a Diretiva 2003/4/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2003), numa única lei sobre o acesso a toda a informação administrativa pública. Garante-se, contudo, o respeito pelas necessárias especificidades do acesso dos particulares à informação ambiental que esteja na posse das entidades públicas e privadas abrangidas, em estrito cumprimento dos deveres internacionais decorrentes da Convenção de Aarhus (Convenção sobre o Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente, aprovada, para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 11/2003, de 25 de fevereiro). As suas disposições distintivas e específicas foram, assim, integradas na presente lei, mantendo em pleno os objetivos que a lei ora revogada pretendia prosseguir: garantir o direito de acesso à informação sobre ambiente detida pelas autoridades públicas ou em seu nome, assegurar que a informação sobre ambiente é divulgada e disponibilizada ao público, e promover o acesso a essa informação através da utilização de tecnologias telemáticas ou eletrónicas”. Disponível em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheDiplomaAprovado.aspx?BID=19454, acedido em 21-05-2023.

[9] Disponível em https://www.cada.pt/noticias/dia-internacional-das-florestas-21-de-marco-2023-dia-mundial-da-agua-22-de-marco-2023-dia-mundial-da-terra-22-de-abril-2023, acedido em 22-05-2023.

[10] Todos disponíveis para consulta em https://www.cada.pt/pareceres.

[11] Nos termos do estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º, para efeitos do disposto na LADA, considera-se:

[…]

e) «Informação ambiental» quaisquer informações de natureza administrativa, sob forma escrita, visual, sonora, eletrónica ou outra forma material, relativas:

i) Ao estado dos elementos do ambiente, como o ar e a atmosfera, a água, o solo, a terra, a paisagem e as áreas de interesse natural, incluindo as zonas húmidas, as zonas litorais e marinhas, a diversidade biológica e seus componentes, incluindo os organismos geneticamente modificados, e a interação entre esses elementos;

ii) A fatores como as substâncias, a energia, o ruído, as radiações ou os resíduos, incluindo os resíduos radioativos, emissões, descargas e outras libertações para o ambiente, que afetem ou possam afetar os elementos do ambiente referidos na alínea anterior;

iii) A medidas políticas, legislativas e administrativas, designadamente planos, programas, acordos ambientais e ações que afetem ou possam afetar os elementos ou fatores referidos nas subalíneas anteriores, bem como medidas ou ações destinadas à sua proteção;

iv) A relatórios sobre a implementação da legislação ambiental;

v) A análises custo-benefício e outras avaliações e cenários económicos utilizados no âmbito das medidas e atividades, em matéria ambiental, referidas na subalínea iii);

vi) Ao estado da saúde e à segurança das pessoas, incluindo designadamente a contaminação da cadeia alimentar, as condições de vida, os locais de interesse cultural e construções, na medida em que sejam ou possam ser afetados pelo estado dos elementos referidos na subalínea i), ou, através desses elementos, pelos fatores ou medidas referidas nas subalíneas ii) e iii);

[12] GOMES, Carla Amado. Direito Internacional do Ambiente: Uma Abordagem Temática, Lisboa: AAFDL Editora, 2018.

[13] DICKSTEIN, André Constant. Participação Pública na Tomada de Decisão Ambiental, Lisboa: AAFDL Editora, 2019.

[14] Referindo-se aos direitos procedimentais em matéria ambiental, o artigo 6.º da Lei de Bases do Ambiente (Lei n.º 19/2014, de 14 de abril), estabelece o seguinte:

1 – Todos gozam dos direitos de intervenção e de participação nos procedimentos administrativos relativos ao ambiente, nos termos legalmente estabelecidos.

2 – Em especial, os referidos direitos procedimentais incluem, nomeadamente:

a) O direito de participação dos cidadãos, das associações não-governamentais e dos demais agentes interessados, em matéria de ambiente, na adoção das decisões relativas a procedimentos de autorização ou referentes a atividades que possam ter impactes ambientais significativos, bem como na preparação de planos e programas ambientais;

b) O direito de acesso à informação ambiental detida por entidades públicas, as quais têm o dever de a divulgar e disponibilizar ao público através de mecanismos adequados, incluindo a utilização de tecnologias telemáticas ou eletrónicas.

No mesmo sentido ver a Lei de Bases do Clima, cujo artigo 9.º, com a epígrafe “Participação dos Cidadãos”, refere:

1 – Os cidadãos têm o direito de participar nos processos de elaboração e revisão dos instrumentos da política climática.

2 – Para além das consultas públicas, sob a forma tradicional de contributo escrito, devem ser organizadas sessões de esclarecimento e debate entre os cidadãos e os responsáveis pela decisão relativa à política climática, quer por iniciativa da Administração quer por solicitação de, no mínimo, 30 cidadãos.

3 – Para efeitos dos números anteriores, é disponibilizada informação, de forma clara, sistematizada e de consulta fácil, a todos os cidadãos que pretendam a ela ter acesso.

[15] Ver, nomeadamente, os artigos 4.º, n.º 4 (Âmbito de aplicação subjetivo das disposições relativas ao acesso a informação ambiental), artigo 11.º da LADA (Divulgação ativa de informação relativa ao ambiente), artigo 17.º (Direito de acesso à informação ambiental), artigo 18.º (Indeferimento do pedido de acesso) e artigo 27.º-A (Conjuntos de dados de elevado valor).

[16] A Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, abrange o acesso não procedimental. O que respeite ao acesso no quadro do regime do Código do Procedimento Administrativo ou de regime especial não é objeto direto de apreciação no âmbito da LADA – a título de exemplo, ver o Parecer da CADA n.º 51/2020, disponível para consulta em https://www.cada.pt/pareceres.

[17] Nos casos em que o procedimento ainda não se mostra findo (procedimentos não concluídos, onde ainda não ocorreu decisão ou arquivamento), mas onde já decorreu mais de um ano sobre a elaboração de certo documento a que se pretende aceder, ao acesso a este serão aplicáveis as normas do direito de acesso à informação não procedimental, mesmo pelos sujeitos procedimentais (artigo 6.º, n.º 3 da LADA).

[18] Conforme o disposto no artigo 1.º, n.º 4, alínea a) da LADA, o regime de exercício do direito dos cidadãos a serem informados pela Administração Pública sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, e a conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas, rege-se pelo Código do Procedimento Administrativo.

[19] De acordo com o n.º 2 do artigo 65.º (com a epígrafe “Sujeitos da relação jurídica procedimental”), para efeitos do disposto no CPA, consideram-se interessados no procedimento os sujeitos da relação jurídica procedimental referidos nas alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 65.º que como tal nele se constituam, ao abrigo de um dos títulos de legitimação previstos no artigo 68.º − o interessado para efeitos dos artigos 82.º a 85.º do CPA (normas integradas na Parte III, Capítulo IV, que rege o direito à informação), é um conceito processual. Enquadrando os pressupostos da legitimidade procedimental, o artigo 68.º do CPA estabelece, nomeadamente o seguinte:

1 – Têm legitimidade para iniciar o procedimento ou para nele se constituírem como interessados os titulares de direitos, interesses legalmente protegidos, deveres, encargos, ónus ou sujeições no âmbito das decisões que nele forem ou possam ser tomadas, bem como as associações, para defender interesses coletivos ou proceder à defesa coletiva de interesses individuais dos seus associados que caibam no âmbito dos respetivos fins.

2 – Têm, também, legitimidade para a proteção de interesses difusos perante ações ou omissões da Administração passíveis de causar prejuízos relevantes não individualizados em bens fundamentais como a saúde pública, a habitação, a educação, o ambiente, o ordenamento do território, o urbanismo, a qualidade de vida, o consumo de bens e serviços e o património cultural:

a) Os cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e os demais eleitores recenseados no território português;

b) As associações e fundações representativas de tais interesses;

c) As autarquias locais, em relação à proteção de tais interesses nas áreas das respetivas circunscrições.

[20] Com a epígrafe “Direito dos interessados à informação”, o artigo 82.º do CPA estabelece o seguinte:

1 – Os interessados têm o direito de ser informados pelo responsável pela direção do procedimento, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos procedimentos que lhes digam diretamente respeito, bem como o direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas.

2 – As informações a prestar abrangem a indicação do serviço onde o procedimento se encontra, os atos e diligências praticados, as deficiências a suprir pelos interessados, as decisões adotadas e quaisquer outros elementos solicitados.

3 – As informações solicitadas ao abrigo do presente artigo são fornecidas no prazo máximo de 10 dias.

4 – Nos procedimentos eletrónicos, a Administração deve colocar à disposição dos interessados, na Internet, um serviço de acesso restrito, no qual aqueles possam, mediante prévia identificação, obter por via eletrónica a informação sobre o estado de tramitação do procedimento.

5 – Salvo disposição legal em contrário, a informação eletrónica sobre o andamento dos procedimentos abrange os elementos mencionados no n.º 2.