Professor do Instituto Politécnico de Castelo Branco e Professor Auxiliar Convidado da Universidade da Beira Interior. Doutor em Direito.


O período de fidelização é, por via da regra, uma cláusula contratual geral (CCG), mediante a qual o aderente se compromete a não denunciar o contrato antes de decorrido o referido período.

A fidelização tem como fundamento e condição de validade as contrapartidas oferecidas pelo proponente ao aderente (como por ex. descontos na mensalidade, equipamentos mais baratos, oferta do valor da instalação, oferta de canais extra ou de pacotes de chamadas gratuitas). Exemplos paradigmáticos de contratos de consumo com cláusula de fidelização são os celebrados com ginásios para a utilização de instalações e equipamentos e os de prestação de serviços de comunicações eletrónicas.

Pese embora o período de fidelização tenha fonte contratual, várias são as referências legais, nomeadamente, nos artigos 8.º nº 1 al. h) da LDC, 4.º n.º 1 al. q) do DL 24/2014 de 14 de fevereiro, 4.º do DL 56/2010 de 1 de junho e 3.º al. m) da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE), entre outras.

No entanto, apenas no respeitante a contratos relativos a comunicações eletrónicas se estabelece um limite máximo de duração do período de fidelização de 24 meses (artigos 48.º n.º 5 da LCE e 4.º do DL 56/2010 de 1 de junho).

O artigo 48.º n.º 6 da LCE obriga o proponente a oferecer a todos os aderentes a possibilidade de celebrar contratos sem qualquer tipo de fidelização, bem como contratos com 6 e 12 meses de período de fidelização, por cada benefício concedido.

Segundo o artigo 48.º n.ºs 2 als.  a) e c), 11, 12 e 13 da LCE, durante o período de fidelização, os encargos decorrentes da resolução do contrato não podem ultrapassar os custos que o prestador teve com a instalação da operação (subsidiação de equipamentos terminais, instalação e ativação do serviço), sendo proibida a cobrança de qualquer contrapartida a título indemnizatório ou compensatório devendo, tais encargos, ser proporcionais à vantagem que foi conferida e como tal identificada e quantificada no contrato celebrado, não podendo em consequência corresponder automaticamente à soma do valor das prestações vincendas à data da cessação. Portanto, o aderente que resolva o contrato, durante o período de fidelização, será responsável pelo pagamento das vantagens conferidas, mas com o limite inerente aos custos de instalação da operação. Os custos de instalação da operação são o teto máximo da compensação devida ao prestador pela resolução do aderente durante o período de fidelização.

A única situação em que, efetivamente, o valor da compensação pode superar os custos de instalação é a prevista na primeira parte do nº 13 do artigo 48º da LCE, no caso de subsidiação de equipamentos (por ex. redução substancial do preço de um equipamento em virtude da fidelização a um serviço), devendo acres­centar-se tais encargos que devem ser calculados nos termos do artigo 2º, nº 2 do DL nº 56/2010, de 1 de junho.

De realçar que o valor associado às vantagens conferidas pelo pro­ponente vai diminuindo, à medida que o aderente realiza as prestações, uma vez que tais vantagens vão sendo, consequentemente, amortizadas. É dizer, o operador deve quantificar as vantagens concedidas ao aderente, chegando-se a um valor global de tais vantagens que é dividido pelos meses do período de fidelização. Assim, o valor da indemnização pela resolução antecipada do contrato deverá materializar-se, objetivamente, através de

Não existindo, relativamente aos demais contratos, regras gerais que balizem o período de fidelização ou estabeleçam critérios objetivos que permitam aferir o valor a ressarcir pela denúncia antecipada, a validade das cláusulas deve ser analisada atendendo ao contexto contratual padronizado, nomeadamente, a duração da fidelização e o valor estabelecido na cláusula penal como consequência da denúncia contratual antecipada (artigos 22.º n.º 1 al. a) e 19.º al. c) do DL 446/85 de 25 de outubro).

Não se tem admitido que a denúncia contratual antecipada, durante o período de fidelização, em contratos que não sejam os de prestação de serviços de comunicações eletrónicas, uma vez que a estes se aplicam regras específicas, obrigue o aderente ao pagamento da totalidade das prestações até ao final do referido período, considerando-se tais montantes constantes de cláusulas penais desproporcionais aos danos a ressarcir.

Verificadas determinadas vicissitudes, o aderente pode desvincular-se contratualmente, durante o período de fidelização. As mais comuns fundam-se no incumprimento do contrato pelo profissional e na alteração das circunstâncias em que a partes fundaram a decisão de contratar.

O incumprimento do contrato pelo profissional pode revelar-se de distintas formas: prestação defeituosa ou suspensão injustificada do serviço; interrupção do fornecimento do bem; alteração unilateral das condições contratuais, durante o período de fidelização (por ex. alteração do preço). Não parece ser de admitir que nos contratos de execução duradoura, e durante o período de fidelização, o proponente altere unilateralmente as condições contratuais, uma vez que este se vincula, tal como o aderente, ao período de fidelização. 

Excecionalmente, a alteração das condições contratuais, é possível mediante o cumprimento cumulativo de dois requisitos: 1) a apresentação da proposta de alteração contratual ao destinatário e 2) possibilidade de denúncia do contrato pelo destinatário dessa proposta.

O incumprimento do contrato que se traduza na prestação defeituosa ou suspensão injustificada do serviço, na interrupção do fornecimento do bem ou na alteração unilateral das condições contratuais durante o período de fidelização, sem que seja dada a possibilidade ao aderente de denunciar o contrato, legitimam a sua resolução, sem que tal implique o pagamento da indemnização previamente fixada na cláusula penal, em conformidade com o disposto nos artigos 432.º, 434.º n.º 2, 436.º, 801.º n.º 2, 802.º do Código Civil (CC). Se do incumprimento resultarem prejuízos para o aderente, este, provando-os, terá direito à indemnização nos termos gerais da responsabilidade civil contratual (artigos 798.º e 801.º n.º 2 do CC).

A desvinculação do aderente, durante o período de fidelização, pode ocorrer por alteração das circunstâncias em que a partes fundaram a decisão de contratar. A resolução do contrato por alteração das circunstâncias, em conformidade com o artigos 437.º e 438.º do CC, depende da verificação cumulativa de três requisitos: 1) alteração relevante e inesperada das circunstâncias em que as partes tenham fundado a decisão de contratar, é dizer, que essas circunstâncias se hajam modificado de forma anormal; 2) a exigência da obrigação à parte lesada afete gravemente a boa-fé contratual, é dizer, o equilíbrio contratual originário, tornando-se, manifestamente abusiva; 3) a parte lesada não estar constituída em mora no momento em que se verifica a alteração das circunstâncias. Veja-se, a título de exemplo, situações em que o aderente caia, inesperadamente, em situação de desemprego, emigre ou mude de morada. 

No vértice oposto situa-se a possibilidade de desvinculação do contrato pelo proponente, em virtude de incumprimento por parte do aderente. São, pois, semelhantes os efeitos do incumprimento contratual pelo aderente com os do incumprimento do contrato pelo proponente. Pode, portanto, o proponente, resolver o contrato em conformidade com o artigo 801.º n.º 2 do CC tendo direito a ser ressarcido nos termos previsto na cláusula penal e sem necessidade de invocar e provar prejuízos.

Cumpre questionar se será válida a cláusula penal que estabeleça que, em caso de incumprimento, o devedor deva suportar o montante equivalente ao das prestações vincendas. A questão tem surgido na jurisprudência com frequência, nem sempre com a mesma resposta. É nossa opinião, que não será de admitir que a resolução contratual pelo proponente, por incumprimento do aderente, durante o período de fidelização, implique o pagamento das prestações vincendas, devendo considerar-se tais montantes constantes de cláusulas penais, em princípio, desproporcionais aos danos a ressarcir. Devem, pois, ser descontados os valores que o profissional poupou pela não prestação do serviço, nos termos do regime do enriquecimento sem causa, sob pena do consumidor ficar numa situação de desvantagem. Em última análise, a validade da cláusula penal deve ser aferida à luz do disposto no artigo 19.º al. c) do DL 446/85 de 25 de outubro.